Pastores-Mestre: O Dom de Cristo à sua igreja

E ele designou alguns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres

Efésios 4:11

As sociedades não se tornam seculares simplesmente quando abandonam totalmente a religião, mas quando já não se sentem incomodadas por ela. Esse é o sinal mais perigoso: quando a fé já não mexe, já não confronta, já não incomoda. E, ironicamente, esse mesmo risco ronda também a própria igreja de Cristo, justamente no lugar em que menos esperaríamos — na compreensão do seu clero. Não porque estejamos descartando o ministério pastoral, mas porque já não enxergamos sua natureza teológica como algo estimulante ou central. A figura do pastor como teólogo — aquele que abre as Escrituras para ajudar o povo a conhecer a Deus, a si mesmo e ao mundo — já não faz mais os corações arderem, como os discípulos a caminho de Emaús (Lc 24.32).

Em nossos dias, muitos pastores, como Esaú, têm trocado sua herança vocacional por um prato de lentilhas (Gn 25.29-34; Hb 12.16). Em vez de mergulharem na Palavra, tornam-se especialistas em gestão, estrategistas de marketing, coachs de liderança e terapeutas improvisados. E o pior: muitas congregações passaram a exigir exatamente isso deles — preferindo títulos de MBA a homens de oração. Não é de se estranhar que tantos recém-formados saiam do seminário reclamando que não foram preparados para o “verdadeiro trabalho” do ministério. Enquanto isso, os próprios seminários, pressionados pelas demandas do mercado eclesiástico, reformulam seus currículos e acabam contribuindo ainda mais para a perda da teologia na vida da igreja.

A história, é claro, é longa e complexa. Já foi contada em muitos livros. Mas a ideia central é clara: a teologia foi banida de Jerusalém e posta em exílio. O resultado é que o conhecimento de Deus se torna cada vez mais raso entre nós. E a comunidade da aliança, chamada a ser jardim frutífero, passa a parecer um deserto — uma terra seca, cheia de oportunidades desperdiçadas, que já não cultiva discípulos como outrora.

Por isso, mais do que nunca, precisamos resgatar a identidade do pastor como teólogo. Não como um acadêmico de gabinete, mas como um servo que conduz o rebanho às verdes pastagens da Palavra. O povo de Deus não precisa de mais “gestores” — precisa de homens que façam os corações arderem novamente com as Escrituras abertas diante deles.

Escrevo a vocês, meus colegas de ministério — e aqui não me refiro apenas aos pastores titulares! — porque percebo o quanto precisamos resgatar a essência teológica da nossa vocação. Não importa se o ministério que você exerce é definido como “pastor de jovens”, “educador cristão”, “pastor de vida congregacional”, “líder de louvor” ou qualquer outra função. A verdade é que todos nós fomos chamados para algo maior do que um cargo: fomos chamados para falar de Deus e, ao mesmo tempo, lidar com as pessoas. E vamos ser honestos: nenhuma dessas duas tarefas é simples… mas ambas são inevitáveis. Cabe a nós, em qualquer área de atuação, comunicar Cristo e ministrar a Palavra em todo tempo, de várias formas e a todas as pessoas. Esse é o coração do nosso chamado: ministrar a Palavra de Deus ao povo de Deus.

Escrevo também a vocês, igrejas, porque sei que precisam ser lembradas da seriedade dessa vocação. É urgente repensar a natureza, a função e até mesmo as credenciais que vocês exigem de seus pastores. Mais do que diplomas bonitos na parede, seus pastores precisam de condições para servir e crescer como teólogos públicos — homens que falam de Deus para o mundo e do mundo diante de Deus. Além disso, lembro a vocês que a igreja não é apenas uma comunidade social, mas uma comunidade teológica, criada pela Palavra e sustentada pelo Espírito. Vocês não escrevem a própria história com Deus como coadjuvante; é o contrário: estão inseridos na grande história de Deus. E é exatamente aí que entra a nossa vocação pastoral. Um pastor-teólogo existe para ajudá-los a enxergar isso, a viver isso e a ensinar outros a crer nisso.

Problema: uma visão perdida

Eu tenho aprendido que, sem visão teológica, nós, pastores, perecemos. A visão é aquilo que nos permite enxergar onde estamos e para onde devemos ir. Muitas vezes, o que vemos assusta e intimida. Pedro andou sobre as águas com os olhos fixos em Jesus, mas quando olhou para o vento e as ondas, começou a afundar (Mt 14.28-31). O que o fez tropeçar não foi a tempestade em si, mas o deslocamento do olhar. E confesso: muitas vezes acontece o mesmo conosco. Quando nossa visão é dominada pela realidade aparente, sufocamos a fé; mas, quando a fé em Cristo guia nosso olhar, somos capazes de ver o mundo como ele realmente é — criado, redimido e amado por Deus. Essa sempre foi a mensagem dos profetas: anunciar o que viam, testemunhando que Deus está renovando todas as coisas por meio de Seu Servo e de Seu povo da aliança. Se essa é a visão que nos foi dada, eu pergunto: por que tantos pastores estão se afogando em pleno mar?

A tempestade não é o problema. O que nos faz afundar, muitas vezes, não são as ondas do mar, mas as ondas do sentimento popular; não é o vento do mar, mas os ventos da opinião pública. Eles sopram contra nós e nos tentam a abandonar nossa tarefa teológica, impedindo-nos de levar o povo de Deus à maturidade em Cristo (cf. Ef 4.14). Nadar contra a corrente cultural nunca é fácil, e sei que o pastor fiel sempre será alguém da contracultura. Afinal, como não ser contracultural quando proclamamos Cristo crucificado e chamamos os discípulos a imitarem o Senhor, morrendo para si mesmos? O chamado ao autoesvaziamento nunca será atraente para um mundo que ama carteiras cheias e guarda-roupas abarrotados.

Mas reconheço que nosso chamado se torna ainda mais desafiador porque lidamos com três públicos diferentes, três realidades sociais diante das quais precisamos falar de Deus: (1) a academia, (2) a igreja e (3) a sociedade em geral. Se Deus é o Criador de tudo, visível e invisível, e se o evangelho é para todo o mundo, então não existe sequer um centímetro quadrado do universo nem um único aspecto da vida humana que não estejam debaixo do senhorio de Cristo. O problema é que a maioria de nós vive em mais de um desses mundos ao mesmo tempo, e isso exige de nós uma sabedoria pastoral que só o Espírito pode dar.

Já aconteceu comigo no púlpito: no mesmo culto tenho diante de mim um adolescente cheio de dúvidas, um universitário mergulhado em filosofia, um marceneiro desempregado, uma mãe exausta pelo trabalho, um prefeito da cidade e até um professor de física. Como falar de Deus a todos eles de forma clara e fiel? Esse é o desafio do pastor-teólogo. O contexto principal é, sem dúvida, a igreja. Mas será que isso me exime de falar também à sociedade mais ampla ou até de dialogar com a academia? De jeito nenhum! O evangelho precisa ecoar em todos os cantos.

É por isso que entendo que nós, pastores-teólogos, precisamos ser “trilíngues”. Não no sentido de dominar idiomas, mas de aprender a falar a língua de cada contexto: da igreja, da universidade e da sociedade em geral. Nem sempre vamos falar com perfeição, mas precisamos, ao menos, nos esforçar para compreender e nos fazer compreender. Esse é o nosso chamado: traduzir fielmente a Palavra eterna em meio aos muitos mundos em que nosso povo vive.

E é justamente aqui que quero começar: analisando como a visão pastoral e teológica foi sendo perdida nesses três públicos.

Academia

E aqui está o ponto: se a teologia é, muitas vezes, escrita por acadêmicos para acadêmicos, eu — como pastor — não posso simplesmente me render a essa distância. É verdade que certas discussões acadêmicas parecem áridas ou irrelevantes para a vida de fé, mas a responsabilidade de mostrar a conexão entre doutrina e vida pertence a nós, pastores-teólogos. Quando alguém me pergunta, por exemplo, o que a doutrina da Trindade tem a ver com o desemprego de um pai de família, eu não posso me esquivar. Preciso mostrar que a vida cristã não é sustentada por psicologia de autoajuda, mas pelo fato de que o Deus triúno, eterno em amor e comunhão, nos chama para viver nele e dele participar. A Trindade não é apenas uma fórmula bonita para recitar — é a base da nossa salvação, da nossa comunhão e da nossa esperança.

Esse é um dos maiores dramas da transferência da teologia para a academia: quando deixamos de perceber que toda doutrina é pastoral. O ensino sobre a soberania de Deus, por exemplo, não é uma tese para congressos, mas a rocha firme para aquele irmão que acaba de enterrar sua esposa. A doutrina da encarnação não é apenas um debate cristológico — é a boa notícia para a irmã que se sente abandonada: em Cristo, Deus assumiu nossa carne e conhece, por experiência, nossas dores. Cada artigo de fé é alimento para a vida da igreja.

É por isso que digo: quando me coloco diante da congregação, não posso falar apenas como “gestor de pessoas” ou “especialista em liderança”. Preciso ser pastor-teólogo, alguém capaz de traduzir a profundidade das Escrituras e da fé cristã para a realidade concreta do povo de Deus. Isso não significa transformar o púlpito em sala de aula acadêmica, mas deixar que a Palavra forme mentes e corações para viverem no mundo real, com esperança e santidade.

E aqui está a tensão: como falar, ao mesmo tempo, para o erudito que conhece as discussões acadêmicas e para a irmã simples que nunca leu um livro de teologia, mas que carrega no peito a dor de um filho perdido? A resposta é que só conseguiremos isso se não abrirmos mão da nossa vocação pastoral-teológica. É preciso, de fato, aprender a ser “trilíngue” — falar com clareza bíblica na igreja, com rigor teológico na academia e com testemunho vivo na sociedade.

Se a visão pastoral foi perdida na academia, parte da nossa missão é resgatá-la: não como inimigos da teologia acadêmica, mas como aqueles que lembram ao mundo universitário que a teologia não é mero exercício intelectual. Ela é confissão, é doxologia, é pastoral. O verdadeiro teólogo não é apenas quem escreve livros complexos, mas quem abre a Escritura e mostra à igreja que toda verdade sobre Deus é boa nova para o coração cansado.

