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Um cristão marxista faz tanto sentido quanto uma luz escura em um quadrado redondo. É mais que um paradoxo, é um absurdo. No entanto, em nossa era relativista, onde se busca conciliar o inconciliável, minha afirmação é que parece absurda. Mas não é. É a pura verdade.

Os que se espantam com essa afirmação provavelmente desconhecem não apenas a história do marxismo. Ignoram completamente seus próprios fundamentos, sua real natureza. Se os conhecessem com certeza saberiam que cristianismo e marxismo são tão incompatíveis quanto a luz e as trevas.

Um tempo atrás a incompatibilidade entre ambos era óbvia e este artigo seria desnecessário. Muitos ficariam chocados ao ver cristãos verdadeiros debruçados sobre textos de pensadores marxistas e tentando absorvê-los. Depois da queda do Muro de Berlim alguns acreditam que o marxismo se tornou inofensivo, como se o veneno não fosse mais mortífero somente porque um frasco se quebrou.

Qualquer teologia ou prática cristã que considere positivamente o marxismo devem ser totalmente desconsideradas. Pode-se fazer um paralelo com a crítica de Emil Brunner à Rudolf Bultmann, ambos teólogos alemães:

Heidegger é ateu confesso; ele não admite nenhuma revelação – não entende nenhuma, não necessita de nenhuma e não deixa margem para a existência de nenhuma. Ele [Heidegger] acha risível que Bultman esteja a ‘fazer teologia da minha filosofia’.
Da mesma forma é irônico um cristão aprovar ou justificar o marxismo, que dirá tentar fazer teologia com ele. Como Heidegger, Marx e Engels achariam essa atitude digna de riso. Ame seus inimigos, mas não os confunda com os amigos.
O próprio Emil Brunner, mesmo não sendo um teólogo conservador, conseguia enxergar a real natureza do marxismo e sua incompatibilidade com o cristianismo.

O comunismo demonstra ser ainda o mais tremendo opositor ideológico do cristianismo. O conceito de verdade não desempenha nenhum papel na ideologia comunista, e um poder totalitário qualquer poderá promover a liquidação da teologia.
Na verdade, os marxistas conscientes bem sabem da impossibilidade de conciliação com o cristianismo. Todavia, na busca pelo poder absoluto é preciso fazer concessões até o momento do bote. Uma vez no poder já não será mais necessário cortesias e contenções. A verdadeira natureza se revelará. Como na história do escorpião que atravessou o rio nas costas do sapo prometendo não feri-lo. O picou assim que chegaram do outro lado. Diante da contestação do sapo pela promessa feita, o escorpião disse que não podia evitar. Fazia parte de sua natureza. Quem conhece a natureza da ideologia marxista sabe muito bem que nenhuma promessa amistosa evitará a manifestação de sua natureza real que é plenamente anticristã.
Pensemos na afirmação de Hitler com relação à Igreja:

O fascismo pode, se quiser, concluir sua paz com a Igreja. Também eu o faria. E por que não? Isto não me impedirá de extirpar o cristianismo da Alemanha.

Nunca foi diferente com o comunismo. Falsas alianças com o cristianismo precederam a perseguição. Faz parte de sua natureza.

Como eu disse, há algumas décadas esse artigo seria totalmente desnecessário. Quem leu Torturado por amor a Cristo, do pastor romeno Richard Wurbrandt ou O contrabandista de Deus, do irmão André, sabia o que era o comunismo. Contra toda esperança, do cubano Armando Valadares, livro que denunciava a tirania do governo Castro deixou de circular, enquanto o mesmo governo, com todo seu totalitarismo marxista continua de pé. Naqueles tempos, o mais simples cristão sabia que o marxismo-socialismo-comunismo era do mal e completo inimigo do cristianismo. Isso foi em outras épocas. Agora tudo mudou. Hoje este artigo tornou-se urgente. Os marxistas já estão quase terminando de atravessar o rio nas costas dos cristãos e muito em breve o bote certeiro virá.

Aqueles que procuram aceitar o marxismo alegando que ele contém “elementos cristãos” (como a crítica à injustiça social, por exemplo) deveriam então abraçar o islamismo uma vez que este confirma certas crenças bíblicas (como a ressurreição, por exemplo). No entanto, é tão impossível conciliar marxismo com o cristianismo quanto igualar um cristão verdadeiro e um muçulmano. Nenhum ecumenismo ingênuo pode fazê-los amigos, nenhum malabarismo teológico ou filosófico pode torná-los semelhantes em qualquer sentido.

Cristão marxista? Tão real quanto um fogo gelado emanando de uma luz escura.


Autor: Eguinaldo Hélio Souza

É possível alinhar a ideologia de esquerda com a doutrina social da igreja na perspectiva reformada?

Levanto aqui apenas algumas questões para o cristão tentar responder antes de adotar um discurso de defesa das ideologias políticas.

Mercado e sua regulamentação

Todas  as sociedades modernas concordam que precisamos de algumas leis a fim de evitar a fraude e a injustiça nas transações comerciais. Por exemplo, o governo deve impor o cumprimento de contratos e também determinar alguns padrões de higiene e de segurança na venda de medicamentos, alimentos e outros produtos. O governo deve impor normas de saúde e higiene em restaurantes e controlar o uso de pesos e medidas. O governo também têm autoridade genuína para coletar impostos visando o cumprimento de suas funções. Paulo diz que, pelo fato de a autoridade civil ser “serva de Deu para o teu bem” (Rm 13:4), “pagais impostos; porque [os governantes] são servos de Deus, para atenderem a isso. Dai a cada um o que lhe é devido: a quem tributo, tributo…” (Rm 13:6,7). Os governos têm o direito moral de cobrar impostos para suas funções legítimas: recompensar o bem e punir o mal e estabelecer a ordem na sociedade, pois Pedro diz que os governadores são enviados “para punir os praticantes do mal e honrar os que fazem o bem” (1Pe 2:14).

No entanto o estado têm, com muita frequência ido muito além dessas funções legítimas. Qual é o limite do Estado?

Vamos verificar alguns pontos sobre o limite do estado e suas funções numa perspectiva bíblica.

  1. O ensino bíblico sobre o papel do estado dá apoio ao livre mercado, não se encontra na bíblia nenhuma ideia de o estado ter direito de tomar a propriedade ou o controle de empresas particulares. A função do estado é punir o mal, recompensar os que fazem o bem (1 Pe 2:13-14) e impor ordem na sociedade. Não creio que o propósito de Deus seja que o estado possua os bens ou as empresas de uma nação. O estado não consegue administrar sequer áreas exclusivas a ele, como evitar fraudes, como pode administrar empresas? (no Brasil temos o exemplo recente da Petrobras).
  2. A bíblia adverte contra o governante que usa seu poder para tomar o que pertence legitimamente ao povo, incluindo seus campos e vinhas (1 Sm 8:10-18). Hoje em nosso país há uma ideia da esquerda que o governo pode simplesmente tomar e distribuir terras.
  3. O ensinamento da bíblia sobre a proteção da propriedade privada indica que a propriedade pertence legitimamente a pessoas, e não ao governo, empresas são uma forma de propriedade (Êx 20:15; Lv 25:10; 1Rs 21:1-29; At5:4).
  4. A ênfase da bíblia no valor da liberdade humana (Êx 20:2; Is 61:1; 1Co 7:21; Gl 5:1) também favorece um sistema de livre mercado que permite às pessoas escolher onde trabalhar, o que comprar , como administrar uma empresa e como gastar seu dinheiro. Uma economia controlada pelo governo, o governo toma as decisões pelas pessoas.
  5. A história mostra repetidas vezes que o livre mercado traz melhores resultados do que uma economia controlada pelo estado.

