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A Confissão e o Catecismo apoiam o Arminianismo

O que deveria ocorrer se a Confissão Belga e o Catecismo de Heidelberg apoiassem não o Calvinismo supralapsariano, mas a teologia de Arminius? Ambas as obras sempre foram vistas como calvinistas, com a suposição de que a linguagem predestinatória inerente se opõe ao Arminianismo Reformado. Na verdade, até mesmo as declarações mais explícitas sobre a eleição para a salvação na Confissão e no Catecismo apoiam a doutrina de eleição de Arminius. Um sínodo nacional não foi convocado antes da morte de Arminius em 1609, então nunca saberemos o que poderia ter sido.

O que sabemos é que alguns calvinistas supralapsarianos (como Franciscus Gomarus) instigaram calúnias quanto aos ensinamentos de Arminius, a ponto de seu nome se tornar sinônimo de Socinianismo (negação da Trindade e divindade de Cristo), Catolicismo Romano (salvação orientada por obras), Semi-Pelagianismo (uma negação da Depravação Total e Incapacidade Total) — todos os quais não passavam de mentiras descaradas. Arminius certa vez exclamou:

Afirmo que esses bons homens [note que ele chamou seus oponentes teológicos de “esses bons homens”] nem compreendem nossos sentimentos, nem conhecem as frases que empregamos, nem, para conhecê-las, entendem o significado dessas frases. Em consequência disso, não é nenhuma surpresa que eles se afastem muito da verdade quando enunciam nossos sentimentos em suas palavras, ou quando afixam outras (isto é, suas próprias) significações às nossas palavras. 1

O estudioso de Arminius, Carl Bangs, escreve o seguinte.

__________

A Confissão Belga, Artigo 14, afirma que o homem “se submeteu voluntariamente ao pecado e, portanto, à morte e à maldição”. Arminius poderia apelar a isso em apoio à sua alegação de que o pecado não é necessário por um decreto divino, e ele o fez em 1608 [um ano antes de sua morte, outubro de 1609]. O mesmo artigo fala de falso ensino sobre o livre-arbítrio, “visto que o homem não é nada além de um escravo do pecado e não tem receptividade ou habilidade a menos que lhe seja dada do céu”. Arminius poderia concordar.

O artigo 16 trata da eleição. . . . Arminius não contradisse este artigo, mas seus escritos levantam uma questão de interpretação. Qual é o referente de “aqueles a quem ele . . . escolheu”? A resposta que Arminius deu é que eles são crentes. Se essa interpretação for concedida, ele não tem nenhuma disputa com a Confissão.

O Catecismo de Heidelberg fala ainda menos sobre predestinação, mas as questões 20 e 54 vão direto ao ponto:

20. P. Todos os homens serão salvos por meio de Cristo, assim como foram perdidos por meio de Adão?

R. Não, somente todos aqueles que por uma fé correta são incorporados a ele e aceitam todos os seus benefícios.

54. P. O que acreditamos sobre a Igreja Cristã universal?

A. Que o Filho de Deus reuniu, protegeu e preservou para si, desde o princípio do mundo até o fim, de toda a família humana, por meio de seu Espírito e Palavra, uma comunidade escolhida para a vida eterna, na unidade da verdadeira fé, e que, portanto, eu sou e permanecerei eternamente um membro vivo dela.

A questão 20 parece ser bem acomodada à tese de Arminius de que a salvação é desejada para a classe de crentes. A questão 54 permite a interpretação e não faz nenhuma especificação do modo de eleição. A questão sobre a teologia de Arminius e as duas fórmulas pode muito bem tomar outro rumo: não, As declarações poderiam ser esticadas para acomodar as visões de Arminius? mas, Elas poderiam ser esticadas para acomodar as visões de seus oponentes?

Foi, de fato, essa segunda questão que perturbou os defensores da teologia holandesa mais antiga e branda. As confissões não deveriam ser revisadas para remover as ambiguidades sob as quais os supralapsarianos se abrigavam? Em defesa dessa posição, pode-se dizer novamente que as fórmulas foram escritas antes que a questão do supralapsarianismo tivesse sido levantada [sendo uma teoria tão nova e não fundamentada pela história da Igreja], assim como o próprio Calvino não dá uma resposta clara sobre se ele é um supra ou [infralapsariano].

Concluo que Arminius se sentia essencialmente de acordo com a Confissão e o Catecismo, que não os atacou, mas que, no entanto, não estava totalmente satisfeito com eles devido à sua ambiguidade. 2

__________

1 James Arminius, “Artigo XVI.”, em The Works of Arminius , três volumes, trad. James e William Nichols (Grand Rapids: Baker Book House, 1996), 2:17.