E aqui está outro grande desafio: o tal “muro de Berlim” erguido dentro da própria academia, separando estudos bíblicos e teologia. Essa divisão, tão artificial quanto prejudicial, tem produzido consequências sérias para a igreja. Nós, pastores, sabemos bem que a pregação é o coração do nosso ministério. Se nos obrigassem a escolher, a maioria de nós, sem pensar duas vezes, ficaria com os estudos bíblicos. Mas aí vem o problema: grande parte do que encontramos nos comentários acadêmicos modernos é quase impossível de ser pregado.

Explico: a academia, em muitos casos, trata a Bíblia apenas como documento histórico, e isso não é pouca coisa. Claro que contexto histórico, línguas originais e paralelos culturais têm o seu valor, mas quando a ênfase se desloca exclusivamente para o “mundo por trás do texto”, a voz de Deus no texto é silenciada. É como se, no esforço de explicar como Israel viveu no Antigo Oriente Próximo, esquecêssemos que o mesmo Deus que falou a Israel fala hoje à Sua igreja. O resultado? Sermões que parecem mais aulas de arqueologia ou história antiga do que proclamação do evangelho.

E aqui eu preciso dizer: um comentário bíblico que não conduz o pregador a Cristo e ao plano de Deus revelado em Cristo falhou em sua tarefa. Porque, no fim das contas, toda a Escritura aponta para Ele (Lc 24.27) e encontra sua unidade no mistério revelado de que Deus está reconciliando todas as coisas em Cristo (Ef 1.9-10). O que me entristece é ver estudiosos tratando a Escritura como material de pesquisa em vez de Palavra viva, e, consequentemente, muitos pastores se alimentando desse tipo de material para, depois, subir ao púlpito com mensagens que não alimentam ninguém.

Não me entendam mal: eu não sou contra a pesquisa acadêmica, nem contra a seriedade histórica. Mas eu creio que qualquer abordagem que retire a centralidade de Cristo do texto bíblico já deixou de ser teológica, ainda que tenha o rótulo de “estudo bíblico”. Para mim, um verdadeiro comentário bíblico é aquele que ajuda o pastor a proclamar o Cristo das Escrituras ao povo de Deus, e não apenas a demonstrar erudição.

É por isso que insisto: o pastor não pode abrir mão de sua identidade de teólogo. Precisamos ser capazes de discernir quando a academia nos oferece ferramentas úteis e quando ela tenta nos oferecer pedras em vez de pão. A igreja não sobrevive de curiosidades históricas, mas da Palavra que revela Cristo e o faz presente em cada geração.

Igreja

A muito tempo, tenho observado uma confusão crescente sobre o que realmente significa ser pastor e o que se espera que os pastores façam. E digo com franqueza: ainda há muita incerteza. O próprio termo “pastor” é uma metáfora, e essas metáforas podem se tornar prisões invisíveis. Muitas vezes, elas não refletem quem somos de fato, mas as preocupações e tendências da sociedade em que vivemos. A imagem que as pessoas têm de nós geralmente revela mais sobre a cultura do que sobre a nossa vocação.

Hoje, temos uma variedade enorme de imagens sobre o pastor: gestor de programas, terapeuta, líder comunitário, administrador de pessoas, comunicador de mídia, conselheiro emocional, agente de esperança… A lista poderia continuar. Cada uma dessas imagens traz alguma verdade, mas nenhuma pode definir integralmente o que significa ser pastor. A questão central permanece: o que faz da nossa vocação algo único e insubstituível?

E essa confusão não se limita à sociedade; ela alcança a formação de pastores. Muitos seminários estruturam seus cursos e conteúdos baseados em modelos de mercado, técnicas de gestão ou ferramentas de aconselhamento, muitas vezes esquecendo que a essência do ministério pastoral é teológica e bíblica.

Não me entendam mal: organizar programas, cuidar de pessoas e aconselhar são tarefas importantes. Mas não podem substituir o que só o pastor pode fazer: ministrar a Palavra de Deus, ensinar, pregar, aconselhar espiritualmente e moldar o povo de Deus para refletir a nova humanidade em Cristo. Essa é a nossa identidade e nossa vocação.

O perigo que vejo é a tendência de nos tornarmos pastores “profissionais” no sentido cultural: buscando reconhecimento, status, carreira ou técnica, e esquecendo que nossa principal autoridade vem de Deus e da fidelidade à Sua Palavra. Quando isso acontece, o pastor perde sua relevância espiritual, e a igreja se empobrece. Deixamos de aplicar categorias teológicas e espirituais à vida cotidiana, e o resultado é que desaparece o sentido do pecado, da graça e, muitas vezes, a presença viva de Deus.

Portanto, pergunto a mim mesmo e a vocês, colegas de ministério: quem queremos ser? Pastores guiados por modismos e pressões culturais ou pastores-teólogos, firmes na Escritura, moldados pelo Espírito e comprometidos em fazer discípulos, pregando, ensinando e formando o povo de Deus para viver a vida nova em Cristo? Minha convicção é clara: sem essa identidade, o ministério perde sua força, e a igreja deixa de cumprir sua missão.

Sociedade

Era uma vez, e nem faz tanto tempo assim — me refiro ao século XIX — pastores que eram figuras públicas respeitadas, valorizadas e reverenciadas. Não raro, eram as pessoas de maior nível educacional em cidades pequenas ou médias, verdadeiros intelectuais de suas comunidades. Avançando um século, porém, vemos como a situação mudou radicalmente. Hoje, a imagem do pastor muitas vezes se reduz a caricaturas: o moralista reprimido, o megalomaníaco cheio de si ou aquele que parece mais preocupado com a aparência do que com a Palavra de Deus. Infelizmente, há uma boa dose de verdade nesse retrato superficial, e precisamos encará-la.

O brasileiro médio que frequenta igreja confessa sua fé em Cristo, mas vive mergulhado na mesma cultura que todo mundo: novelas, filmes, programas de TV e redes sociais moldam suas expectativas e percepções. A cultura popular tanto reflete quanto molda a forma como as pessoas enxergam os pastores. E, nesse cenário, eu me pergunto: que tipo de figura pública o pastor representa? Que imagem projetamos quando falamos de Deus?

Ser um pastor-teólogo — alguém que fala de Deus para diferentes públicos — é, antes de tudo, ser honesto com os olhos das pessoas. E aqui está a difícil situação: precisamos apresentar verdades sobre Deus de maneira que façam sentido no discurso público, sem nos render às expectativas culturais de reconhecimento ou aprovação. Falar de Deus é paradoxal: somos humanos, limitados, e ainda assim chamados a proclamar o Criador do universo. Quem somos nós, criaturas falíveis, para ousar falar sobre Aquele que é soberano, infinito e santo?

Mas é justamente nesse paradoxo que reside o chamado do pastor. Não estamos aqui para crescer socialmente, para angariar prestígio ou fama, nem para atrair atenção para nós mesmos. Nosso objetivo é apontar para Deus, levando as pessoas a adotarem a forma de pensar, sentir e viver que Ele deseja. É um chamado que exige humildade: muitas vezes precisamos diminuir nossa posição social, reconhecer nossa fragilidade e nossa contínua necessidade da graça de Deus, assim como Paulo fazia (1Tm 1.15).

Além disso, somos chamados a falar em público sobre temas amplos — o sentido da vida, o bem comum, a moralidade, a fé — mesmo sem ter credenciais reconhecidas pela sociedade, ao contrário de especialistas que dominam suas áreas. A situação é ainda mais desafiadora quando consideramos que, na opinião geral, figuras públicas são frequentemente vistas com desconfiança. As pessoas tendem a questionar as motivações de quem representa uma instituição ou organização.

É certo que confiamos em neurocirurgiões para operar cérebros ou em pilotos para voar aviões, porque suas habilidades são reconhecidas e mensuráveis. O pastor, porém, enfrenta outro tipo de desafio: explicar sua contribuição para o bem público exige afirmar um conhecimento especializado que nem sempre é tangível aos olhos da sociedade — um conhecimento que une teologia, ética e a aplicação da Palavra de Deus à vida cotidiana. Precisamos vestir o manto da autoridade intelectual sem nos tornarmos arrogantes, sempre apontando para Cristo e não para nós mesmos.

O paradoxo é grande, mas necessário: o pastor deve ser autoridade sem buscar prestígio, guia sem buscar adulação, e mestre sem se reduzir a mero consultor de bem-estar social. A tarefa é difícil, mas é o que nos distingue. Falar de Deus ao mundo de forma pública e relevante é o que nos mantém fiéis ao chamado, e é isso que garante que nossas comunidades realmente conheçam e experimentem a presença viva de Cristo.

Então, vamos resumir o que venho afirmando até aqui. Primeiro, os pastores são e sempre foram teólogos. Em segundo lugar, cada teólogo é, de certa forma, um teólogo público, um intelectual com uma missão específica, um generalista da fé que fala para pessoas reais, em contextos reais. E quero enfatizar algo que considero central: não é preciso ter uma cadeira acadêmica ou QI elevado para ser um intelectual. Mas é preciso ter QT — quociente de teologia — elevado, uma capacidade de pensar, compreender e aplicar a Palavra de Deus de forma clara, fiel e relevante. Em terceiro lugar, o propósito de o pastor-teólogo atuar como intelectual público é servir ao povo de Deus, edificando-o na fé que nos foi entregue “uma vez por todas” (Jd 3).

Quando falo que pastores são teólogos, não me refiro apenas a títulos acadêmicos ou publicações em revistas especializadas. Falo de algo muito mais profundo: dizer com clareza e fidelidade o que Deus está fazendo em Cristo. Historicamente, esse aspecto de nossa vocação tem sido esquecido, relegado a um grupo restrito de “profissionais da teologia”. Mas essa separação é prejudicial. Ela sugere — ainda que indiretamente — que pastores e leigos não seriam capazes de elaborar teologia, ou que não teriam autoridade para falar de Deus porque não possuem credenciais formais. Essa é uma mentira que precisa ser confrontada.