Desigualdade econômica

A bíblia não pressupõe que os ricos conquistaram sua riqueza por algum meio desonesto. Também não há sugestão alguma de que o estado têm o direito de tomar o dinheiro de pessoas ricas simplesmente porque são ricas.

A ênfase das escrituras está em tratar tantos ricos quanto pobres com equidade e justiça (Êx 23:3,6). Se cometerem erros, devem ser punidos, mas se não cometerem, não devem ser punidos (Pv 17:26; 1Rs2:14). No entanto a riqueza ou a pobreza em si só não indica com precisão o caráter da conduta de alguém na sociedade. Rotular todos os ricos como sendo maus ou provavelmente maus ou pressupor que se tornaram ricos de forma desonesta são atitudes injustas e contrárias ao ensino bíblico.

O que dizer da atitude que afirma que o dinheiro dos ricos deve ser tomado, pois não fará falta pra eles ou porque essa ação não vai prejudicá-los? O ensinamento bíblico é: Não roubarás (Êx 20:15). Não é correto roubar dos pobres nem é correto roubar dos ricos.

Mas será que o estado deve tentar equiparar a quantidade de rendimentos ou bens das pessoas ou realizar ações que caminhem na direção da igualdade?

Existe uma real necessidade de programas sociais apoiados pelo estado para ajudar casos de urgente necessidade. Também é necessário que o estado forneça financiamento suficiente para que todos possam obter habilidades e formação adequadas para que obter o que necessitam. Portanto, no que diz respeito a algumas necessidades básicas da vida (alimentação, vestuário, moradia, ensino, saúde e segurança), é correto o estado “tomar de todos e dar aos pobres”. Isso é apoiado pelo ensino bíblico de que a autoridade civil é serva de Deus para o o bem (Rm 13:4). Certamente buscar o “bem” da sociedade inclui cuidar para que ninguém sofra com a ausência de necessidades básicas como alimentação, vestuário, moradia, ensino, saúde e segurança como também não tenha ausência das habilidades necessárias para prover o próprio sustento. Essa ajuda pode ser dada com recursos de receitas fiscais gerais. No entanto, observe que essas convicções se baseiam no objetivo do governo  de promover o bem-estar geral da sociedade e não em ideia vaga sobre o pressuposto de justiça em reduzir as diferenças entre ricos e pobres.

Além dessas exigências básicas, não encontramos qualquer justificativa para pensar que o governo, como parte da política publica, deva tirar dos ricos para dar aos pobres. Alias, quando em uma sociedade, prejuízos significativos  são causados à economia é causado à sociedade.

De fato, há vezes em que as pessoas são pobres em consequência da opressão ou da injustiça que sofrem ou por causa de uma tragédia ou um infortúnio pessoal. Nesses casos tanto a igreja quanto o governo devem auxiliar essas pessoas, e o governo deve punir a injustiça.

No entanto, com exceção da injustiça e das tragédias pessoais, em uma sociedade livre em que não corre nenhum confisco de bens pelo governo, a quantidade de dinheiro que as pessoas ganham ainda varia muito, porque elas têm habilidades diferentes, interesses diferentes e níveis distintos de ambição econômica. Portanto, se as pessoas estivessem livres da intervenção governamental, algumas se tornarão muito ricas, outras terão uma renda satisfatória e alguns permanecerão relativamente pobres. Se o sistema econômico for relativamente livre, isso de fatos acontecerá. Para termos uma ideia de Brasil quando o assunto é liberdade econômica, O Brasil ocupa a posição 153 (o ranking vai até a posição 180) no Ranking de Liberdade Econômica segundo o site www.heritage.org/index/ranking.

Tente imaginar que por meio de algum tipo de experimento social, todas as pessoas de uma sociedade recebessem inicialmente cem mil Reais em dinheiro, depois de poucas semanas alguns teriam gastado tudo, outros teriam poupado a maior parte e alguns teriam investido grande parte em atividades que geram mais renda. Depois de alguns meses haveria novamente desigualdade significativa. Isso é inevitável enquanto as pessoas puderem ser livres.

Então, como um governo pode obrigar as pessoas a ter quantias iguais de bens? Somente por meio da redistribuição constante de dinheiro, tomando daqueles que foram econômicos e produtivos e dando a muitas outras pessoas, incluindo àquelas que têm sido improdutivas ou têm desperdiçado seu dinheiro. Em outras palavras, a suposta redistribuição de bens que os partidos socialistas querem implantar no Brasil, não pode ser mantida se não penalizar continuamente os bons hábitos e ao mesmo tempo recompensar os maus hábitos. Quanto mais tempo essa política fosse mantida, mais a sociedade cairia em uma espiral de pobreza e desespero. Esse tem sido o resultado inevitável das sociedades comunistas e/ou socialistas.

Isso ocorre da mesma forma, mas em grau menor em situações nas quais a intenção do governo não é equipara os bens, mas as diferenças nos níveis de renda de uma população, isso ocorre sempre mediante sérias restrições à liberdade humana e também prende a maior parte da nação na “igualdade” da pobreza.

Nas chamadas sociedade “igualitárias”, mesmo que as pessoas sejam iguais nos bens de valor econômico, inevitavelmente serão desiguais em relação ao poder político e aos privilégios dados pelo governo. Se a desigualdade econômica é removida, é simplesmente substituída pela desigualdade de privilégios e de grandes benefícios que provêm do poder político elevado. O papel do governo não deve ser equiparar a renda ou os bens das pessoas em uma sociedade.

É correto ajudar os pobres, pois vários versículos das Escrituras ordenam que se faça isso (Rm 15:25,26; Gl 2:10; 1Jo 3:17). No entanto, temos de lembrar que o financiamento de programas de bem-estar social que atendam a necessidades de curto prazo nunca serão uma solução de longo prazo para a pobreza. Se o financiamento de programas sociais se torna a única solução para a pobreza, ele simplesmente tem de ser repetido constantemente, e os beneficiários continuam pobres. A única solução em longo prazo para a pobreza vem quando as pessoas têm habilidades suficientes e disciplina para obter e manter empregos economicamente produtivos.

O governo em si não tem condições de oferecer às pessoas empregos economicamente produtivos (com exceção de alguns empregos bancados com recursos públicos, como os serviços públicos). De longe, o maior número de empregos economicamente produtivos (empregos que contribuem de fato com algo novo de valor para a sociedade) é encontrado no setor privado. Todo negócio bem-sucedido dá Às pessoas empregos economicamente produtivos pelos quais são pagas e, dessa forma, agrega valor à sociedade. A pessoa pobre que trabalha nesse emprego é paga de acordo com o valor agregado e assim começa a sair da pobreza.

Isso deve ocorrer porque Deus deseja que as pessoas sejam economicamente produtivas. Antes de existir qualquer pecado ou mal no mundo, Deus colocou Adão no jardim do Éden “para que […] o cultivasse e guardasse” (Gn 2:15) – trabalho produtivo é parte essencial da forma que Deus nos criou como seres humanos. Por isso,  ao menos em parte, fornece um incentivo ao trabalho regular (Pv 16:26).