2 Carl O. Bangs, Arminius: Um estudo sobre a Reforma Holandesa (Eugene: Wipf & Stock Publishers, 1991), 223-24.

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Livros que todo arminiano precisa ler

  1. Teologia Arminiana: Mitos e Realidades,  de Roger Olson. Este é um exemplo de boa escrita e boa teologia. Olson aborda a história do arminianismo e também mostra os muitos erros que calvinistas e outros não arminianos cometem sobre o arminianismo. Este é um dos meus livros favoritos de todos os tempos em teologia.
  2. Graça, Fé, Livre-Arbítrio,  de Robert Picirilli. Eu classificaria este livro ao lado do de Olson. É um caso de boa escrita e doutrina sã. O Dr. Picirilli é um batista do Livre-Arbítrio que aborda o Calvinismo ponto por ponto nesta obra, definindo o que é o Arminianismo Reformado e sua base bíblica.
  3. Arminius: Um Estudo sobre a Reforma Holandesa,  de Carl Bangs. Esta é a única obra que conheço sobre a vida de Jacobus Arminius. Bangs mostra a vida de Arminius e como este homem passou de um simples teólogo calvinista a se tornar o líder do movimento de protesto contra o calvinismo. Bangs é um bom escritor e se aprofunda na curta vida de Arminius, que impactou muitos.
  4. Segurança Eterna Incondicional: Mito ou Verdade?,  de French Arrington. O Dr. Arrington, do Seminário Teológico da Igreja de Deus, escreveu este livro após inúmeras perguntas de fiéis sobre o ensinamento de “uma vez salvo, salvo para sempre”. O livro é uma mistura de escrita devocional e teologia. Embora não seja tão técnico quanto eu esperaria de um professor de seminário, o livro é bom e eu o recomendo aos arminianos.
  5. O Que a Bíblia Diz sobre Deus, o Governante,  por Jack Cottrell. Este livro é um dos melhores livros sobre a doutrina de Deus, sob uma perspectiva arminiana. O Dr. Cottrell aborda quase todas as questões que envolvem o governo de Deus sobre Sua criação. Para mim, este é o melhor livro de teologia arminiana que já li.
  6. A Estratégia de Deus na História Humana,  de Roger Forster. Esta é a resposta arminiana aos livros calvinistas sobre a soberania de Deus, escritos por teólogos como RC Sproul e AW Pink. Embora o livro se incline para a “teologia aberta”, ele faz um bom trabalho ao mostrar como Deus tem sido soberano na história humana, ao mesmo tempo em que permite o livre-arbítrio.
  7. Escolhido, mas Livre,  por Norman Geisler. O livro de Geisler não é totalmente arminiano, mas os arminianos poderiam concordar com muito do que ele escreve aqui. Geisler afirma que está escrevendo este livro a partir de uma posição “calvinista moderada”, mas se você examinar sua posição, é mais provável que ele seja um “arminiano moderado” (Geisler acredita na segurança eterna). Esta segunda edição contrapõe-se ao teólogo calvinista James White e seu livro, ”  A Liberdade do Oleiro”  , com um apêndice sobre White.
  8. A Morte de Cristo,  de Robert Lightner. Este livro é um livro com o qual um arminiano concordaria em cerca de 95% do que escreve sobre a doutrina da expiação. Lightner defende uma expiação ilimitada e o faz examinando diretamente a Palavra de Deus. Ele aborda os argumentos que os calvinistas defendem para uma expiação limitada e apresenta uma forte defesa da doutrina da expiação ilimitada.
  9. Por Que Não Sou Calvinista,  de Jerry Walls e Joseph Dongell. Outro livro clássico sobre o Arminianismo e as diferenças entre Arminianismo e Calvinismo. Gostei deste livro e, embora gostaria de mais exegese do que o livro oferece, recomendo-o a quem estuda o Calvinismo sob uma perspectiva arminiana.
  10. Eleição e Predestinação,  de Samuel Fisk. Este livro está começando a ficar um pouco obsoleto, mas os argumentos são bons. Neste livro, Fisk examina as principais passagens das Escrituras sobre eleição e predestinação e oferece insights de vários comentários. Embora as fontes sejam datadas, os argumentos ainda são válidos, pois Fisk defende uma natureza condicional à eleição (fé e arrependimento).

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Será que você é arminiano e nem percebe?