A teologia é demasiado importante para ser monopolizada. Cada pastor, cada discípulo, cada cristão é responsável diante de Deus por compreender e agir conforme o conhecimento de Deus que lhe é dado — seja por meio da criação, seja pelo coração humano, seja pela própria Escritura (Rm 1.19-21). O que isso significa na prática? Significa que todos nós somos chamados a ler, meditar, refletir e aplicar a Palavra, sempre com amor, obediência e confiança. Não existe cristão “comum” incapaz de pensar teologicamente; existe, sim, uma responsabilidade real de crescer nesse entendimento e de não deixar que outros falem por nós em questões de fé.

E é exatamente aqui que entra a urgência do pastor-teólogo: precisamos resgatar nossa vocação de falar sobre Deus de maneira pública, relevante e fiel. Precisamos ensinar e guiar nossa igreja para que compreenda Cristo, sua obra e a realidade do mundo segundo os olhos de Deus. Ser pastor não é apenas gerir pessoas ou programas; é ser um mestre do povo de Deus, capaz de traduzir a grandeza de Deus para a vida cotidiana das pessoas.

A pergunta que nos move é simples, mas profunda: se não nós, quem falará? Se não com fidelidade e clareza, quem conduzirá nosso povo ao entendimento da Palavra? Pastores que não exercitam sua função de teólogos públicos correm o risco de ver a igreja perder não apenas a direção, mas o próprio sentido da fé em Cristo. E isso, meus irmãos, é inaceitável.

Quando lemos Efésios 4:11, vemos que Cristo “deu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres”. Muitos olham para essa passagem e entendem que “pastor” e “mestre” são dons distintos, como se alguém pudesse ser apenas pastor ou apenas mestre. Mas, na prática, não é assim. A Palavra nos mostra que o dom de pastor e o dom de mestre são, na realidade, duas faces da mesma moeda: o mesmo dom se manifestando de maneiras complementares.

O pastor que não é mestre corre o risco de cuidar de pessoas sem levá-las a entender profundamente a Palavra de Deus. Ele se torna apenas um gestor de emoções ou um conselheiro de situações imediatas. Por outro lado, o mestre que não é pastor corre o risco de ser um acadêmico isolado, incapaz de aplicar sua teologia à vida concreta das pessoas. O dom completo se manifesta quando o pastor é também mestre: alguém que cuida do rebanho e, ao mesmo tempo, ensina e edifica o povo na verdade de Deus.

Ser pastor e mestre significa, portanto, guiar vidas com coração e cabeça: com compaixão e com conhecimento. É proclamar Cristo de maneira que as pessoas compreendam o que Ele fez, o que Ele está fazendo e como Ele quer que vivamos em resposta à sua graça. É transformar a igreja não apenas em um lugar de encontros emocionais, mas em uma comunidade de discípulos formados, capazes de entender, aplicar e defender a fé.

Efésios 4:12 reforça essa aplicação: o propósito desse dom é “aperfeiçoar os santos para a obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo”. Ou seja, o pastor-teólogo não está a serviço do próprio ego, nem para ocupar um espaço social ou cultural; está a serviço da igreja, preparando o povo de Deus para crescer em maturidade, em santidade e em conhecimento da Palavra.

Portanto, todo pastor que se vê apenas como cuidador de almas precisa se lembrar: o Senhor o chamou para ser também mestre. E todo mestre que se contenta apenas com o estudo e o ensino da Bíblia precisa se lembrar: Cristo o chamou para pastorear, para se relacionar com pessoas, para guiá-las na vida prática da fé. O verdadeiro pastor-teólogo é aquele que une ambos os aspectos: cuidado e ensino, coração e mente, zelo pastoral e profundidade teológica.

De olho no texto

O versículo de Efésios 4:11 diz:

“E ele mesmo deu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres” (NVI).

No grego original, a expressão é “καὶ ἑτέρους ποιμένας καὶ διδασκάλους” (kai heterous poimenas kai didaskalous). Aqui está a chave: a conjunção καὶ (kai) geralmente significa “e”, mas o grego permite que ela seja usada de forma distributiva ou inclusiva. Ou seja, não necessariamente indica dois grupos distintos; pode muito bem indicar uma função única com duas dimensões.

Em termos práticos, isso significa que o “pastor” e o “mestre” não são dois dons separados, mas duas facetas de um mesmo dom que se manifesta na liderança espiritual do povo de Deus. O pastor cuida do rebanho, protege, guia e sustenta. O mestre, por sua vez, instrui, explica a Palavra, edifica, corrige e ensina o povo a viver segundo a vontade de Deus. Mas na prática do ministério, essas funções se entrelaçam: um verdadeiro pastor não pode cuidar sem ensinar; um verdadeiro mestre não pode ensinar sem cuidar.

O texto grego reforça isso pelo uso da palavra ἑτέρους (heterous), que significa “outros”, ou “uns outros”, e pelo kai entre “poimenas” e “didaskalous”. Paulo não está dizendo que há alguns pastores e outros mestres isolados; ele está descrevendo uma função pastoral completa: cuidar e ensinar ao mesmo tempo.

Essa leitura é reforçada pelo contexto imediato: Efésios 4:12 explica o propósito desses dons:

“para o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para a edificação do corpo de Cristo”.

O dom de pastor-mestre existe para preparar o povo de Deus, e para isso é necessário que quem o exerce tenha tanto a capacidade de cuidar com amor quanto a de ensinar com clareza e fidelidade. Não há espaço para separar as duas dimensões, porque a maturidade do corpo de Cristo depende de ambas.

Em resumo: o grego nos mostra que o chamado pastoral é unitário e multifacetado. Pastores e mestres não são grupos distintos; são dois aspectos do mesmo dom que Deus dá à igreja para que sua Palavra seja fielmente proclamada e praticada. Quem entende isso reconhece que exercer o ministério é cuidar do povo enquanto o ensina na verdade, e é exatamente essa visão que precisa ser recuperada em nossas igrejas brasileiras hoje.

A necessidade teológica

Diante de tudo que já analisamos, torna-se evidente que o pastor não pode prescindir de uma base teológica sólida. Não estou falando apenas de decorar versículos ou repetir frases bonitas — falo de entender profundamente o que a Bíblia ensina sobre Deus, sobre o ser humano e sobre a salvação, e de conseguir comunicar isso de forma clara e fiel à congregação. Alguns aspectos são absolutamente centrais: escatologia, soteriologia, e a própria definição teológica do pastor quanto a tradições como arminianismo ou calvinismo, pactualismo ou dispensacionalismo.

Por que isso é tão importante? Porque essas áreas da teologia moldam a maneira como o pastor interpreta a Palavra e aplica a fé na vida das pessoas. A escatologia, por exemplo, nos ajuda a orientar o povo em esperança, em perseverança e em discernimento do que virá; a soteriologia nos permite explicar a obra de Cristo na cruz e a relação do pecador com Deus de maneira sólida e não superficial. Se o pastor não tem clareza sobre esses pontos, sua pregação corre o risco de ser vaga, incoerente ou facilmente distorcida por interpretações populares ou modismos culturais.

Além disso, a definição teológica do próprio pastor é fundamental. Saber se você se alinha mais a uma perspectiva arminiana ou calvinista, pactualista ou dispensacionalista, não é um detalhe acadêmico: isso define como você entende a graça, a eleição, o pacto de Deus com seu povo, e como você orienta a vida e a fé de sua igreja. Um pastor que não tem essa clareza está navegando no escuro, e é terrível para a igreja quando ela não tem um norte teológico. Sem esse ponto de referência, a congregação se torna vulnerável a confusões doutrinárias, a interpretações superficiais da Bíblia e a práticas religiosas que podem até ser emocionantes, mas não edificam na fé nem levam à maturidade cristã.

Quando pastores negligenciam a teologia e não conseguem ensinar com segurança sobre Deus, sobre a salvação ou sobre os desígnios do Senhor, a igreja perde identidade. Ela deixa de ser comunidade de discípulos para se tornar apenas um grupo que compartilha sentimentos e experiências, sem entendimento profundo da Palavra. E, como sabemos, uma igreja sem direção teológica sólida facilmente se afasta da verdade, mesmo sem perceber, abrindo espaço para heresias sutis, distorções do evangelho e uma fé que não transforma de verdade.

Portanto, pastores, não podemos fugir desse desafio: devemos ser capazes de explicar e ensinar a teologia em suas dimensões fundamentais, definindo com clareza nossas convicções à luz das Escrituras. Ser pastor-teólogo não é luxo ou formalidade; é necessidade urgente para o bem da igreja, para a fidelidade ao evangelho e para o crescimento espiritual do povo de Deus.

Do púlpito para a sociedade

Além de dominar os fundamentos teológicos da fé — soteriologia, escatologia, cristologia e definição doutrinária —, o pastor tem a responsabilidade de dar respostas bíblicas a questões que atravessam a sociedade. Temas como feminismo, aborto, ética sexual, política, economia e cultura não são meros debates sociais; eles refletem visões de mundo que moldam comportamentos, valores e decisões. A igreja, e o povo de Deus em particular, precisa de orientação clara, baseada na Palavra de Deus, para discernir o que é certo e verdadeiro à luz do evangelho.

Quando falo em feminismo, por exemplo, não me refiro a debates ideológicos simplistas, mas à necessidade de apresentar a dignidade do homem e da mulher como criados à imagem de Deus, respeitando a diferença e a igualdade de valor diante de Deus. No aborto, o pastor deve declarar, com coragem e mansidão, o valor da vida humana desde a concepção, fundamentado nas Escrituras. Em política e cidadania, o pastor deve ajudar o povo a pensar sobre justiça, autoridade e responsabilidade social à luz de Romanos 13, sem cair no ativismo ou no sectarismo partidário, mas trazendo a perspectiva bíblica sobre como viver como sal e luz no mundo.

O pastor-teólogo não pode se omitir dessas discussões. Negar a necessidade de apresentar a cosmovisão bíblica é deixar a igreja sem bússola, vulnerável a ideologias passageiras e modismos culturais. Ao mesmo tempo, o pastor não fala apenas para a congregação. Efésios 4 nos lembra que o dom do pastor-mestre existe para edificar o corpo de Cristo, mas o ministério do pastor também tem dimensão pública. A sociedade em geral precisa ouvir de alguém que entende e pode explicar como a Palavra de Deus responde a grandes questões humanas e sociais, não de forma sectária, mas com clareza e autoridade.