Portanto, para aqueles que desejam ajudar os pobres e vencer o problema da pobreza, o seu objetivo principal não deve ser aumentar as benesses do governo, mas oferecer incentivos e condições adequadas para que empresas particulares cresçam e prospere e, consequentemente, criem empregos que serão a única solução em longo prazo para a pobreza e a única maneira de os pobres adquirirem a dignidade e o autorrespeito que são resultado de se sustentarem.

Desse modo, os governos devem incentivar o desenvolvimento e o lucro das empresas. Esse incentivo envolveria um livre mercado, com um sistema funcional de preços para orientar a distribuição de recursos, um sistema monetário estável, a punição efetiva de crimes, a a imposição do cumprimento de contratos e leis de patente e de direitos autorais e, também, a proteção da propriedade privada. Também incluiria um sistema judicial justo, níveis de taxação relativamente baixos, um sistema eficaz de ensino e um sistema bancário confiável. Quando governos implementam esses fatores, as empresas podem crescer, prosperar e criar empregos que por si só tirarão permanentemente as pessoas da pobreza.

Soli Deo gloria

Em 1989 eu ainda um “menino“, cursava a 6ª série do ensino fundamental, inocentemente fiz um comentário sobre o então candidato a presidência da republica, Lula, iniciou ali uma “conversa” com a professora Eg. (chamarei apenas pelas iniciais) que durou longos dias, ela foi dizendo-me como era a ideia da esquerda e como essa ideia era superior as demais e como terrível era não pensar e ser de esquerda. Não sei se meus amigos Daniel, Marilza, Ronaldo, entre outros, também foram “conversar” com essa professora, mas eu, antes da eleição eu havia tornando-me de esquerda, lá se vão 30 anos, hoje alguns desse amigos e até meu primo me pergunta porque não sou de esquerda, como se não sê-lo fosse algum tipo de aberração.

Por que não sou de esquerda? 

Antes de mais nada, lembro-me de Olavo de Carvalho que diz que: “Eles não são capazes de ler outra coisa além de escritos Marxista“, por isso nunca mudam o pensamento. Quando no seminário me deparei com ensinos de Calvino sobre política comecei a levantar dúvidas sobre a supremacia intelectual da esquerda, foi a partir de outras leituras que me libertei do pensamento marxista.

Aqui não pretendo falar sobre a esquerda, pois já o fiz em outros posts, aqui apenas expresso os motivos porque não sou de esquerda, embora duvide que os esquerdistas entendam.

Direto o ponto

Diante do problema do mal, experimentamos a urgência de uma solução. Para quem crê, Jesus satisfez essa urgência: inocente, sacrificou-se por nós. Assim, o cristão fiel declara com tranquilidade que o mal está em si, confiando em Cristo para a redenção. Porém, para quem não crê, o problema do mal resta irresolvido e a solução será sempre externa. Este é o “mecanismo do bode expiatório”, segundo René Girard: fazer com que alguém encarne o mal e eliminá-lo, gerando sacrifícios sem fim (enquanto a Bíblia enfatiza: o sacrifício de Jesus é eterno).

Isso se verifica facilmente entre nós, ocidentais, quando lembramos os assassinatos em massa do século 20. Judeus, ciganos, cristãos dissidentes e povos não alemães foram os bodes expiatórios da Alemanha hitlerista: quarenta milhões de mortos. Da mesma forma, nos países comunistas o vago conceito de “classe dominante” tem justificado a condenação à morte de mais de cem milhões. Trata-se um ciclo diabólico, pois não há sacrifícios que cheguem para a sanha dos que pensam combater o mal dessa maneira. Assim, a violência aumenta na mesma proporção do secularismo.

A equiparação entre comunismo e nazismo não é novidade. No entanto, de certo modo o Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães era melhor nisso: mentia menos. Seus membros não escondiam o desejo de conquistar o mundo; já o socialismo oculta seu projeto de poder total sob a compaixão pelos pobres e a promessa de um futuro glorioso. O autointitulado “protetor dos oprimidos”, ao tornar-se chefe da nação, passa a valer-se de sua anterior (e farsesca) posição de “oprimido” para solapar resistências e positivar desmandos. E o povo, além de mais empobrecido, fica definitivamente sem voz. Na Rússia, na China e no Camboja a arbitrariedade apenas mudou de mãos, tornando-se voraz como nunca; em Cuba, uma favela carioca pareceria condomínio de luxo na parte não turística da ilha; na Venezuela, Chávez diz “eu sou o povo” para justificar a progressiva supressão da democracia.

Hoje não há cristãos nazistas (espero!), mas há uma miríade de cristãos socialistas ou comunistas. É algo difícil de compreender. Em primeiro lugar, por que um seguidor de Jesus aderiria a um arremedo de plano da redenção? Para confessar esse endosso, precisaria necessariamente subverter todo o pensamento bíblico, substituindo a criação divina pela matéria autônoma, o pecado original pela propriedade privada, a salvação em Cristo pela revolução socialista. Se não o fez, é porque ainda oscila entre os dois mundos, sem perceber que são díspares — a cultura marxista mimetizando a cristã.

Em segundo lugar, por que um cristão se posicionaria a favor de um Estado forte que pune seus dissidentes? O processo de centralização do poder empurra a igreja ou para o servilismo ou para a clandestinidade onde quer que o socialismo seja implementado. De fato, Hannah Arendt estudou o totalitarismo e concluiu que o isolamento torna o ser humano muito mais vulnerável ao controle estatal. Por isso, esse regime ataca prioritariamente as livres associações (a família, a igreja, a escola, o comércio), buscando atomizar a sociedade no melhor estilo romano “dividir para conquistar”.

Ser socialista e cristão é tomar o partido de César, não de Cristo. Sobretudo, ser socialista e cristão no Brasil de hoje é assumir uma postura perigosíssima para a igreja. De várias maneiras, o governo atual, honrando suas influências teóricas e suas alianças internacionais, busca cada vez mais controle sobre a sociedade. É quando precisamos recorrer aos ensinamentos de Calvino e Kuyper: por causa do pecado, Deus instituiu os magistrados para punir os maus e garantir a ordem; porém, o Estado “jamais” pode ferir a soberania das esferas individuais, familiares e corporativas, pois a autoridade de cada esfera descende igualmente de Deus. Caso o faça, devemos orar para que retorne ao ideal divino, opondo-nos a cada atentado à liberdade e amparando os perseguidos. Mas isso só será possível se substituirmos a cosmovisão esquerdista por uma genuína cosmovisão cristã. Que Deus ajude a igreja brasileira nessa empreitada.