Ao longo da história, o arminianismo muitas vezes foi mal compreendido e até difamado por correntes calvinistas. O resultado disso é que muitos cristãos que seguem a linha arminiana nem sabem que a seguem, e, em alguns casos, até negam. Curiosamente, o arminianismo é tão difundido que até igrejas calvinistas podem estar cheias de pessoas com crenças arminianas. É paradoxal, mas a realidade é essa: muitos têm medo de se identificar como arminianos, mesmo que a maior parte do protestantismo evangélico compartilhe de suas premissas.

O objetivo desta reflexão é ajudar você a perceber se sua fé se aproxima do arminianismo e mostrar que não há nenhum problema em assumir essa posição teológica.

1. Você acredita que Jesus morreu por todos os seres humanos?

Se a sua resposta foi “sim”, você já concorda com um princípio central do arminianismo. A maioria dos calvinistas defende que Cristo morreu apenas por alguns eleitos, enquanto os arminianos entendem que a morte de Jesus foi suficiente para todos. Este é um ponto crucial que separa as duas tradições.

2. Você acredita que o ser humano é incapaz de buscar a Deus por si mesmo e precisa da graça para crer?

Se respondeu “sim”, você segue a linha de Armínio. Tanto arminianos quanto calvinistas reconhecem a necessidade da graça, mas o arminianismo sustenta que, mesmo capacitado pela graça, o ser humano pode escolher aceitar ou resistir.

3. Você acredita que uma pessoa pode resistir ao chamado convincente da graça de Deus?

Se sim, você compartilha outra crença central arminiana. Deus deseja que todos creiam, mas Ele respeita nossa liberdade de escolha. Como Jesus disse sobre Jerusalém: “Quantas vezes eu quis reunir os teus filhos, mas vocês não quiseram” (Mt 23:37).

4. Você acredita que a pessoa nasce de novo quando deposita sua fé em Cristo?

Se sua resposta for positiva, você sustenta um princípio arminiano. Para o arminianismo, a nova vida vem pela união com Cristo pela fé, não antes. João 3:16 é claro: “Todo aquele que nele crê não perecerá, mas terá a vida eterna”.

5. Você acredita na eleição?

Se respondeu “sim”, você pode ser arminiano. A diferença é que a eleição não acontece independentemente da fé, mas “em Cristo”: quem está unido a Ele é considerado eleito.

6. Você acredita na predestinação?

Os arminianos afirmam que os crentes são predestinados à salvação final, mas não que qualquer pessoa seja predestinada a crer.

7. Você acredita na segurança eterna?

A questão é delicada: a fé genuína garante a salvação final ou é possível perder a salvação? Arminianos geralmente entendem que perseverar na fé é necessário; alguns reconhecem a possibilidade de apostasia, enquanto calvinistas defendem a segurança incondicional.

8. Você acredita na expiação penal da morte de Cristo?

A maioria dos arminianos e calvinistas sustenta que Jesus sofreu em nosso lugar para satisfazer a justiça de Deus. Armínio mesmo afirmava esta perspectiva.

9. Você acredita que Deus conhece perfeitamente o futuro?

Sim? Então você concorda com arminianos e calvinistas: Deus tem conhecimento exaustivo de tudo que acontecerá, incluindo nossas escolhas livres.

10. Você acredita na soberania de Deus?

Sim? Ótimo! Arminianos e calvinistas concordam na soberania divina, mas a diferença está em como essa soberania convive com a liberdade humana. Arminianos defendem que Deus é soberano e, ao mesmo tempo, nos concede liberdade genuína.

Em resumo:

Se você se identifica com a ideia de que Cristo morreu por todos, que a graça é resistível, que a fé nos une a Cristo e garante a nova vida, que a eleição depende da fé, que a predestinação é relativa aos crentes, que a perseverança na fé é necessária, que a expiação penal é válida, que Deus conhece perfeitamente o futuro e que Ele é soberano mas respeita nossa liberdade, então você é, sim, arminiano.

E sabe de uma coisa? Isso não é motivo de vergonha. O arminianismo é uma tradição teológica sólida, amparada na Escritura, e é a posição teológica predominante entre os cristãos evangélicos. Ser arminiano é simplesmente assumir a liberdade e a responsabilidade que Deus nos dá, confiando em Sua graça que é suficiente para todos.

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Nem arminiano nem calvinista

1. Introdução: a frase que soa piedosa, mas é perigosa

É muito comum ouvir, principalmente em debates teológicos ou rodas de conversa cristãs, a seguinte afirmação: “Não sou arminiano, nem calvinista, sou apenas bíblico.” À primeira vista, isso soa piedoso, humilde e até espiritual. Quem não gostaria de ser simplesmente “bíblico”? No entanto, por trás dessa frase aparentemente inocente, há uma falácia lógica e um equívoco teológico.