Em outras palavras, o pastor é chamado a ser voz do evangelho em todos os contextos, apresentando a verdade de Deus tanto para os santos quanto para o mundo. Não é sobre impor uma visão, mas sobre apresentar a cosmovisão bíblica, mostrando que a fé cristã não é um sentimento particular ou privado, mas uma forma coerente e prática de compreender e viver o mundo. Uma igreja sem pastores capazes de falar sobre essas questões com segurança teológica e pastoral corre o risco de se perder em um mar de opiniões, modismos e pressões culturais.

Portanto, pastores, precisamos ser pastores-teólogos que conhecem, aplicam e comunicam a Palavra, capazes de cuidar do povo e ao mesmo tempo instruir a sociedade, sem medo, com amor, clareza e fidelidade à Escritura. Esse é o chamado urgente para a igreja brasileira hoje

Conclusão

Diante de tudo que vimos, fica claro que ser pastor-teólogo não é um detalhe ou luxo acadêmico — é uma exigência do próprio Senhor. Não podemos nos contentar com ministérios superficiais, com respostas prontas ou com posições vagas diante das grandes questões da vida e da sociedade. Somos chamados a ministrar a Palavra de Deus com fidelidade, clareza e autoridade, edificando o povo de Deus e proclamando a verdade ao mundo, mesmo quando isso contraria tendências culturais ou opiniões populares.

E, como nos lembra o apóstolo Paulo, em 1 Coríntios 4:2: “Ora, além disso, o que se requer nos despenseiros é que cada um seja encontrado fiel”. O Senhor não nos cobra sucesso segundo os padrões do mundo, nem prestígio, nem popularidade. Ele espera nos encontrar fieis à Palavra, fiéis à nossa vocação, fiéis em ensinar, pregar, aconselhar e guiar seu povo na verdade. Essa fidelidade é a medida de nosso ministério, e é a fidelidade que produz fruto duradouro na vida da igreja e na sociedade.

Portanto, pastores, nosso desafio é grande, mas nossa recompensa é certa: servir a Cristo com fidelidade, como mestres e pastores, apresentando a Palavra com clareza, coragem e convicção, confiando que o Senhor encontrará cada um de nós sendo fiel ao chamado que Ele confiou. Que possamos abraçar nossa vocação como teólogos públicos, conscientes de que nossa vida e ministério têm impacto eterno, não apenas na igreja, mas em toda a sociedade.


Referências:

O Pastor Como Teólogo Público – Kevin J. Vanhoozer e Owen Strachan – Editora Vida Nova

O Pastor como Mestre e o Mestre como Pastor – John Piper , D. A. Carson – Editora Fiel

toto slot

slot gacor

Culto: da Adoração ao Entretenimento

“O culto não é para o homem, mas para Deus; não começa na criatividade humana, mas na revelação divina.”

Vivemos dias de profunda crise litúrgica. O culto cristão, que deveria ser a mais pura expressão de reverência, comunhão e proclamação, está sendo lentamente corroído por tendências pragmáticas, estéticas e mercadológicas. O entretenimento, com suas luzes, sons e dinâmicas cênicas, tem ocupado o espaço da adoração. E como bem observou A. W. Tozer: “O que nos atrai, é o que nos convence; e o que nos convence, é o que nos conquista.”

Esse processo não é novo, mas tem ganhado força em nossos dias com a secularização da espiritualidade. O culto, que deveria ser regido pelas Escrituras, tem se tornado um produto moldado pelos gostos do público. Como evidenciado no artigo A Influência do Entretenimento dentro da Estrutura Litúrgica dos Cultos Cristãos (Salgado & Maximo, 2024), a lógica do espetáculo substituiu a lógica da reverência. O culto virou evento, e o púlpito virou palco.

TEXTO BASE: Levítico 10.1-3

“Nadabe e Abiú, filhos de Arão, tomaram cada um o seu incensário, e puseram neles fogo, e colocaram incenso sobre este, e trouxeram fogo estranho perante o Senhor, o que não lhes ordenara. Então saiu fogo de diante do Senhor e os consumiu; e morreram perante o Senhor. Disse Moisés a Arão: Isto é o que o Senhor falou, dizendo: Serei santificado naqueles que se chegam a mim, e serei glorificado diante de todo o povo. Arão, pois, calou-se.”

Este episódio dramático e solene nos apresenta uma das bases mais firmes para a doutrina conhecida como o Princípio Regulador do Culto. Segundo este princípio, somente aquilo que Deus expressamente ordenou em Sua Palavra deve ser praticado no culto público. Tudo o que Ele não ordenou deve ser excluído. Nadabe e Abiú pecaram não ao fazer algo que Deus proibira explicitamente, mas ao introduzirem no culto algo que Deus não havia ordenado. O resultado foi desastroso: foram consumidos pelo fogo divino.

“A igreja que entretém não é perseguida pelo mundo — ela é aplaudida por ele.”

A Centralidade do Culto na Vida da Igreja

Para os reformadores, o culto era a principal expressão da fé cristã. Lutero afirmava que a verdadeira igreja é aquela em que o evangelho é pregado e os sacramentos corretamente administrados. Calvino ia além, argumentando que o culto deveria ser inteiramente regulado pela Escritura, pois “Deus desaprova qualquer culto inventado pelo homem”. Calvino ainda afirmou:

“Uma vez que Deus não apenas nos prescreve o que devemos fazer, mas também nos ensina como devemos fazê-lo, é necessário que sigamos essa direção com reverência e obediência.” (João Calvino, Institutas, Livro 4, Capítulo 10).

O culto público não é mero encontro fraterno, tampouco um espaço de expressão artística ou entretenimento emocional. É, antes, o comparecimento do povo de Deus diante do seu Senhor, com temor e tremor, para adorá-lo em espírito e em verdade (Jo 4.23-24). A teologia reformada compreende o culto como uma resposta à iniciativa divina da redenção. É Deus quem chama, é Deus quem fala, é Deus quem edifica — e a nós cabe o papel de ouvintes obedientes e adoradores submissos.

“A Palavra preside o culto; a emoção responde, mas não dirige.”

O Princípio Regulador do Culto: Guardando a Pureza da Adoração

A Reforma Protestante do século XVI não foi apenas um movimento doutrinário, mas também uma revolução litúrgica. Um dos pilares dessa revolução foi o Princípio Regulador do Culto (PRC), que afirma que somente os elementos expressamente prescritos ou claramente inferidos nas Escrituras devem ser utilizados no culto público.

Esse princípio é diferente do Princípio Normativo do Culto, adotado pela Igreja Católica Romana e por algumas tradições protestantes, que permite tudo o que não é proibido pela Bíblia. O problema dessa abordagem é que ela abre espaço para inovações humanas, tradições inventadas, e práticas que, embora não condenadas diretamente, desviam o culto de sua finalidade bíblica e o tornam antropocêntrico.

O Princípio Regulador, por outro lado, reconhece que Deus é o único soberano sobre o culto. Como afirma a Confissão de Fé de Westminster (21.1):

“O modo aceitável de adorar o verdadeiro Deus é instituído por Ele mesmo e, de modo tão limitado por Sua própria vontade revelada, que não se deve adorar a Deus conforme as imaginações e invenções dos homens […], sob qualquer representação visível ou de qualquer outro modo não prescrito nas Escrituras.”

A aplicação prática desse princípio significa que os elementos do culto devem se restringir à leitura das Escrituras, pregação fiel da Palavra, oração, cânticos bíblicos, administração dos sacramentos, confissão de pecados e bênção. Tudo mais — encenações, coreografias, luzes, fumaça, “palhaços gospel”, apresentações dramatizadas — por mais bem-intencionado que pareça, não possui respaldo escriturístico e, portanto, não deve ocupar o espaço sagrado do culto.

“O Princípio Regulador protege o culto da corrupção humana e preserva a glória de Deus.”

A Deturpação do Culto: Da Igreja Romana ao Evangelicalismo Pós-moderno

Historicamente, um dos grandes desvios contra os quais os reformadores lutaram foi a deturpação do culto cristão promovida pela Igreja Católica Romana. Esta adicionou ao culto elementos como o latim litúrgico (incompreensível ao povo), os sacramentos como meios mecânicos de graça, a adoração aos santos, as imagens, as relíquias, as velas, os sinos, os incensos, e, sobretudo, a centralização da Eucaristia como sacrifício renovado — algo frontalmente contrário à suficiência do sacrifício de Cristo (Hb 10.10-14).

Ao se afastar da Escritura como única regra de fé e prática, o catolicismo fez do culto um espetáculo ritualista, carregado de misticismo e práticas extrabíblicas. Foi por isso que os reformadores clamaram por uma reforma no culto, restabelecendo a simplicidade, inteligibilidade e centralidade da Palavra.

Infelizmente, o que hoje se vê em muitos contextos evangélicos é um retrocesso para formas similares: liturgias cheias de apelos sensoriais, com destaque ao visível e ao emocional, empobrecendo a instrução doutrinária e substituindo a exposição bíblica por “pregações-show”. O perigo atual é ainda mais sutil, pois não se apresenta como heresia dogmática, mas como um apelo à “relevância cultural” e ao “acesso às novas gerações”.

“A forma do culto revela sua teologia. Se formos frívolos na liturgia, seremos fracos na doutrina.”

As Consequências de Mudar o Culto

Ao modificar a forma do culto para torná-lo mais atrativo, corremos sérios riscos:

  1. Descentralização de Deus – O culto passa a ser centrado nas emoções humanas e não na glória divina.
  2. Degradação doutrinária – O tempo de exposição bíblica é encurtado ou eliminado em favor de atividades “mais leves”.
  3. Infantilização espiritual – Crentes são alimentados com leite emocional, não com o alimento sólido da Palavra (Hb 5.12-14).
  4. Perda da reverência – A solenidade e o senso de santidade são substituídos por barulho e descontração.
  5. Sincretismo litúrgico – Elementos mundanos são inseridos no culto sob o pretexto de “alcance cultural”.