Porque não sou de esquerda

  1. Porque não creio e nem defendo um Estado que interfere na vida comum e privada do cidadão. Na minha opinião o Estado deve ser mínimo evitando assim o domínio exagerado por parte dos governantes sobre a vida e família dos contribuintes. Ademais, acredito que o Estado jamais deva interferir na soberania das esferas individuais, familiares e corporativas, visto que a autoridade de cada esfera descende igualmente de Deus.
  2. Porque não defendo e nem tampouco comungo dos conceitos marxistas e comunistas que ensinam e incentivam a luta de classes afirmando assim que ela é indispensável àqueles que desejam uma nação justa.
  3. Porque eu sou contra as políticas públicas que incentivam o aborto, a ideologia de gênero, a desconstrução dos valores judaicos/cristãos relacionados a família, o feminismo, descriminalização das drogas, o incentivo a sexualidade precoce em crianças e adolescentes, bem como a intervenção estatal na educação de nossas crianças.
  4. Porque as politicas de esquerda nivelam o povo por baixo, empobrecendo-o cada vez mais, deixando-os sem voz e sem opção de progresso e crescimento.
  5. Porque creio numa economia liberal que por si só, promove emprego, geração de renda, saída da pobreza através do trabalho, proporcionando assim dignidade ao trabalhador.

A Soberania do Estado Contrapõe-se à de Deus 

Assim todo direito transcendente em Deus, para o qual o oprimido erguia sua face, morreu. Não há outro direito exceto o direito imanente que está anotado na lei. A lei está certa, não porque seu conteúdo está em harmonia com os princípios eternos do direito, mas porque ela é a lei. Se no período seguinte ela fixa o próprio oposto, isto também deve estar certo. E o fruto desta teoria enfraquecedora é, naturalmente, que a consciência do direito está embotada, que toda estabilidade do direito afasta-se de nossa mente, e que todo entusiasmo mais alto pelo direito é extinguido. Aquilo que existe é bom porque ele existe; e não é mais a vontade de Deus, daquele que nos criou e nos conhece, mas torna-se a sempre mutável vontade do Estado, que, não tendo ninguém acima dela, realmente torna-se Deus, e deve decidir como será nossa vida e nossa existência. E quando, além disso, vocês consideram que este Estado místico
expressa e aplica sua vontade somente através de homens – que prova a mais é exigida de que esta soberania do Estado, exatamente como a soberania popular, não excede a humilhante sujeição do homem a seu semelhante e nunca eleva-se ao dever de submissão que encontra sua força na consciência?

O Calvinismo Aponta para a Fonte do Direito Eterno

Entretanto, em oposição tanto à soberania popular ateísta dos enciclopedistas, como a soberania do estado panteísta dos filósofos alemães, o calvinista mantém a soberania de Deus, como a fonte de toda autoridade entre os homens. E defende nossas mais altas e melhores aspirações colocando cada homem e cada povo diante da face de nosso Pai celeste. Toma conhecimento do fato do pecado, que outrora foi jogado fora em 1789, e que agora, em extravagância pessimista, é considerando a essência de nosso ser. O Calvinismo aponta para a diferença entre a concatenação natural de nossa sociedade orgânica e o laço mecânico que a autoridade do magistrado impõe. Ele torna fácil para nós obedecer a autoridade, porque, com toda autoridade, nos motiva a honrar a exigência da soberania divina. Ergue-nos de uma obediência nascida do medo do exército forte, para uma obediência por causa da consciência. Ensina-nos a olhar por cima da lei existente para a fonte do Direito eterno de Deus, e cria em nós a coragem indomável para protestar incessantemente contra a injustiça da lei em nome deste Direito superior. E embora o Estado possa poderosamente afirmar-se e oprimir o livre desenvolvimento individual, acima deste Estado poderoso há sempre brilhando diante dos olhos de nossa alma, como infinitamente mais poderosa, a majestade do Rei dos reis. Cujo tribunal justo sempre mantém o direito de apelação para todos os oprimidos, e para quem a oração do povo sempre sobe, para abençoar nossa nação e, nesta nação, nós e nossa casa!

Num sentido calvinista nós entendemos que a família, os negócios, a ciência, a arte e assim por diante, todas são esferas sociais que não devem sua existência ao Estado, e que não derivam a lei de sua vida da superioridade do Estado, mas obedecem uma alta autoridade dentro de seu próprio seio; uma autoridade que governa pela graça de Deus, do mesmo modo como faz a soberania do Estado. Isto envolve a antítese entre o Estado e a Sociedade, mas com a condição de não concebermos esta sociedade como um conglomerado, porém, como analisada em suas partes orgânicas, para honrar, em cada uma destas partes, o caráter independente que pertence a elas. Esferas Independentes, mas sob Deus Neste caráter independente está necessariamente envolvido uma autoridade superior especial e intencionalmente chamamos esta autoridade superior de – soberania nas esferas sociais individuais, a fim
de que possa estar claro e decididamente expresso que estes diferentes desenvolvimentos da vida social nada tem acima deles exceto Deus, e que o Estado não pode intrometer-se aqui, e nada tem a ordenar em seu campo.


Nota:

Norma Braga  no site: ultimato.com.br/revista/artigos/323/por-que-nao-sou-de-esquerda
Renato Vargens no site: renatovargens.blogspot.com.br/2016/04/razoes-porque-eu-nao-sou-esquerdista_10.html
CALVINISMO de Abraham Kuyper – Editora Cultura Cristã

Soli Deo gloria

Faz algum tempo que vi a imagem ao lado no Facebook e quem a postou fazia insinuações sobre o fato do Brasil ser cristão (embora a imagem fale de ser religioso), e ser ignorante. O autor do post dizia: Será por isso?

Antes de mais nada, devo salientar que não é o fato de alguém ter religião ou não, acreditar em Deus ou ser ateu que distingue seu intelecto.

O Prêmio Nobel é o reconhecimento de maior prestígio dado a homens ou mulheres que, com seu trabalho, contribuíram para o bem e o progresso da humanidade. É, sem dúvida o prêmio mais cobiçado; entre seus laureados estão homens e mulheres, religiosos e ateus. Entre outros estão: Marie Curie, Albert Einstein, Madre Teresa e o Dalai Lama, só para citar alguns.

Uma rápida análise da lista dos agraciados com o Prêmio Nobel desde sua criação, em 1901, até hoje revela uma destacada participação judaica.  Entre as 850 personalidades , 180 são judeus; e a grande maioria deles, 157, atuam nas áreas científicas.

Não há dúvidas que uma das razões para essa significativa participação judaica é a importância que os judeus sempre atribuíram ao estudo e à erudição. O nível de reflexão e análise necessários para estudar o Talmud, que, em hebraico, significa literalmente “estudo” ou “aprendizado”. Gerações após gerações inteiramente dedicadas ao estudo dos textos judaicos resultaram em incontáveis êxitos nos estudos laicos, pois é preciso uma mente inquisitiva para fazer descobertas e ter sucesso em novas áreas do conhecimento. [1]

Nas últimas décadas, tem se tornado comum no mundo ocidental “malhar” o cristianismo. Intelectuais, acadêmicos, escritores e articulistas de renome costumam se referir à fé cristã de forma desairosa e depreciativa. Infelizmente, com frequência muitos críticos estão dentro das fileiras do próprio cristianismo. É considerado politicamente incorreto falar mal de outras religiões, como o islamismo, o budismo e o hinduísmo, que estão muito em voga na Europa e nas Américas, mas não se vê nenhum problema em condenar o movimento cristão. Alguns pensadores ateus, autores de livros campeões de vendas, têm defendido explicitamente a extinção pura e simples do cristianismo. Segundo afirmam, seria desejável que todas as religiões deixassem de existir, mas na realidade eles têm em mente antes de tudo a fé cristã, a tradição religiosa predominante no Ocidente.