O problema não está no desejo de ser bíblico, mas na ilusão de que alguém lê e interpreta as Escrituras sem lentes, sem tradição e sem pressupostos. Ninguém é uma “tábula rasa” diante da Bíblia. Todos carregamos uma bagagem histórica, cultural e eclesial.


2. O que está em jogo: falácia e tradição

A falácia da frase está em apresentar um falso dilema: ou sigo a Bíblia ou sigo rótulos humanos. Isso não é verdade. O que chamamos de “rótulos” – arminiano, calvinista, luterano, batista, pentecostal – nada mais são do que formas de organizar, transmitir e defender uma interpretação sistemática da Escritura.

Assim como placas de trânsito não são o destino, mas guias para chegarmos nele, rótulos não substituem a Bíblia, mas indicam a rota interpretativa que assumimos. Rejeitá-los não elimina a tradição; apenas mascara a tradição que já seguimos, muitas vezes de maneira acrítica.


3. A Bíblia e o perigo da neutralidade ilusória

A ideia de que podemos ser “só bíblicos” confunde Sola Scriptura com Solo Scriptura. O princípio reformado de Sola Scriptura afirma que a Escritura é a única regra de fé e prática, mas lida e interpretada em comunidade, com a ajuda da tradição e do ensino da igreja. Já o Solo Scriptura é a caricatura individualista: “só eu e minha Bíblia”, como se o Espírito Santo tivesse começado a ensinar apenas a partir da minha geração.

Paulo já lidava com esse problema em Corinto: uns diziam “eu sou de Paulo”, outros “eu de Apolo”, outros ainda “eu de Cristo” (1Co 1.12). Curiosamente, os que afirmavam ser “só de Cristo” estavam, na prática, rejeitando a tradição apostólica, caindo na mesma carnalidade que os demais.

Um exemplo ainda mais claro é Apolo em Atos 18. Ele era poderoso nas Escrituras, mas precisou ser instruído mais exatamente por Priscila e Áquila. Ninguém lê a Bíblia sem lentes. Todos nós somos moldados e corrigidos pela comunidade de fé e pela tradição.


4. Exemplos práticos: o que acontece quando rejeitamos rótulos

No Brasil, vemos igrejas que se apresentam como “não denominacionais”, rejeitando rótulos históricos. Mas, na prática, são um amálgama de influências: um pouco de arminianismo, um pouco de calvinismo, pitadas de pentecostalismo e doses generosas de pragmatismo norte-americano. A ausência de rótulos explícitos não significa neutralidade, mas confusão.

Até mesmo movimentos pentecostais clássicos – como as Assembleias de Deus – possuem tradições, confissões e posicionamentos claros, ainda que muitos dos seus membros digam ser apenas “bíblicos”.


5. Humildade teológica: entre a arrogância e a anti-intelectualidade

Duas tentações rondam o povo de Deus:

  1. A arrogância intelectual – achar que um rótulo (como “calvinista”) garante superioridade espiritual e teológica.

  2. A anti-intelectualidade – rejeitar rótulos para evitar estudo e aprofundamento, vivendo de clichês espirituais.

Ambas são prejudiciais. O caminho reformado é o da humildade. Como disse Martyn Lloyd-Jones, não devemos nos gloriar em homens, mas também não devemos rejeitar o valor do pensamento sistematizado que nos ajuda a ser fiéis à Escritura.


6. Aplicação pastoral: rótulos como instrumentos de maturidade

Efésios 4.14–15 nos lembra que não devemos ser como crianças “levadas ao redor por todo vento de doutrina”. Aqui entra a função positiva dos rótulos: eles nos ajudam a ter clareza, identidade e consistência.

Ser reformado, arminiano ou pentecostal (no sentido histórico e bem definido) não é negar a Bíblia, mas afirmar que nossa leitura dela se alinha com uma tradição testada, debatida e defendida ao longo da história.

Rejeitar rótulos, por outro lado, abre espaço para cairmos em modismos, sincretismos e heresias, sem percebermos.


7. Conclusão: não é sobre rótulos, mas sobre fidelidade

A questão, portanto, não é se teremos ou não rótulos, mas quais rótulos assumiremos conscientemente. Fingir neutralidade é apenas um atalho para incoerência.

Ser “somente bíblico” é impossível no sentido absoluto; todos lemos com lentes. A questão é se nossas lentes foram moldadas pela tradição fiel da igreja de Cristo ou pelas ideologias do nosso tempo.