O culto que deveria formar o crente, transforma-se em algo que apenas o agrada. A igreja que deveria confrontar o mundo, começa a imitá-lo.

“Quem molda o culto para agradar o homem, deixará de edificar o povo e de glorificar a Deus.”

Perigos contemporâneos

Infelizmente, mesmo em igrejas evangélicas, há um retorno perigoso à criatividade humana no culto: shows, performances, coreografias, teatralizações, fumaça, luzes, líderes que mais se assemelham a apresentadores de TV do que ministros do evangelho. A música, em vez de ser veículo da verdade bíblica, torna-se entretenimento emocional. Há igrejas que justificam tais práticas com a frase: “Se for para atrair as pessoas, vale a pena” — um pensamento pragmático e antibíblico.

Devemos lembrar que o culto não é para agradar os homens, mas a Deus. O apóstolo Paulo escreveu: “Pois, busco eu agora o favor dos homens ou o de Deus? Ou procuro agradar aos homens? Se estivesse ainda agradando aos homens, não seria servo de Cristo” (Gálatas 1.10).

A música de fundo na pregação

Uma das práticas modernas que deve ser cuidadosamente rejeitada é o uso de música de fundo durante a exposição da Palavra de Deus. A pregação deve ser suficiente em si mesma para comunicar com clareza a verdade do evangelho. O apóstolo Paulo escreve em Romanos 10.17: “A fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Cristo” — e não pela ambientação musical. A música emocionalmente manipuladora pode distrair, distorcer ou diminuir o poder simples e direto da Palavra proclamada.

A Escritura é poderosa porque é inspirada por Deus (2 Timóteo 3.16). Ela não precisa de “ajuda” sensorial para convencer ou converter. Essa prática de fundo musical pode transformar o momento da pregação em uma apresentação teatral, e não em uma proclamação de fé consciente.

A Palavra de Deus não precisa de trilha sonora, precisa de exposição fiel.

A arquitetura voltada para o consumismo

Outro grave perigo está na transformação dos espaços de culto em ambientes voltados ao consumo, espelhando-se na estética de shoppings e centros de entretenimento. Palcos, praças de alimentação, cafés temáticos e decorações extravagantes têm substituído a simplicidade reverente que sempre caracterizou a verdadeira casa de oração.

Essa mudança reflete uma teologia antropocêntrica: a igreja é moldada para agradar ao visitante, não para glorificar a Deus. O templo deixa de ser o lugar da Palavra e da oração (Marcos 11.17) e torna-se um espaço de performance e consumo. As pessoas vêm para “experimentar sensações”, não para “oferecer culto racional” (Romanos 12.1).

Quando a igreja parece um shopping, o culto vira um produto e os adoradores, consumidores.

Um Clamor Pastoral por Reforma

Diante desse cenário, é urgente que as igrejas voltem à simplicidade e fidelidade do culto reformado. O culto deve ser regulado, não pelo gosto da congregação, mas pela voz do Pastor supremo da Igreja: Cristo. O púlpito deve ser o trono da Palavra, e o culto, um altar de entrega e adoração.

Como pastor, clamo por um retorno à reverência, à centralidade das Escrituras, à exposição fiel da Palavra, à doutrina sólida nos hinos e à participação consciente e bíblica dos crentes. Que o culto público seja, como Paulo exorta, “tudo feito com decência e ordem” (1Co 14.40), pois “Deus não é Deus de confusão, mas de paz” (1Co 14.33).

“Se queremos um avivamento verdadeiro, devemos começar reformando o culto.”

Conclusão

A forma como cultuamos revela quem cremos que Deus é. Se o culto for casual, frívolo e centrado no homem, o nosso conceito de Deus estará distorcido. Mas se o culto for reverente, bíblico e centrado em Cristo, mostraremos ao mundo que o nosso Deus é Santo, Justo e digno de toda adoração.

Voltemos ao altar. Saiamos do palco. Voltemos à Palavra. Saiamos das invenções. Voltemos ao Cristo glorificado. Saiamos da banalização. E então, nossos cultos serão, de fato, agradáveis ao Senhor e edificantes ao seu povo.

toto slot

slot gacor

A Confissão e o Catecismo apoiam o Arminianismo

O que deveria ocorrer se a Confissão Belga e o Catecismo de Heidelberg apoiassem não o Calvinismo supralapsariano, mas a teologia de Arminius? Ambas as obras sempre foram vistas como calvinistas, com a suposição de que a linguagem predestinatória inerente se opõe ao Arminianismo Reformado. Na verdade, até mesmo as declarações mais explícitas sobre a eleição para a salvação na Confissão e no Catecismo apoiam a doutrina de eleição de Arminius. Um sínodo nacional não foi convocado antes da morte de Arminius em 1609, então nunca saberemos o que poderia ter sido.

O que sabemos é que alguns calvinistas supralapsarianos (como Franciscus Gomarus) instigaram calúnias quanto aos ensinamentos de Arminius, a ponto de seu nome se tornar sinônimo de Socinianismo (negação da Trindade e divindade de Cristo), Catolicismo Romano (salvação orientada por obras), Semi-Pelagianismo (uma negação da Depravação Total e Incapacidade Total) — todos os quais não passavam de mentiras descaradas. Arminius certa vez exclamou:

Afirmo que esses bons homens [note que ele chamou seus oponentes teológicos de “esses bons homens”] nem compreendem nossos sentimentos, nem conhecem as frases que empregamos, nem, para conhecê-las, entendem o significado dessas frases. Em consequência disso, não é nenhuma surpresa que eles se afastem muito da verdade quando enunciam nossos sentimentos em suas palavras, ou quando afixam outras (isto é, suas próprias) significações às nossas palavras. 1

O estudioso de Arminius, Carl Bangs, escreve o seguinte.

__________

A Confissão Belga, Artigo 14, afirma que o homem “se submeteu voluntariamente ao pecado e, portanto, à morte e à maldição”. Arminius poderia apelar a isso em apoio à sua alegação de que o pecado não é necessário por um decreto divino, e ele o fez em 1608 [um ano antes de sua morte, outubro de 1609]. O mesmo artigo fala de falso ensino sobre o livre-arbítrio, “visto que o homem não é nada além de um escravo do pecado e não tem receptividade ou habilidade a menos que lhe seja dada do céu”. Arminius poderia concordar.

O artigo 16 trata da eleição. . . . Arminius não contradisse este artigo, mas seus escritos levantam uma questão de interpretação. Qual é o referente de “aqueles a quem ele . . . escolheu”? A resposta que Arminius deu é que eles são crentes. Se essa interpretação for concedida, ele não tem nenhuma disputa com a Confissão.

O Catecismo de Heidelberg fala ainda menos sobre predestinação, mas as questões 20 e 54 vão direto ao ponto:

20. P. Todos os homens serão salvos por meio de Cristo, assim como foram perdidos por meio de Adão?

R. Não, somente todos aqueles que por uma fé correta são incorporados a ele e aceitam todos os seus benefícios.

54. P. O que acreditamos sobre a Igreja Cristã universal?

A. Que o Filho de Deus reuniu, protegeu e preservou para si, desde o princípio do mundo até o fim, de toda a família humana, por meio de seu Espírito e Palavra, uma comunidade escolhida para a vida eterna, na unidade da verdadeira fé, e que, portanto, eu sou e permanecerei eternamente um membro vivo dela.

A questão 20 parece ser bem acomodada à tese de Arminius de que a salvação é desejada para a classe de crentes. A questão 54 permite a interpretação e não faz nenhuma especificação do modo de eleição. A questão sobre a teologia de Arminius e as duas fórmulas pode muito bem tomar outro rumo: não, As declarações poderiam ser esticadas para acomodar as visões de Arminius? mas, Elas poderiam ser esticadas para acomodar as visões de seus oponentes?

Foi, de fato, essa segunda questão que perturbou os defensores da teologia holandesa mais antiga e branda. As confissões não deveriam ser revisadas para remover as ambiguidades sob as quais os supralapsarianos se abrigavam? Em defesa dessa posição, pode-se dizer novamente que as fórmulas foram escritas antes que a questão do supralapsarianismo tivesse sido levantada [sendo uma teoria tão nova e não fundamentada pela história da Igreja], assim como o próprio Calvino não dá uma resposta clara sobre se ele é um supra ou [infralapsariano].

Concluo que Arminius se sentia essencialmente de acordo com a Confissão e o Catecismo, que não os atacou, mas que, no entanto, não estava totalmente satisfeito com eles devido à sua ambiguidade. 2

__________

1 James Arminius, “Artigo XVI.”, em The Works of Arminius , três volumes, trad. James e William Nichols (Grand Rapids: Baker Book House, 1996), 2:17.