Além de preconceituosa, essa atitude é profundamente injusta do ponto de vista histórico. Os próprios cristãos reconhecem que sua trajetória ao longo dos séculos não está isenta de dolorosos problemas. As cruzadas, o antissemitismo, a Inquisição, as guerras religiosas e a escravidão nas Américas são manchas tristes na experiência da igreja, falhas que os cristãos conscienciosos lamentam profundamente. É preciso lembrar esses fatos continuamente para que eles não voltem a se repetir. Todavia, as contribuições e os benefícios que o cristianismo legou ao mundo são muito mais marcantes e numerosos que os seus erros, como o estudo desapaixonado da história demonstra de maneira conclusiva. Alguns desses benefícios não foram generalizados nem contínuos, tendo ocorrido mais em algumas épocas e lugares do que em outras. [2]

Sei que o termo civilização ocidental é uma generalização, há inúmeras diferenças entre a cultura característica do sul e do norte da Itália, mais ainda entre as da Itália e a da Holanda.

Três pontos em comum unem as culturas que englobarei aqui como constituintes da civilização ocidental: situam-se na Europa, foram parte do Império Romano e adotaram em algum momento o catolicismo como religião oficial – sendo todas elas ainda hoje predominantemente ligadas à alguma corrente cristã.

Romênia, Iugoslávia, Bulgária, também fizeram parte do Império Romano, mas não entram neste grupo. Nenhum país que após o grande cisma do século XI ficou sob a influência da Igreja Ortodoxa teve importância no processo de construção deste legado –  a Grécia entra por sua contribuição antiga, é o berço da civilização europeia com seus filósofos, poetas e dramaturgos; mas já bem antes de seu período cristão tinha perdido irremediavelmente o bonde da história.

Outros cristãos Ortodoxos como Ucrânia e Rússia também não. Os protestantes Dinamarca e os escandinavos também; nenhum deles faz realmente parte do grupo que pretendo abordar.

A Polônia é um caso aberrante, uma nação católica que deu ao mundo Copérnico, uma importante contribuição cultural – mas também não lembro de outra.

Basicamente, ao me referir à civilização ocidental, estou falando da que permeou o território geográfico que cobre da Itália à Inglaterra, toda a faixa ocidental entre elas,  mais Áustria e uma parte da Alemanha. O cristianismo é um elemento comum a todas estas culturas – a despeito dos setecentos anos de invasão moura da península ibérica.

Comparada a uma civilização ideal – e este ideal é fluido, varia de um indivíduo pra outro – , a ocidental, com seu histórico de guerras, massacres e perseguições a minorias, sempre perderá feio. Mas comparemos esta civilização a outras que tiveram existências concreta e cronologicamente simultâneas, a civilização hindu ou a chinesa –  ambas também são termos genéricos para designar várias culturas heterogêneas e idiomas diversos que de alguma forma se conciliaram numa mesma área (na Índia se fala centenas de dialetos diferentes).

Estas outras civilizações, ao longo de toda a História, abarcaram populações numericamente superiores à englobada pela ocidental. Comparando a ocidental a elas, veremos que esta não sai mal na foto. As outras produziram massacres, guerras, déspotas da mesma forma. Mas, barbaridades a parte,  a ocidental produziu Tomás de Aquino, Dante, Michelângelo, Ticiano, Shakespeare, Rembrandt, Bach, Mozart, Leibniz… Que nomes as outras civilizações têm para comparar a estes?

Além do fato de não produzirem nomes de tal vulto como a ocidental, outras civilizações com outros enfoques religiosos também não se expandiram com a mesma habilidade. Por exemplo, a América está a meio caminho da Europa e da Ásia (aliás, pelo Estreito de Bering é bem mais próxima da Ásia). Mas quem chegou e colonizou o novo mundo foram os europeus. Nós brasileiros, assim como argentinos, norte-americanos, somos produto desta civilização. Assim também foi com a Austrália, muito mais próxima da Índia que da Inglaterra.

Não temos como saber o que teria sido do mundo ocidental sem o avanço do cristianismo, quanto tempo a Europa levaria para se reorganizar após a queda do Império romano se não houvesse a mão-de-obra qualificada da Igreja para assumir os cargos burocráticos. Mas esta é outra discussão.

Esta ênfase no cristianismo mostra que a Bíblia é uma das bases da nossa civilização ocidental. Para muitos ela é a palavra de Deus exposta, para outros um depósito de sabedoria compilada através de várias gerações. Para outros ainda, uma elaboração mitológica sem maior relevância que a mitologia grega ou egípcia – dos que compartilham esta visão falarei mais ao final.

Como todos sabem, os cristãos baseiam sua fé especificamente na dissidência judaica representada por Jesus, o Cristo. O calendário do mundo ocidental é dividido em antes e depois do seu nascimento. A História que conhecemos não divide a cronologia em antes/depois de Moisés; Sócrates; Alexandre, o Grande; Julio César. A História tomou como parâmetro Jesus, logo, seu nascimento é, sem dúvida, um fato altamente significante dentro dela.

Obs. Tanto Julio César quanto seu sobrinho-neto Otaviano Augusto conseguiram, em atos de auto-glorificação, inserir seus nomes no calendário ocidental, rebatizando em sua própria homenagem o sétimo e o oitavo mês do ano, nomes estes que usamos até hoje. Mas ainda assim, não se tornaram “o” parâmetro de medida.

Nos dias de hoje, não estamos num patamar de ideias e debates particularmente bom, mas temos este passado digno de nota. E este momento atual ruim se dá pela predominância de ideias alheias ao cristianismo, muitas antagônicas a ele – marxismo, positivismo, materialismo científico, o ideário politicamente correto – as quais passaram a predominar e moldar a mente da intelectualidade, algumas já há mais de um século.

Esta mesma sociedade que abraçou ideias muitas vezes perversas, está sempre pronta a apedrejar a Igreja quando um de seus representantes, em algum pronunciamento, não abraça as causas que certos segmentos desta sociedade acham que a Igreja deveria aceitar. Algumas destas posições reivindicadas até são dignas de um debate, outras são diametralmente opostas à doutrina cristã e, portanto, inconciliáveis com ela.[3]

A influência histórica
O cristianismo é a principal tradição cultural do mundo ocidental, o mais importante fator na formação histórica da Europa e das Américas. Assim sendo, a influência cristã permeia todos os aspectos da vida desses continentes e suas nações. Caso prevalecesse a tese dos autores que defendem a extinção do cristianismo, por uma questão de coerência vastas mudanças teriam de ser feitas na vida social desses povos. Por exemplo, o calendário teria de ser trocado por outro — a semana de sete dias, os termos “sábado” e “domingo” (“dia do Senhor”) e a contagem dos anos (como 2008) não mais fariam sentido, porque todos têm origem cristã ou judaico-cristã. Algumas das celebrações e festividades mais apreciadas pelas pessoas (Natal, Páscoa, Dia de Ação de Graças) teriam de ser eliminadas. Milhões de pessoas teriam de mudar seus nomes de origem cristã, inclusive muitos ateus. O mesmo aconteceria com um imenso número de designações de cidades, logradouros e pontos geográficos. Os idiomas, a música, o folclore, as tradições e outros elementos seriam profundamente afetados.