Que o Senhor nos dê maturidade para reconhecer que rótulos, quando usados com humildade e responsabilidade, são instrumentos que nos ajudam a permanecer firmes na Palavra e não sermos levados por ventos de doutrina.

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O Quadrilátero de Wesley

“Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que desde a infância sabes as sagradas letras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus” (2 Tm 3:14,15).

Desde a Reforma Protestante, nós, evangélicos, reafirmamos a primazia das Escrituras na vida da Igreja. O sermão substituiu a missa como o ponto alto do culto, e uma Bíblia aberta passou a ocupar o lugar central, em vez do altar fechado. Esta vitória histórica nos recorda que a Palavra de Deus deve ser a fonte e o critério de toda a nossa fé. No entanto, é inegável que a teologia — chamada com propriedade de “ciência-mãe” — vem sendo relegada ao segundo plano em diversos segmentos evangélicos. Não são poucas as denominações que já não exigem preparo teológico para a ordenação pastoral, como se a vida cristã pudesse se sustentar apenas pela prática, sem reflexão.

O Dr. Vinicius Couto, ao refletir sobre a importância da teologia, usa uma imagem muito sugestiva: alguns enxergam a teologia como um esqueleto — estrutura rígida, mas sem vida. Outros vivem sua espiritualidade como uma água-viva — cheia de movimento, mas sem sustentação. A resposta não está em escolher entre estrutura ou vitalidade, mas em unir ambas: vida com forma, fogo com fundamento, experiência com verdade. Afinal, uma espiritualidade sem estrutura é tão perigosa quanto uma estrutura sem vida.

O Quadrilátero de Wesley

Por muito tempo, John Wesley foi lembrado apenas como um grande pregador avivalista. No entanto, pesquisas mais recentes têm redescoberto seu valor como teólogo. Uma de suas grandes contribuições foi sistematizar quatro elementos fundamentais para a formulação da fé cristã, conhecidos como o Quadrilátero de Wesley: as Escrituras, a razão, a tradição e a experiência.

Importante frisar: para Wesley, a Escritura sempre foi a primeira e a última palavra. As demais fontes — razão, tradição e experiência — tinham papel auxiliar, jamais concorrente.

1. As Escrituras

Wesley defendia que toda doutrina deve nascer, ser provada e finalmente confirmada pela Bíblia. A Palavra de Deus é, portanto, o ponto de partida e de chegada. Vivemos hoje em uma geração que prefere “várias verdades”, como se a Escritura fosse um livro de múltiplas interpretações válidas. Mas o próprio Cristo nos lembra: “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (Jo 17:17). Não há “minha verdade” ou “sua verdade”: há a Verdade, revelada em Cristo e nas Escrituras.

2. A razão

A razão não é inimiga da fé, mas instrumento dado por Deus para organizar aquilo que o Espírito nos revela. Paulo nos lembra que o Espírito testifica com o nosso espírito (Rm 8:16), e esse testemunho passa pelo crivo da mente. Wesley rejeitava tanto o misticismo sem base quanto o racionalismo frio. A razão, iluminada pela Palavra, impede que caiamos em exageros, como quando tudo é espiritualizado — desde tropeços na calçada até males hereditários.

3. A tradição

Em um tempo em que muitos associam “tradição” a algo ultrapassado, Wesley nos recorda que ela é um recurso precioso. Não falamos de tradições humanas inventadas, mas da herança da fé da Igreja ao longo dos séculos. Para ele, nenhuma doutrina é correta se não estiver em sintonia com a fé da Igreja Primitiva. Não é à toa que Paulo alertou Timóteo sobre aqueles que, movidos por coceira nos ouvidos, buscariam mestres que apenas confirmassem seus desejos (2 Tm 4:3). Hoje, movimentos que se dizem “resgates apostólicos” ou modelos como o G-12 distorcem esse princípio. Tradição não é inventar novidades, mas permanecer no que a Igreja sempre confessou.

4. A experiência

Por fim, Wesley lembrava que a fé cristã não é apenas racional ou histórica, mas também existencial. O Espírito Santo aplica ao coração a verdade da Palavra. Quando fomos justificados, Ele testificou que nossos pecados estavam perdoados; quando fomos santificados, Ele confirmou que fomos lavados. Contudo, Wesley sempre alertava: nenhuma experiência pessoal pode contradizer a Bíblia. O subjetivo só é válido se estiver em harmonia com o objetivo, que é a Palavra.