2 Carl O. Bangs, Arminius: Um estudo sobre a Reforma Holandesa (Eugene: Wipf & Stock Publishers, 1991), 223-24.

slot gacor hari ini

toto slot

slot gacor

Livros que todo arminiano precisa ler

  1. Teologia Arminiana: Mitos e Realidades,  de Roger Olson. Este é um exemplo de boa escrita e boa teologia. Olson aborda a história do arminianismo e também mostra os muitos erros que calvinistas e outros não arminianos cometem sobre o arminianismo. Este é um dos meus livros favoritos de todos os tempos em teologia.
  2. Graça, Fé, Livre-Arbítrio,  de Robert Picirilli. Eu classificaria este livro ao lado do de Olson. É um caso de boa escrita e doutrina sã. O Dr. Picirilli é um batista do Livre-Arbítrio que aborda o Calvinismo ponto por ponto nesta obra, definindo o que é o Arminianismo Reformado e sua base bíblica.
  3. Arminius: Um Estudo sobre a Reforma Holandesa,  de Carl Bangs. Esta é a única obra que conheço sobre a vida de Jacobus Arminius. Bangs mostra a vida de Arminius e como este homem passou de um simples teólogo calvinista a se tornar o líder do movimento de protesto contra o calvinismo. Bangs é um bom escritor e se aprofunda na curta vida de Arminius, que impactou muitos.
  4. Segurança Eterna Incondicional: Mito ou Verdade?,  de French Arrington. O Dr. Arrington, do Seminário Teológico da Igreja de Deus, escreveu este livro após inúmeras perguntas de fiéis sobre o ensinamento de “uma vez salvo, salvo para sempre”. O livro é uma mistura de escrita devocional e teologia. Embora não seja tão técnico quanto eu esperaria de um professor de seminário, o livro é bom e eu o recomendo aos arminianos.
  5. O Que a Bíblia Diz sobre Deus, o Governante,  por Jack Cottrell. Este livro é um dos melhores livros sobre a doutrina de Deus, sob uma perspectiva arminiana. O Dr. Cottrell aborda quase todas as questões que envolvem o governo de Deus sobre Sua criação. Para mim, este é o melhor livro de teologia arminiana que já li.
  6. A Estratégia de Deus na História Humana,  de Roger Forster. Esta é a resposta arminiana aos livros calvinistas sobre a soberania de Deus, escritos por teólogos como RC Sproul e AW Pink. Embora o livro se incline para a “teologia aberta”, ele faz um bom trabalho ao mostrar como Deus tem sido soberano na história humana, ao mesmo tempo em que permite o livre-arbítrio.
  7. Escolhido, mas Livre,  por Norman Geisler. O livro de Geisler não é totalmente arminiano, mas os arminianos poderiam concordar com muito do que ele escreve aqui. Geisler afirma que está escrevendo este livro a partir de uma posição “calvinista moderada”, mas se você examinar sua posição, é mais provável que ele seja um “arminiano moderado” (Geisler acredita na segurança eterna). Esta segunda edição contrapõe-se ao teólogo calvinista James White e seu livro, ”  A Liberdade do Oleiro”  , com um apêndice sobre White.
  8. A Morte de Cristo,  de Robert Lightner. Este livro é um livro com o qual um arminiano concordaria em cerca de 95% do que escreve sobre a doutrina da expiação. Lightner defende uma expiação ilimitada e o faz examinando diretamente a Palavra de Deus. Ele aborda os argumentos que os calvinistas defendem para uma expiação limitada e apresenta uma forte defesa da doutrina da expiação ilimitada.
  9. Por Que Não Sou Calvinista,  de Jerry Walls e Joseph Dongell. Outro livro clássico sobre o Arminianismo e as diferenças entre Arminianismo e Calvinismo. Gostei deste livro e, embora gostaria de mais exegese do que o livro oferece, recomendo-o a quem estuda o Calvinismo sob uma perspectiva arminiana.
  10. Eleição e Predestinação,  de Samuel Fisk. Este livro está começando a ficar um pouco obsoleto, mas os argumentos são bons. Neste livro, Fisk examina as principais passagens das Escrituras sobre eleição e predestinação e oferece insights de vários comentários. Embora as fontes sejam datadas, os argumentos ainda são válidos, pois Fisk defende uma natureza condicional à eleição (fé e arrependimento).

slot resmi

slot gacor hari ini

situs slot gacor

link gacor hari ini

situs gacor

slot gacor hari ini

toto slot

slot gacor

Será que você é arminiano e nem percebe?

Ao longo da história, o arminianismo muitas vezes foi mal compreendido e até difamado por correntes calvinistas. O resultado disso é que muitos cristãos que seguem a linha arminiana nem sabem que a seguem, e, em alguns casos, até negam. Curiosamente, o arminianismo é tão difundido que até igrejas calvinistas podem estar cheias de pessoas com crenças arminianas. É paradoxal, mas a realidade é essa: muitos têm medo de se identificar como arminianos, mesmo que a maior parte do protestantismo evangélico compartilhe de suas premissas.

O objetivo desta reflexão é ajudar você a perceber se sua fé se aproxima do arminianismo e mostrar que não há nenhum problema em assumir essa posição teológica.

1. Você acredita que Jesus morreu por todos os seres humanos?

Se a sua resposta foi “sim”, você já concorda com um princípio central do arminianismo. A maioria dos calvinistas defende que Cristo morreu apenas por alguns eleitos, enquanto os arminianos entendem que a morte de Jesus foi suficiente para todos. Este é um ponto crucial que separa as duas tradições.

2. Você acredita que o ser humano é incapaz de buscar a Deus por si mesmo e precisa da graça para crer?

Se respondeu “sim”, você segue a linha de Armínio. Tanto arminianos quanto calvinistas reconhecem a necessidade da graça, mas o arminianismo sustenta que, mesmo capacitado pela graça, o ser humano pode escolher aceitar ou resistir.

3. Você acredita que uma pessoa pode resistir ao chamado convincente da graça de Deus?

Se sim, você compartilha outra crença central arminiana. Deus deseja que todos creiam, mas Ele respeita nossa liberdade de escolha. Como Jesus disse sobre Jerusalém: “Quantas vezes eu quis reunir os teus filhos, mas vocês não quiseram” (Mt 23:37).

4. Você acredita que a pessoa nasce de novo quando deposita sua fé em Cristo?

Se sua resposta for positiva, você sustenta um princípio arminiano. Para o arminianismo, a nova vida vem pela união com Cristo pela fé, não antes. João 3:16 é claro: “Todo aquele que nele crê não perecerá, mas terá a vida eterna”.

5. Você acredita na eleição?

Se respondeu “sim”, você pode ser arminiano. A diferença é que a eleição não acontece independentemente da fé, mas “em Cristo”: quem está unido a Ele é considerado eleito.

6. Você acredita na predestinação?

Os arminianos afirmam que os crentes são predestinados à salvação final, mas não que qualquer pessoa seja predestinada a crer.

7. Você acredita na segurança eterna?

A questão é delicada: a fé genuína garante a salvação final ou é possível perder a salvação? Arminianos geralmente entendem que perseverar na fé é necessário; alguns reconhecem a possibilidade de apostasia, enquanto calvinistas defendem a segurança incondicional.

8. Você acredita na expiação penal da morte de Cristo?

A maioria dos arminianos e calvinistas sustenta que Jesus sofreu em nosso lugar para satisfazer a justiça de Deus. Armínio mesmo afirmava esta perspectiva.

9. Você acredita que Deus conhece perfeitamente o futuro?

Sim? Então você concorda com arminianos e calvinistas: Deus tem conhecimento exaustivo de tudo que acontecerá, incluindo nossas escolhas livres.

10. Você acredita na soberania de Deus?

Sim? Ótimo! Arminianos e calvinistas concordam na soberania divina, mas a diferença está em como essa soberania convive com a liberdade humana. Arminianos defendem que Deus é soberano e, ao mesmo tempo, nos concede liberdade genuína.

Em resumo:

Se você se identifica com a ideia de que Cristo morreu por todos, que a graça é resistível, que a fé nos une a Cristo e garante a nova vida, que a eleição depende da fé, que a predestinação é relativa aos crentes, que a perseverança na fé é necessária, que a expiação penal é válida, que Deus conhece perfeitamente o futuro e que Ele é soberano mas respeita nossa liberdade, então você é, sim, arminiano.

E sabe de uma coisa? Isso não é motivo de vergonha. O arminianismo é uma tradição teológica sólida, amparada na Escritura, e é a posição teológica predominante entre os cristãos evangélicos. Ser arminiano é simplesmente assumir a liberdade e a responsabilidade que Deus nos dá, confiando em Sua graça que é suficiente para todos.

slot resmi

slot gacor hari ini

situs slot gacor

link gacor hari ini

situs gacor

slot gacor hari ini

toto slot

slot gacor

Corpo, Alma e/ou Espírito

A compreensão da natureza humana é central na teologia cristã. Estudar o homem implica examinar sua constituição física e espiritual, explorando corpo, alma e/ou espírito. A Escritura apresenta uma perspectiva clara sobre essa composição, distinguindo-se das abordagens filosóficas e científicas que surgiram ao longo da história. Compreender essa doutrina é essencial para interpretar corretamente a Bíblia, pois fundamenta conceitos cruciais como pecado, graça e redenção.


1. Antropologia Teológica: Corpo e Alma/Espírito

A antropologia teológica foca na natureza do homem à luz das Escrituras, destacando sua relação com Deus. Diferente da antropologia geral, não se limita à fisiologia ou cultura, mas à dimensão espiritual e moral do ser humano.

Gênesis 2:7 revela que Deus formou o homem do pó da terra e insuflou nele o fôlego de vida, tornando-o uma “alma vivente” (nephesh hayyah). Essa passagem enfatiza a unidade orgânica do homem, mostrando que corpo e alma não são partes isoladas, mas aspectos integrados de um ser criado por Deus. Desde a criação, o homem existe como um todo: físico e espiritual simultaneamente.


2. Dicotomia e Tricotomia: Debates Históricos

Historicamente, duas concepções buscaram explicar a constituição humana:

  1. Dicotomia – O homem é composto de corpo e alma/espírito, sendo a alma e o espírito uma única realidade imaterial. Essa perspectiva se consolidou na tradição reformada, especialmente com Agostinho e a Reforma Protestante, pois enfatiza a unidade do ser humano e a obra completa da redenção.

    • Base bíblica: Gênesis 2:7; Tiago 2:26; Mateus 10:28.

    • Alma e espírito são frequentemente usados como sinônimos (nephesh/ruah; psyque/pneuma).

  2. Tricotomia – Defende que o homem possui corpo, alma e espírito como três dimensões distintas. A tricotomia teve raízes na filosofia grega, influenciando alguns pais da Igreja como Orígenes e Clemente de Alexandria.

    • Corpo: dimensão física.

    • Alma: emoções, mente, vontade.

    • Espírito: capacidade de comunhão com Deus.

    • Uso de passagens como 1 Tessalonicenses 5:23 e Hebreus 4:12 fundamenta essa posição.

No entanto, uma análise cuidadosa revela que tais textos não indicam separação substantiva, mas enfatizam a totalidade do homem. Por exemplo:

  • 1 Ts 5:23 utiliza “espírito, alma e corpo” como recurso retórico para expressar santificação completa, não tripartição.

  • Hb 4:12 descreve a Palavra de Deus penetrando nas profundezas do ser, sem sugerir divisões ontológicas.