Mas existem questões mais importantes. Olhando-se para a história antiga e recente, percebe-se o enorme impacto humanizador e civilizador do cristianismo. Desde o início da era cristã, houve uma grande preocupação com a dignidade da vida humana, que se traduziu no combate a práticas degradantes como o aborto, o infanticídio e as lutas de gladiadores. O cristianismo valorizou a criança, a mulher, o idoso, o casamento e a vida familiar. Embora no início os cristãos tenham mantido a escravidão que existia no Império Romano, a fé cristã continha valores que levaram à gradual extinção desse mal. Tem sido imenso, ao longo do tempo, o esforço dos cristãos em socorrer os pobres, doentes e desamparados de toda espécie, através de um sem-número de iniciativas e instituições humanitárias. Até hoje, tanto em tribos indígenas e populações carentes como entre povos adiantados, a contribuição cristã nessas áreas se faz notar de modo saliente. No Brasil pode ser visto através das duas maiores correntes cristãs, a igreja católica através da teologia da libertação, e a igreja protestante (evangélica) através da teologia da missão integral.

O legado cultural
Sem desprezar as magníficas contribuições das antigas civilizações grega e romana, foi principalmente o cristianismo que moldou a vida dos povos ocidentais como os conhecemos hoje, além de exercer grande influência positiva na África e na Ásia. À medida que a fé cristã se expandia, ela elevou o padrão de vida dos povos que deram origem às nações europeias. A contribuição cristã na área da educação tem sido das mais destacadas. Durante séculos, as únicas escolas que existiam estavam ligadas à igreja. Muitos povos, ao serem evangelizados, receberam simultaneamente a escrita e a alfabetização, como ocorreu entre os eslavos, na Europa oriental, e em muitas nações africanas. A Bíblia, traduzida para as línguas desses povos, se tornou importante nesse processo. As primeiras universidades (Paris, Bolonha, Oxford) e muitas outras surgidas mais tarde (Harvard, Yale, Princeton etc.) foram criadas por cristãos.

O cristianismo deu uma contribuição inigualável em outras áreas significativas, notadamente em séculos recentes. Alguns exemplos no âmbito político são o governo representativo, a separação dos poderes, a expansão da democracia e a ampliação dos direitos e liberdades civis. As convicções cristãs permitiram a ascensão econômica do homem comum, gerando prosperidade para famílias e povos. Outra área de atuação foi a ciência, não só pelo fato de que a maior parte dos cientistas ao longo da história têm sido cristãos, mas de que o cristianismo, com sua visão de um mundo ordenado e sujeito a leis fixas, porque criado por Deus, possibilitou o próprio surgimento da ciência. E que dizer das contribuições nos campos da literatura e da arte? Se não fosse o cristianismo, não teríamos obras como as “Confissões”, de Agostinho, a “Divina Comédia”, de Dante, o “Paraíso Perdido”, de Milton, e tantas outras. Não contemplaríamos as magníficas catedrais góticas, a Capela Sistina, bem como as esculturas e pinturas de Michelangelo, Leonardo da Vinci, Rembrandt e outros mais. Não poderíamos ouvir “O Messias” de Haendel nem as inspiradoras composições de Johann Sebastian Bach.

Valores religiosos e éticos
Os legados mais valiosos do cristianismo ao mundo são a vida e os ensinos de seu fundador, registrados no Livro dos Livros. Jesus Cristo, o carpinteiro de Nazaré que os cristãos consideram o próprio Filho de Deus encarnado, proferiu algumas das palavras mais belas, sublimes e cativantes que se conhecem na história humana. Ele falou das coisas transcendentes e eternas de modo simples e acessível a qualquer indivíduo. Os valores que ensinou, como o amor, a compaixão, o altruísmo, a integridade, a veracidade e a justiça, têm trazido benefícios incalculáveis ao mundo. Todavia, ele não se limitou às palavras e conceitos, mas exemplificou em suas ações as verdades que buscava transmitir. Por fim, deu sua vida na cruz para cumprir cabalmente a missão de que estava incumbido. Desde então, seu ensino e exemplo têm inspirado e transformado milhões de pessoas em todos os recantos do mundo, além de ter induzido mudanças radicais nos mais diferentes aspectos da sociedade.

Sem Cristo e seu grandioso legado, o mundo certamente seria um lugar muito mais sombrio, triste e desesperançado. Essa é a tese de D. James Kennedy em seu livro “E se Jesus não Tivesse Nascido?” (Editora Vida, 2003). Não se pode negar que muitos não-cristãos têm dado contribuições relevantes à sociedade. Os cristãos não têm dificuldade com isso, porque entendem que Deus atua em toda a criação e que sua imagem, ainda que desfigurada, está presente em todos os seres humanos. Todavia, as alternativas de um mundo sem fé e sem cristianismo podem se tornar aterrorizantes. Basta lembrar que os homens mais cruéis, desumanos e sanguinários do século 20 — indivíduos como Josef Stálin, Adolf Hitler, Mao Tsé Tung e Pol Pot — além de não serem cristãos, eram inimigos do cristianismo. Mesmo sem apelar para casos extremos como esses, está claro que o crescente secularismo que avassala o mundo, com sua relativização do significado e da importância da vida, representa uma grande ameaça para o futuro da humanidade.[2]

 

Soli Deo gloria

 

[1] Morashá:  http://www.morasha.com.br/judaismo-no-mundo/judeus-e-premio-nobel.html
[2] Ultimato: http://www.ultimato.com.br/revista/artigos/314/em-defesa-do-cristianismo
[3] https://comoeueratrouxaaos18anos.wordpress.com/duas-palavrinhas-sobre-o-legado-cristao/

Nunca se viu tantos apóstolos como neste início de século. Em cada canto, esquina e cidade encontramos alguém reivindicando o direito de ser chamado apóstolo.
Entendendo o movimento de restauração e o movimento apostólico:

O chamado movimento de restauração defende a tese de que Deus está restaurando a igreja. Para estes, após a morte dos primeiros apóstolos, a igreja de Cristo paulatinamente experimentou um processo de declínio espiritual culminando com a apostasia vivenciada pelos seus adeptos no período da idade média.

Com o advento da Reforma Protestante, os defensores desta teologia afirmam que Deus começou a restaurar a saúde da igreja. Segundo estes, Lutero foi responsável pela redescoberta da salvação pela graça, e agora no século XXI, estamos vivendo a restauração do ministério apostólico. Os teólogos desta linha de pensamento afirmam que a restauração dos apóstolos é uma das últimas coisas a serem feitas pelo Senhor, antes de sua vinda. Para os adeptos desta linha de pensamento, os apóstolos de hoje possuem, em alguns casos, maior autoridade do que os apóstolos do primeiro século, até porque, para os defensores desta corrente teológica a glória da segunda casa será maior do que a primeira.

Para estes o ministério apostólico não acabou. Na verdade, tais teólogos advogam que o ministério apostólico é perpétuo e que o livro de Atos ainda continua a ser escrito por santos homens de Deus, os quais, mediante a sua autoridade apostólica, agem em nome do Senhor.

Este movimento tem suas semelhanças com o surgimento dos mórmons e a Igreja dos Santos dos Últimos Dias, que ensina que o corpo de escritos inspirados por Deus não se fechou e que Deus tem muita coisa nova para dizer e para revelar aos seus santos através de seus apóstolos.