Conclusão

Razão, tradição e experiência são dons que enriquecem nossa caminhada. Mas somente as Escrituras são suficientes, inerrantes e infalíveis para fundamentar a fé. O desafio que temos hoje, como igreja do Senhor, não é apenas colocar a Bíblia no início e no fim, como Wesley ensinava, mas no início, no meio e no fim de toda a nossa vida cristã.

Assim, a Palavra não será apenas o livro da nossa estante, mas a lâmpada para os nossos pés e luz para o nosso caminho (Sl 119:105).

E se John Wesley estivesse certo?

William H. Williamon escreveu um artigo intitulado “What if Wesley was right?” (E se Wesley estava certo?), dentro do livro “Our Calling to Fulfill” (Nosso Chamado para Cumprir), abordando os conceitos de John Wesley e suas implicações práticas para os dias atuais. Ele dialogou com a teologia de Wesley acerca de Deus e a Graça transformadora, afirmando que “se Wesley estava certo, então conferências sobre Wesley podem ser perigosas”, pois quando nos confrontamos com seus pensamentos teremos que rever nossas ações.

Tendo como inspiração o tema que Williamon levantou, parei para meditar em outras áreas que, se Wesley estava certo biblicamente e teologicamente, então, teremos sérios problemas com as nossas ações e pensamentos, pois não são somente as suas convicções, mas, em realidade, as convicções que o próprio Deus quer de nós. Em vista disso, enumerei cinco pontos que John Wesley pode nos instruir.

ECLESIOLOGIA: o mundo é minha paróquia

O modo que Wesley enxergava a igreja é muito diferente do que normalmente temos visto. Para ele, a Igreja não é o templo que usamos para cultuar a Deus e os membros não são aqueles que entram no prédio. Vai muito além disso! Seu campo de atuação é o mundo inteiro e seu público para a pregação são todos aqueles que não conhecem a Cristo. Se Wesley estava certo, não devemos focar nossos esforços demasiadamente nos templos e prédios apainelados, mas investir nossos esforços e recursos humanos nos campos brancos que estão à espera dos trabalhadores.

POBREZA: preferência aos desprovidos financeiramente

Uma das marcas mais nítidas na vida e ministério de Wesley é seu envolvimento com os pobres e os necessitados. De acordo com Mckenna “ter o espírito de compaixão pelo pobre” foi à forma como eram “conhecidos os wesleyanos”. A santidade de Deus é acompanhada pela justiça social, ela é a santidade de Deus em ação. Devemos ressaltar que o amor de Cristo vai além de simplesmente querer uma troca ou de um proselitismo camuflado de ação social; o amor dEle é verdadeiro e real. Se Wesley estava certo, nossas igrejas devem amar, ajudar e resgatar os desprovidos financeiramente.

EVANGELIZAÇÃO: pregação ao ar livre e em todos lugares

A história mostra que Wesley teve muitas dificuldades no início para aceitar a ideia de pregar ao ar livre, sendo somente depois de muita insistência do seu amigo George Whitefield que ele começou a ir para as ruas, fábricas, praças e aonde o aceitarem. Porém, depois de convencido dedicou-se a finco à sua responsabilidade missionária, que de acordo com Lelièvre: “Calcula-se que nos nove últimos meses do ano de 1739 ele pregou cerca de 500 vezes, das quais somente umas oito ou dez foram nas igrejas (…) [Wesley] Viajava em média 5.000 quilômetros por ano, a maior parte deles a cavalo. (…) [ele] aceitou a vida missionária como um dever, e sabia transformar a sua obrigação em trabalho verdadeiramente agradável”. Se Wesley estava certo, cada nação será nosso campo missionário, cada igreja será uma sociedade que envia missionários e cada membro aceitará sua responsabilidade missionária.

ECONOMIA: ganhe tudo o que puder, poupe tudo que puder e doe tudo o que puder

Uma das maiores dificuldades da sociedade moderna é se desfazer do apego financeiro. Na época de Wesley essa realidade não era diferente, e ele foi de encontro com qualquer tipo de pensamento e atitude gananciosa. Não foi por acaso que Wesley e seus companheiros foram apelidados pejorativamente de metodistas, pois seu estilo de vida era extremamente rigoroso, especialmente a parte financeira. Se Wesley estava certo, não ganhamos para ostentar, tão pouco poupamos para nos enriquecermos, mas utilizamos os recursos que Deus nos deu para investirmos no Reino dEle e para dividir o pão nosso com o nosso irmão desprovido.