A tricotomia, portanto, possui base histórica e filosófica, mas não encontra respaldo sólido na Bíblia. A dicotomia permanece como a visão mais coerente e bíblica da natureza humana.


3. Unidade Orgânica do Homem

A dicotomia bíblica entende o homem como um ser integral, corpo e alma/espírito agindo de forma unificada. Cada decisão, emoção ou ação envolve a pessoa inteira. A redenção em Cristo, portanto, não é fragmentária, mas abrange o ser humano completo.

Teorias sobre Corpo e Alma

  • Monismo: corpo e alma como manifestações de uma mesma substância.

  • Dualismo realista: corpo e alma distintos, mas interagindo organicamente.

  • Ocasionalismo e paralelismo: ações correspondentes permitidas por harmonia divina, sem interação direta.

A Escritura apoia a ideia de unidade orgânica, onde a alma utiliza o corpo como instrumento e o corpo responde às decisões da alma. O ser humano é, assim, completo, consciente e responsável por suas ações.


4. A Origem da Alma: Criacionismo, Traducianismo e Preexistencialismo

O debate sobre a origem da alma possui três principais correntes:

  1. Criacionismo – Deus cria uma alma nova para cada pessoa. Essa visão harmoniza-se com a Escritura e preserva a pureza da alma.

  2. Traducianismo – A alma se transmite junto com o corpo pelos pais, enfrentando desafios filosóficos e cristológicos.

  3. Preexistencialismo – As almas existiriam antes do corpo, mas carece de suporte bíblico consistente.

O criacionismo é preferido dentro da tradição reformada por sua clareza bíblica, coerência ética e compatibilidade com a doutrina da redenção.


5. Implicações Teológicas

Entender a natureza humana é crucial para a teologia:

  • Pecado: a queda afetou corpo e alma/espírito.

  • Graça e redenção: Cristo redime o homem integral.

  • Encarnação de Cristo: afirma a plena humanidade e divindade do Salvador.

Essa compreensão fortalece a fé e a prática cristã, promovendo uma vida espiritual equilibrada e integral.


6. Conclusão

A Bíblia apresenta o homem como uma unidade composta de corpo e alma/espírito, criada diretamente por Deus. A dicotomia oferece a interpretação mais fiel às Escrituras, enquanto a tricotomia, apesar de histórica, permanece filosófica e retórica. Reconhecer a natureza integral do ser humano nos ajuda a entender pecado, santificação e redenção, e nos conduz a uma vida espiritual completa e consciente diante de Deus.

Soli Deo gloria
Franco Júnior

slot resmi

slot gacor hari ini

situs slot gacor

link gacor hari ini

situs gacor

slot gacor hari ini

toto slot

slot gacor

Fé para além das paredes da igreja

1. Introdução

Muitos ainda pensam que a fé é um assunto privado, algo que se encerra no coração ou nas quatro paredes da igreja. Mas a Bíblia nos desafia a olhar para a fé de maneira muito mais ampla. O evangelho nos revela que Cristo não é apenas o Senhor das nossas orações ou dos cultos dominicais, Ele é Senhor sobre toda a criação — sobre nossas famílias, nossas profissões, nossas cidades, nossas universidades e até mesmo nossas decisões políticas. A fé não é uma gaveta da vida, mas a lente através da qual enxergamos tudo.

2. A soberania de Cristo

A Palavra de Deus declara com clareza:

“Pois nele foram criadas todas as coisas, nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis… tudo foi criado por meio dele e para ele” (Cl 1:16).

Não há espaço neutro. Cada aspecto da vida, do mais íntimo ao mais público, está sob o Senhorio de Jesus. Reconhecer a soberania de Cristo significa compreender que não existe esfera da vida humana que escape à Sua autoridade — nem a ciência, nem a política, nem a cultura, nem as artes. Essa perspectiva é fundamental para o cristão reformado, pois nos lembra que a vida inteira deve ser vivida sob a direção de Deus.

3. Graça e testemunho cristão

Mesmo em um mundo marcado pelo pecado, Deus concede a chamada graça preveniente, permitindo avanços, descobertas e manifestações de beleza que apontam para Ele. Cada talento, cada oportunidade, cada insight é um lembrete da bondade de Deus. Mas não basta apenas usufruir desses dons — o cristão é chamado a viver como testemunha, lembrando que “todo dom perfeito vem do Pai” (Tg 1:17). Ser testemunha é viver a fé em ação, mostrando aos outros que há uma Fonte superior guiando cada aspecto da vida.

4. Sal e luz em todas as esferas

Quando Jesus nos chama de “sal da terra” e “luz do mundo” (Mt 5:13-14), Ele nos convida a uma fé que se manifesta de maneira prática e visível. Ser sal é preservar e dar sabor; ser luz é iluminar e guiar. A fé não deve ficar escondida nos momentos de culto ou nas reuniões da igreja. Ela precisa penetrar cada esfera da vida: na família, no trabalho, na universidade, na política, nas artes e na cultura. Ser cristão não é se retirar do mundo, mas viver nele de maneira que todos percebam que Cristo reina.

5. O equilíbrio necessário

O evangelho nos protege de dois extremos perigosos:

  1. O secularismo, que tenta expulsar Deus da vida pública e separar a fé do dia a dia.

  2. O religiosismo, que tenta impor a igreja como detentora de todas as decisões e áreas da vida.

A visão bíblica é equilibrada: cada esfera tem sua função e autonomia, mas todas devem reconhecer Cristo como Senhor. Essa visão não é apenas prática; ela é profundamente teológica, pois reflete a compreensão reformada da ordem criada por Deus, onde Sua glória deve permear todos os aspectos da existência humana.

6. Conclusão

A fé não é apenas um abrigo espiritual, mas uma lente para enxergar e transformar o mundo. Viver para Cristo significa honrá-lo no lar, na empresa, na escola, na política, na cultura e até mesmo nas pequenas decisões do cotidiano. A vida cristã não termina no “amém” do domingo; ela se estende em cada detalhe da segunda-feira, lembrando que cada ação pode glorificar a Deus.

“Quer comais, quer bebais, ou façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus” (1Co 10:31).

Soli Deo gloria

slot resmi

slot gacor hari ini

situs slot gacor

link gacor hari ini

situs gacor

slot gacor hari ini

toto slot

slot gacor

O que é uma Igreja Avivada?

Quando ouvimos a palavra avivamento, quase sempre a associamos a manifestações extraordinárias: línguas estranhas, profecias, curas e dons espirituais. Mas a Bíblia nos ensina algo profundo e, muitas vezes, esquecido: uma igreja avivada não é necessariamente aquela que demonstra mais dons, mas sim aquela que vive mais próxima de Cristo em santidade, fidelidade e perseverança.

A igreja de Corinto é o exemplo claro disso. Ali havia abundância de dons espirituais, manifestações de poder e experiências marcantes. Porém, ao mesmo tempo, era uma comunidade mergulhada em carnalidade, divisões, escândalos e pecados (1Co 3:1-3). O problema não era a ausência do Espírito, mas a falta de maturidade espiritual. Isso nos mostra que dons não são sinônimo de avivamento. O verdadeiro sinal de uma igreja cheia do Espírito é quando Cristo é formado no caráter de seus membros.

No Apocalipse, vemos um contraste poderoso. Das sete igrejas às quais Jesus se dirige, apenas duas não recebem nenhuma repreensão: Esmirna e Filadélfia (Ap 2:8-11; 3:7-13).

  • Esmirna foi elogiada por sua coragem e fé em meio à perseguição. Mesmo diante da ameaça de prisão e morte, eles permaneceram firmes no Senhor.

  • Filadélfia, por sua vez, foi elogiada por sua perseverança, obediência e fidelidade ao nome de Cristo, mesmo tendo pouca força.

Perceba algo precioso: nenhuma dessas igrejas é lembrada por seus dons, mas sim pela sua fidelidade. O verdadeiro avivamento é quando a igreja, mesmo em fraqueza, se agarra ao nome de Jesus com amor, coragem e santidade.

O profeta Joel nos lembra que o avivamento é obra do próprio Deus. “E acontecerá, depois, que derramarei o meu Espírito sobre toda a carne…” (Jl 2:28). Não marcamos o avivamento em nossa agenda, não o manipulamos com estratégias humanas. Ele vem do alto, como chuva serôdia, no tempo e no modo de Deus (Jl 2:23). O que nos cabe é clamar com coração quebrantado, buscar ao Senhor com jejum, choro e arrependimento (Jl 2:12-13).

Assim, uma igreja verdadeiramente avivada não é aquela que impressiona com dons, mas aquela que:

  • Ama a Cristo acima de tudo.

  • Permanece fiel em meio à perseguição.

  • Vive em santidade e obediência à Palavra.

  • Testemunha com coragem o Evangelho.

Avivamento não é barulho, mas profundidade. Não é espetáculo, mas transformação. Não é agitação, mas perseverança.

Que o Senhor levante em nossos dias igrejas como Esmirna e Filadélfia: firmes, perseverantes e cheias da presença de Cristo. Porque, no fim das contas, o verdadeiro avivamento não é o que fazemos, mas o que Deus opera em nós.


📖 “Aviva, ó Senhor, a tua obra no decorrer dos anos…” (Hc 3:2)

slot resmi

slot gacor hari ini

situs slot gacor

link gacor hari ini

situs gacor

slot gacor hari ini

O Quadrilátero de Wesley

“Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que desde a infância sabes as sagradas letras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus” (2 Tm 3:14,15).

Desde a Reforma Protestante, nós, evangélicos, reafirmamos a primazia das Escrituras na vida da Igreja. O sermão substituiu a missa como o ponto alto do culto, e uma Bíblia aberta passou a ocupar o lugar central, em vez do altar fechado. Esta vitória histórica nos recorda que a Palavra de Deus deve ser a fonte e o critério de toda a nossa fé. No entanto, é inegável que a teologia — chamada com propriedade de “ciência-mãe” — vem sendo relegada ao segundo plano em diversos segmentos evangélicos. Não são poucas as denominações que já não exigem preparo teológico para a ordenação pastoral, como se a vida cristã pudesse se sustentar apenas pela prática, sem reflexão.