Infelizmente, assim como os mórmons, os adeptos do movimento apostólico consideram a Bíblia uma fonte importante, mas não única para a fé. Para os apóstolos deste tempo, Deus, através de seus profetas, pode revelar coisas novas, ainda que isso se contraponha a sua Palavra. Basta olharmos para as doutrinas hodiernas que chegaremos à conclusão que os apóstolos do século XXI, acreditam que suas revelações são absolutamente diretivas, normativas e inquestionáveis.
Segundo a bíblia quais deveriam ser as credenciais de um apóstolo?

1. O apóstolo teria de ser testemunha do Senhor ressurreto. Em Atos vemos os apóstolos reunidos no cenáculo, conversando sobre quem substituiria Judas. Em Atos 1.21-22 lemos: “É necessário pois, que, dos homens que nos acompanham todo o tempo que o Senhor Jesus andou entre nós, começando no batismo de João, até ao dia em que dentre vós foi levado às alturas, um destes se torne testemunha conosco da sua ressurreição”. Paulo diz que viu Jesus ressurreto: “Não sou, porventura livre? Não sou apóstolo? Não vi a Jesus, Nosso Senhor?” (1Co 9.1)

2. O apóstolo tinha de ter um chamado especial da parte de Cristo para exercer este ministério. As Escrituras são absolutamente claras em nos mostrar que os apóstolos, incluindo Paulo, foram chamados por Cristo (Mt 10.2-4; Gl 1.11-24).

3. O apóstolo era alguém a quem foi dada autoridade para operar milagres. Isso fica bem claro em 2Coríntios 12.12: “Pois as credenciais do meu apostolado foram manifestadas no meio de vós com toda a persistência, por sinais prodígios e poderes miraculosos”. Era como se ele dissesse: “Como vocês podem questionar meu ofício de apóstolo, se as minhas credenciais foram apresentadas claramente entre vós”. Sinais, milagres e prodígios maravilhosos.

4. O apóstolo tinha autoridade para ensinar e definir a doutrina firmando as pessoas na verdade.

5. Os apóstolos tiveram autoridade para estabelecer a ordem nas igrejas. Nomeavam os presbíteros, decidiam questões disciplinares e questões doutrinárias, e falavam com autoridade do próprio Jesus.

Será que diante destas questões os “apóstolos” da modernidade podem de fato reivindicar o título de apóstolo de Cristo? Por acaso, algum deles viu o Senhor ressurreto? Foram eles comissionados por Cristo a exercerem o ministério apostólico? Quantos dos apóstolos brasileiros ressuscitaram mortos? E suas doutrinas? Possuem elas autoridade para se contraporem aos ensinamentos bíblicos?

Pois é, infelizmente os “apóstolos” do nosso tempo não possuem respostas a estas perguntas.

O posicionamento da ortodoxia evangélica entende que o ministério apostólico cessou com a morte dos apóstolos no primeiro século. Sem a menor sombra de dúvidas, considero a utilização do título “apóstolo” por parte dos pastores como uma apropriação indevida de um ministério, o qual não existe mais nos moldes que vemos no Novo Testamento.

Soli Deo gloria


Notas:

Trecho extraído do Livro: “Reforma Agora – o antídoto para a confusão evangélica no Brasil”, lançamento de setembro da Editora Fiel – Renato Vargens

Um dos problemas mais comuns e recorrentes na igreja evangélica brasileira diz respeito às falhas de interpretação bíblica, quando alguns textos são distorcidos, ora propositalmente ora por imperícia, imprudência ou negligência. De uma forma ou de outra, a utilização inadequada de um texto ou de uma passagem bíblica tem levado muitas pessoas ao engano e ao erro. É exatamente isso o que ocorre com as práticas dos atos proféticos, tão comuns entre aqueles que seguem o Movimento da Fé.

Mas, afinal de contas, o que é um ato profético?

René Terranova, que foi “ungido” apóstolo, depois “paipóstolo” e Patriarca, por Morris Cerrullo, tem se destacado como um dos principais líderes defensores do Ato Profético no Brasil. Ele diz: “A linguagem profética traz ao reino físico a existência do mundo espiritual. Na maioria dos seus discursos, Jesus falava de uma forma espiritual e o povo entendia na forma física, porque lhes faltava discernimento espiritual” (TERRANOVA, 2009) [1].

Ainda, o grupo Reavivamento Europa dá a seguinte definição para Ato Profético:

Como o nome já sugere são ações realizadas por homens, profetas de Deus com determinado sentido profético, com intuito de profetizar com ações e símbolos. São sinais que apontam para o reino espiritual e que tem conseqüências no reino físico. São ações expressas em atitudes e palavras [2].

Então, na visão dos seguidores do Movimento da Fé, o Ato Profético seria uma ação envolta em simbologia que supostamente traria ao mundo físico as realidades espirituais. Para isso, os defensores desse pensamento utilizam passagens bíblicas, especialmente do Antigo Testamento, em que Deus manda que os profetas utilizem símbolos para transmitir a Sua mensagem, a exemplo dos umbrais das portas com sangue na noite da décima praga do Egito (Ex 12), a pregação sem roupas de Isaías (Is 20:3-4), as sete voltas em torno de Jericó (Josué), a canga de Jeremias (Jr 27:2), o cinto de linho enterrado às margens do rio Eufrates (Jr 13:1-11), a botija de barro quebrada diante do povo (Jr 19:1-11) etc.

Em primeiro lugar, as ações praticadas pelos profetas bíblicos não traziam nada à existência, como afirmam os seguidores do Movimento da Fé. Antes, tinham um caráter didático de ensino, instrução e orientação para o povo de Deus, a exemplo do profeta Oséias que casou com uma prostituta. A ação de Oséias, ordenada por Deus, visava fazer o povo entender que havia se prostituído diante do Senhor, mas que Ele, o Senhor, continuava fiel ao Seu povo (Os 3) buscando tirá-lo da prostituição, assim como Oséias fez com aquela mulher. Essa passagem bíblica nos mostra que a situação de Gômer, a prostituta, era a mesma situação do povo de Israel. Esse meio didático utilizado por Deus só demonstra que o povo estava em prostituição.

Essas ações proféticas encontradas na Bíblia não trazem à existência coisas espirituais. Elas tinham um caráter didático para corrigir o povo, ensinar o povo ou trazer juízo sobre um povo. Por isso diz-se que tais ações fazem parte dos atos salvadores de Deus na história.

Por essa razão é que o escritor aos Hebreus declara:

Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, nestes últimos dias, nos falou pelo Filho, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo. Ele, que é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas, tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles. (Hb 1:1-4)

Em segundo lugar, a interpretação bíblica é distorcida com os Atos Proféticos da atualidade. Isso ocorre porque tais pessoas confundem o que é relato histórico e o que é ordem direta.