JUSTIÇA: a luta contra a escravidão

Uma das contribuições mais significativas de Wesley para a sociedade é sua influência política contra a escravatura. O até então jovem William Wilberforce estava iniciando seus longos anos na carreira política e recebeu uma carta do respeitado pastor da Inglaterra, John Wesley, dizendo a ele que “Não se canse de fazer o bem. Eu sigo em frente em nome de Deus e no poder de Sua força, até que a escravidão americana (a mais vil que alguma vez viu o sol) possa ser banida diante dele”. Wesley tinha convicção que o cristão deve lutar pelos seus direitos e dos outros, para que haja justiça no mundo. Se Wesley estava certo, nós cristãos nos envolveremos com a política não para obtermos poder, mas para que a retidão, a justiça e a equidade, sejam garantidas (Pv 2:9).

Soli Deo gloria

A influencia da soteriologia arminiana e wesleyana no pentecostalismo clássico brasileiro

A concepção de graça preveniente norteia a soteriologia pentecostal clássica, que reproduz ou se aproxima da teologia arminiana clássica e da teologia wesleyana.

O arminianismo clássico compreende que Deus oferece graça salvadora a todas as pessoas através do Espírito Santo (1Tm 2.3-4; Tt 2.11), capacitando-as a opor-se à influência do pecado, e possibilitando uma resposta positiva a Deus (Jo 15.26-27; 16.7-11). Deus toma sempre a iniciativa, cabendo ao pecador responder em fé e obediência voluntária (Lc 15; Rm 5.6-8; Ef 2.4-5; Fp 2.12-13). Contudo, os pecadores podem resistir à graça, e continuar no pecado e rebelião contra Deus. A graça de Deus capacita e encoraja uma resposta positiva e salvífica para todas as pessoas, mas ela não é determinante ou irresistível para ninguém (At 7.51). Uma resposta positiva inicial de fé e obediência também não garante a perseverança dos salvos. É possível iniciar um relacionamento genuíno e pessoal com Deus, e depois se afastar Dele, persistindo no mal de sorte que a pessoa, por fim, se perca (Rm 8.12-13; 11.19-22; Gl 5.21; 6.7-10; Hb 6.1-8; Ap 2.2-7). (WALLS, 2014, p. 14.)

As ideias acima estão presentes nas obras de Myer Pearlman (1898-1943), um dos principais teóricos do pentecostalismo clássico no Brasil. Pearlman, educador, teólogo e escritor norte-americano, teve sua obra Conhecendo as Doutrinas da Bíblia, traduzida e publicada no Brasil em 1959, pelo missionário Lawrence Olson, e adotada como livro-texto de teologia sistemática, no Instituto Bíblico Pentecostal (IBP), no Rio de Janeiro, e no Instituto Bíblico das Assembleias de Deus (IBAD, em Pindamonhangaba (SP) (ARAÚJO, 2007, P. 547). Conforme Pearlman:

As Escrituras ensinam constantemente que o homem tem o poder de escolher livremente entre a vida e a morte, e Deus nunca violará esse poder. […] Pode-se resistir à graça de Deus? […] O Novo Testamento ensina, sim, que é possível resistir à graça divina e resistir para a perdição eterna (Jo 6.40; Hb 2.3; 6.46; 10.26-30; 2 Pe 1.10; 2.21), e que a perseverança é condicional dependendo de manter-se em contato com Deus. Note-se especialmente Hebreus 6.4-6 e 10.26-29. (PEARLMAN, 1970, p. 173)

Apesar de ainda não ter uma Confissão de Fé própria, o pentecostalismo clássico brasileiro, através de suas publicações nos órgãos oficiais (jornais, revistas e livros), é basicamente arminiano/wesleyano em sua soteriologia.

A graça preveniente na teologia de Jacó Armínio
O posicionamento de Armínio (1569-1609) sobre a graça preveniente foi registrado em sua Declaração de Sentimentos, onde ele atribui à graça o início, a continuidade e a consumação de todo bem. Para Armínio, a influência da graça é tamanha que um homem, embora regenerado, de forma alguma pode conceber, desejar, nem fazer qualquer bem, nem resistir a qualquer tentação do mal, sem esta graça preveniente e estimulante, seguinte e cooperante. Ele insiste no fato de que é equivocada a ideia que alguns disseminam a seu respeito alegando que uma ênfase exagerada é dada por ele ao livre-arbítrio. E ainda:

Pois toda a controvérsia se reduz à solução desta questão, “a graça de Deus é uma certa força irresistível”? Isto é, a controvérsia não diz respeito àquelas ações ou operações que possam ser atribuídas à graça, (pois eu reconheço e ensino muitas destas ações ou operações quanto qualquer um) mas ela diz respeito unicamente ao modo de operação, se ela é irresistível ou não. Em se tratando dessa questão, creio, de acordo com as Escrituras, que muitas pessoas resistem ao Espírito Santo e rejeitam a graça que é oferecida. (OLSON, 2013, p. 210).