O Dr. Vinicius Couto, ao refletir sobre a importância da teologia, usa uma imagem muito sugestiva: alguns enxergam a teologia como um esqueleto — estrutura rígida, mas sem vida. Outros vivem sua espiritualidade como uma água-viva — cheia de movimento, mas sem sustentação. A resposta não está em escolher entre estrutura ou vitalidade, mas em unir ambas: vida com forma, fogo com fundamento, experiência com verdade. Afinal, uma espiritualidade sem estrutura é tão perigosa quanto uma estrutura sem vida.

O Quadrilátero de Wesley

Por muito tempo, John Wesley foi lembrado apenas como um grande pregador avivalista. No entanto, pesquisas mais recentes têm redescoberto seu valor como teólogo. Uma de suas grandes contribuições foi sistematizar quatro elementos fundamentais para a formulação da fé cristã, conhecidos como o Quadrilátero de Wesley: as Escrituras, a razão, a tradição e a experiência.

Importante frisar: para Wesley, a Escritura sempre foi a primeira e a última palavra. As demais fontes — razão, tradição e experiência — tinham papel auxiliar, jamais concorrente.

1. As Escrituras

Wesley defendia que toda doutrina deve nascer, ser provada e finalmente confirmada pela Bíblia. A Palavra de Deus é, portanto, o ponto de partida e de chegada. Vivemos hoje em uma geração que prefere “várias verdades”, como se a Escritura fosse um livro de múltiplas interpretações válidas. Mas o próprio Cristo nos lembra: “Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade” (Jo 17:17). Não há “minha verdade” ou “sua verdade”: há a Verdade, revelada em Cristo e nas Escrituras.

2. A razão

A razão não é inimiga da fé, mas instrumento dado por Deus para organizar aquilo que o Espírito nos revela. Paulo nos lembra que o Espírito testifica com o nosso espírito (Rm 8:16), e esse testemunho passa pelo crivo da mente. Wesley rejeitava tanto o misticismo sem base quanto o racionalismo frio. A razão, iluminada pela Palavra, impede que caiamos em exageros, como quando tudo é espiritualizado — desde tropeços na calçada até males hereditários.

3. A tradição

Em um tempo em que muitos associam “tradição” a algo ultrapassado, Wesley nos recorda que ela é um recurso precioso. Não falamos de tradições humanas inventadas, mas da herança da fé da Igreja ao longo dos séculos. Para ele, nenhuma doutrina é correta se não estiver em sintonia com a fé da Igreja Primitiva. Não é à toa que Paulo alertou Timóteo sobre aqueles que, movidos por coceira nos ouvidos, buscariam mestres que apenas confirmassem seus desejos (2 Tm 4:3). Hoje, movimentos que se dizem “resgates apostólicos” ou modelos como o G-12 distorcem esse princípio. Tradição não é inventar novidades, mas permanecer no que a Igreja sempre confessou.

4. A experiência

Por fim, Wesley lembrava que a fé cristã não é apenas racional ou histórica, mas também existencial. O Espírito Santo aplica ao coração a verdade da Palavra. Quando fomos justificados, Ele testificou que nossos pecados estavam perdoados; quando fomos santificados, Ele confirmou que fomos lavados. Contudo, Wesley sempre alertava: nenhuma experiência pessoal pode contradizer a Bíblia. O subjetivo só é válido se estiver em harmonia com o objetivo, que é a Palavra.


Conclusão

Razão, tradição e experiência são dons que enriquecem nossa caminhada. Mas somente as Escrituras são suficientes, inerrantes e infalíveis para fundamentar a fé. O desafio que temos hoje, como igreja do Senhor, não é apenas colocar a Bíblia no início e no fim, como Wesley ensinava, mas no início, no meio e no fim de toda a nossa vida cristã.

Assim, a Palavra não será apenas o livro da nossa estante, mas a lâmpada para os nossos pés e luz para o nosso caminho (Sl 119:105).

O que torna um cristão reformado?

A palavra “reformado” é usada de muitas maneiras, e nem sempre corretamente. Historicamente, ela se refere a uma tradição dentro do cristianismo que surgiu da Reforma do século XVI, um movimento que buscava corrigir desvios na igreja e afirmar a centralidade do Evangelho. Mas o que realmente faz alguém ser um cristão reformado?

O problema com os rótulos

Rótulos podem ser perigosos se usados para intimidar ou excluir outros cristãos. Por exemplo, algumas pessoas dizem: “Você não é realmente reformado se não acredita na expiação limitada”. Outros usam para se sentir superiores: “Nós, reformados, entendemos a graça de Deus corretamente, ao contrário dos arminianos”.

No entanto, os rótulos também têm valor. Eles nos ajudam a entender diferenças e semelhanças dentro da fé cristã, assim como identificar tipos diferentes de árvores nos ajuda a cuidar delas. O rótulo “reformado” ajuda a reconhecer características de uma tradição que valoriza a fidelidade às Escrituras e ao Evangelho.

Por que “calvinista” não é sinônimo de “reformado”

Muita gente confunde os termos “calvinista” e “reformado”, mas eles não são a mesma coisa. Calvino foi um gigante da Reforma, mas nenhum reformado do século XVI ou XVII o via como a única referência da tradição. Outros reformadores importantes incluem Ulrico Zuínglio, Martin Bucer, Heinrich Bullinger e Pedro Mártir Vermigli. Cada um contribuiu para a formação da tradição reformada, e nenhum deles pretendia que seus escritos fossem definitivos para todos os reformados.

Portanto, associar reformados apenas a Calvino é simplista, pois a tradição reformada é mais ampla e plural, incluindo diversidade teológica e pastoral, mesmo entre aqueles que seguem as mesmas confissões históricas.

O mito da TULIP

Muitos dizem que os cinco pontos do Calvinismo (TULIP) definem o reformado:

  1. Depravação total

  2. Eleição incondicional

  3. Expiação limitada

  4. Graça irresistível

  5. Perseverança final

Mas isso não é suficiente. O Sínodo de Dort (1618-1619), que originou os cinco pontos, resolveu uma controvérsia específica sobre a Remonstrância arminiana, sem definir toda a tradição reformada. Além disso, a sigla TULIP foi criada séculos depois, simplificando demais as nuances de Dort, como no caso da expiação limitada, que na tradição reformada é vista tanto como suficiente para todos quanto eficaz somente para os eleitos. Simplificar demais gera distorção.

Reformado não é apenas predestinação

Ser reformado significa estar dentro da tradição protestante surgida na Reforma. Essa tradição se distingue da tradição católica histórica (explicada no Credo Niceno) e sustenta os quatro “somente”:

  • Somente a Escritura – a Bíblia é autoridade suprema, não a única.

  • Somente a graça – a salvação é dom de Deus, não resultado de méritos humanos.

  • Somente Cristo – Cristo é suficiente para a salvação.

  • Somente a fé – a confiança em Cristo é o meio pelo qual recebemos a salvação.

Dentro do protestantismo, surgiram duas grandes tradições: luterana e reformada. Originalmente, a diferença principal não era a predestinação, mas a Ceia do Senhor. Os luteranos defendiam a presença real de Cristo no pão e no vinho; os reformados, liderados por Calvino e Zuínglio, viam a Ceia de forma simbólica ou espiritual.

Confissões: o verdadeiro critério

Ao contrário do que muitos pensam, o que define um reformado não são apenas as ideias de predestinação ou os cinco pontos do Calvinismo. O que realmente importa são as confissões históricas reformadas, como:

  • Confissão Belga (1561)

  • Catecismo de Heidelberg (1563)

  • Segunda Confissão Helvética (1566)

  • Confissão de Fé de Westminster (1647)

  • Declaração de Savoy (1658)

  • Confissão Batista de Londres (1689)

Um cristão é reformado se puder afirmar uma ou mais dessas confissões, reconhecendo a fidelidade às Escrituras, à doutrina de Cristo e à estrutura bíblica da igreja.

Os pentecostais são reformados?

Em geral, os pentecostais não são considerados parte da tradição reformada. Eles surgiram a partir do movimento pentecostal do início do século XX, com ênfase nos dons do Espírito Santo, batismo no Espírito e manifestações espirituais contemporâneas. Apesar de valorizarem a fé em Cristo e a autoridade das Escrituras, não se enquadram nas confissões históricas reformadas, nem compartilham a mesma estrutura teológica e eclesiástica.

Dito de forma simples: todo reformado é protestante, mas nem todo protestante é reformado; e os pentecostais pertencem a outra tradição dentro do protestantismo.

Jacó Armínio dentro da tradição reformada

Outro ponto importante: Jacó Armínio, muitas vezes associado ao arminianismo, também nasceu dentro do contexto reformado. Ele foi:

  • Signatário da Confissão Belga (1561)

  • Signatário do Catecismo de Heidelberg (1563)

  • Reitor do Seminário Reformado de Leiden

Ou seja, Armínio atuou plenamente dentro da tradição reformada, reconhecia as confissões e exercia liderança teológica. Sua divergência histórica em relação à eleição incondicional e à extensão da expiação não o exclui do contexto reformado, mas mostra que havia diversidade de pensamento mesmo dentro da tradição.

Observações importantes

  1. Origem comum, caminhos diferentes: Armínio nasceu dentro do contexto reformado, mas seus pontos sobre eleição e graça o colocam fora da tradição reformada histórica.

  2. Pentecostais não são reformados: Surgiram no início do século XX e possuem foco em dons espirituais, experiências carismáticas e práticas não reguladas pelas confissões históricas.

  3. Pontos em comum: Reformados, arminianos clássicos e pentecostais são todos protestantes, compartilham a fé em Cristo e a autoridade da Bíblia, mas divergem em como entendem a salvação e a igreja.

Conclusão

Ser reformado significa:

  • Estar na tradição protestante histórica da Reforma

  • Aderir à autoridade suprema das Escrituras

  • Reconhecer e viver de acordo com uma ou mais confissões reformadas históricas

Enquanto isso, arminianos clássicos e pentecostais podem compartilhar algumas doutrinas protestantes, mas não se enquadram como reformados históricos, embora alguns (como Armínio) tenham feito parte do contexto reformado e contribuído para seu desenvolvimento.