Após a morte de Armínio, quarenta e seis ministros holandeses elaboraram um documento chamado de “Remonstrância” (protesto), onde reafirmaram os conceitos de Armínio. Em seu Artigo III, enfatiza a depravação total do homem. No Artigo IV se declara a possibilidade da graça preveniente ser resistida.

A graça preveniente na teologia de John Wesley
John Wesley (1703-1791), o grande teólogo e pregador inglês, pai do metodismo, movimento que influenciou o surgimento do pentecostalismo clássico, entendia a salvação do homem nos moldes do arminianismo clássico:

A graça opera diante de nós para nos atrair em direção à fé, para iniciar sua obra em nós. Até mesmo a primeira e frágil intuição da convicção do pecado, a primeira insinuação de nossa necessidade de Deus, é a obra da graça preparadora e antecedente à beira do nosso desejo, trazendo-nos em tempo de afligirmo-nos sobre nossas próprias injustiças, desafiando nossas disposições perversas, de modo que nossas vontades distorcidas gradualmente cessam de resistir ao dom de Deus. (OLSON, 2013, p. 219).

Sobre a ideia de graça irresistível, Wesley não defende tal realidade no que se refere aos aspectos do chamado ou oferta para a salvação, mas ao restabelecimento das faculdades humanas que estabelecem o equilíbrio e responsabilidade individuais. Para ele a graça preveniente não é irresistível, não aniquila a personalidade. A graça é necessária e imprescindível, pois produz no seu um “eu” responsável, e isso se dá em parte pela restauração das faculdades. No princípio do processo da salvação, não há uma graça cooperante, mas uma graça livre, como atividade apenas de Deus (COLLINS, 2010, p. 109).

Conclusão
O chavão evangelístico que diz “dê um passo para Deus que Ele dará dois em sua direção”, não se sustenta à luz do arminianismo clássico, do pensamento wesleyano, nem da própria teologia pentecostal clássica. Tal apelo é norteado pelo arminianismo de cabeça (OLSON, 2013, p. 23.) e arminianismo contemporâneo (WALLS; DONGELL, 2014, p. 64.), que são essencialmente semipelagianos, e que acreditam que o homem não se encontra no estado de depravação total, podendo de alguma maneira tomar a iniciativa de buscar a Deus e de conseguir a sua salvação pessoal.

O arminianismo clássico não defende a ideia de que o homem após a queda não se tornou totalmente depravado, de que pode escolher o bem espiritual, e de exercer fé em Deus de maneira a receber o evangelho e assim tomar posse da salvação para si mesmo (SEATON, 2012, p.4-5).

Toda salvação pessoal é resultado da iniciativa graciosa de Deus, que ilumina o entendimento humano para a verdade do Evangelho, e que afrouxa as rédeas do poder do pecado. Somente a operação da graça preveniente torna o homem capaz de crer e aceitar o dom gratuito de Deus, que é a vida eterna em Cristo Jesus (Ef 2.1-10), ou de livremente rejeitá-lo, tornando-se assim moralmente responsável por tais decisões.

Enquanto escrevo o presente artigo, há uma visível mobilização no pentecostalismo clássico brasileiro, partindo da academia e dos órgãos oficiais das Assembleias de Deus, no sentido de propagar e consolidar o pensamento teológico e soteriológico aqui exposto. Os limites da teologia arminiana/wesleyana no pentecostalismo clássico brasileiro, em sua relação com as demais correntes teológicas, caminham para uma maior clareza e percepção.


Referências bibliográficas
ARAÚJO, Isael de. Dicionário do movimento pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2007.
COLLINS, Kenneth J. Teologia de John Wesley. Rio de Janeiro: CPAD, 2010.
OLSON, Roger E. Teologia Arminiana: mitos e realidades. São Paulo: Editora Reflexão, 2013.
PEARLMAN, Myer. Conhecendo as doutrinas da Bíblia. Belo Horizonte: Editora Vida, 1970.
SEATON, W. J. Os cinco pontos do calvinismo. 3.ed. São Paulo: PES, 2012.
WALLS, Jerry; DONGELL. Por que não sou calvinista. São Paulo: Editora Reflexão, 2014.


Altair Germano Pastor e missionário na Europa pela Assembleia de Deus em Abreu e Lima-PE, conferencista e escritor. Retirado integralmente do site: Teologia Brasileira.

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