Um relato histórico é a descrição de algo que ocorreu no passado. Por exemplo, a Escritura relata que Judas traiu Jesus. E mais, a Bíblia revela que o próprio Jesus disse: “O que fazes, faze-o depressa” (Jo 13:27). Ainda, a Bíblia revela que Deus disse à Moisés: “tira as sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa” (Ex 3:5). Ainda, a Bíblia revela que Jesus “cuspiu na terra e, tendo feito lodo com a saliva, aplicou-o aos olhos do cego” (Jo 9:6). Ainda, a Bíblia revela que quando os sacerdotes entrassem na tenda da congregação, ou quando fossem ministrar no altar, deveriam lavar as mãos e os pés com água para não morrerem, e “isto lhes será por estatuto perpétuo, a ele e à sua posteridade, através de suas gerações” (Ex 30:20,21). Ou seja, se um relato bíblico e histórico é entendido como uma ordem para o povo de Deus e deve ser visto em forma de Ato Profético, deveríamos, então, trair Jesus, pois Ele mesmo disse “O que fazes, faze-o depressa”; deveríamos tirar as sandálias toda vez que entrássemos na presença de Deus em oração, na igreja ou em uma reunião espiritual com irmãos (Ex 3:5); deveríamos cuspir na terra e fazer “lodo” para passar nos olhos dos cegos para os quais oramos (Jo 9:6); deveríamos lavar as mãos e os pés todas as vezes que fôssemos oferecer algum tipo de serviço ao Senhor, para não sermos mortos (Ex 30:20,21) etc.

O fato é que esses atos, encontrados em sua grande maioria no Antigo Testamento, são direcionados à um povo, evento ou situação específica, e a Bíblia está apenas relatando o que houve. A Bíblia não está estabelecendo uma regra ou dizendo que deveríamos reproduzir o ato. Ainda, o leitor da Bíblia deve observar o que o texto está dizendo, para quem está dizendo e para quando está dizendo. Muitas vezes algumas pessoas erram porque se apropriam de promessas que dizem respeito ao povo de Israel no Antigo Testamento, como se isso dissesse respeito a nós hoje. Portanto, uma coisa é a Bíblia relatar um fato, e outra coisa completamente diferente é a Bíblia dar uma ordem direta e aplicável a nós hoje, como essa:

Mas, agora, vos escrevo que não vos associeis com alguém que, dizendo-se irmão, for impuro, ou avarento, ou idólatra, ou maldizente, ou beberrão, ou roubador; com esse tal, nem ainda comais. Pois com que direito haveria eu de julgar os de fora? Não julgais vós os de dentro? Os de fora, porém, Deus os julgará. Expulsai, pois, de entre vós o malfeitor. (1Co 5:11-13)

Em terceiro lugar, erram por ignorar a suficiência das Escrituras.

A busca por Atos Proféticos é gerada pela sensação de que a Bíblia não é suficiente para nos falar, para nos corrigir e nem para nos orientar, e muito menos para suprir nossas reais necessidades.

O apóstolo Paulo alerta seu discípulo Timóteo sobre isso:

Conjuro-te, perante Deus e Cristo Jesus, que há de julgar vivos e mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina. Pois haverá tempo em que não suportarão a sã doutrina; pelo contrário, cercar-se-ão de mestres segundo as suas próprias cobiças, como que sentindo coceira nos ouvidos; e se recusarão a dar ouvidos à verdade, entregando-se às fábulas. Tu, porém, sê sóbrio em todas as coisas, suporta as aflições, faze o trabalho de um evangelista, cumpre cabalmente o teu ministério. (2Tm 4:1-5)

Exatamente por essa razão, Jesus disse: “Errais, não conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22:29).

O fato é que tais pessoas sentem a necessidade de algo mais, de uma nova experiência. Isso ocorre porque se afastaram dos princípios elementares da fé cristã e do Sola Scriptura. Para estes a Sagrada Escritura já não é suficiente, pois buscam algo mais. Contudo, esquecem que os atos dos profetas no Antigo Testamento, normalmente, estavam relacionados com o afastamento do povo dos princípios estabelecidos pelo Senhor, e como este povo estava negligenciando a Sagrada Escritura, Deus usa de outro meio para lhes falar ao coração. Por isso, ao buscar um suposto e hipotético Ato Profético estão apenas confessando publicamente o quão distante se encontram da Bíblia Sagrada.

Em quarto lugar, erram na contextualização e na aplicação dos princípios bíblicos.

Um exemplo que pode ser citado para ilustrar a questão é a armadura de Deus, em Efésios 6:10-20. Ali, naquele Texto, o apóstolo Paulo utiliza o artifício da ilustração para falar de verdades espirituais, e essas verdades são ilustradas através de uma realidade física. Ou seja, Paulo usa a armadura romana para falar da verdade da batalha espiritual, alicerçada no Evangelho da Paz (sandálias), Justiça (couraça), Salvação (capacete), Fé (escudo) e a Palavra de Deus (espada). Isso não quer dizer que o cristão tenha que usar uma armadura de verdade, ou que tenha que ter miniaturas de armaduras em sua casa como uma mandala, patuá ou amuleto, para estar protegido, pois isso seria superstição. Da mesma forma, os atos encontrados no Antigo Testamento, por exemplo, não precisam ser repetidos em nosso meio hoje, pois semelhantemente isso seria superstição, ou no mínimo seria o mesmo que achar que um método pode substituir ou provocar a ação do Espírito Santo, o que seria recair no erro do pragmatismo. Mas, é exatamente isso o que tem acontecido, quando essas “práticas” e “ações” são executadas com a finalidade de “bloquear”, “anular”, “derrubar” ou “vencer” fortalezas espirituais. Isso é o mesmo que os espíritas fazem ao usar sabonetes e sal grosso para tomar banhos de descarrego, ou usar alguns pós com supostos poderes especiais que acreditam poder livrar as pessoas de mal olhado, ou quando usam o pé de pinhão roxo para proteger suas casas e comércios, ou quando fazem um despacho para, supostamente, fechar o corpo contra maus espíritos. Tudo isso não passa de superstição, paganismo, feitiçaria e macumbaria.

Além do mais, é preciso destacar que não encontramos nenhuma ordem bíblica para que façamos tais coisas. É preciso relembrarmos que uma coisa é a Bíblia relatar algo que ocorreu, e outra, completamente diferente, é a Bíblia ordenar que pratiquemos algo.

Por isso, mais uma vez é preciso repetir o que o escritor aos Hebreus declara:

Havendo Deus, outrora, falado, muitas vezes e de muitas maneiras, aos pais, pelos profetas, NESTES ÚLTIMOS DIAS, NOS FALOU PELO FILHO, a quem constituiu herdeiro de todas as coisas, pelo qual também fez o universo. Ele, que é o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser, sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder, depois de ter feito a purificação dos pecados, assentou-se à direita da Majestade, nas alturas, tendo-se tornado tão superior aos anjos quanto herdou mais excelente nome do que eles. (Hb 1:1-4)

Portanto, no passado Deus utilizou alguns meios didáticos para ensinar o povo e conduzi-los à verdade da chegada e da presença do Messias, Jesus Cristo. Mas, a partir de Jesus o meio que Deus tem utilizado é o próprio Jesus, mediante a ação do Espírito Santo, por meio da Sagrada Escritura. Se no passado Deus usou, por exemplo, o Urim e o Tumim (Ex 28:30), hoje Ele usa a Sua Sagrada Palavra, revelada aos Seus filhos.

Porque a palavra de Deus é viva e eficaz, e mais penetrante do que espada alguma de dois gumes, e penetra até à divisão da alma e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar. (Hb 4:12-13)

Tu, porém, permanece naquilo que aprendeste, e de que foste inteirado, sabendo de quem o tens aprendido, e que desde a tua meninice sabes as sagradas Escrituras, que podem fazer-te sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus. Toda a Escritura é divinamente inspirada, e proveitosa para ensinar, para redargüir, para corrigir, para instruir em justiça; para que o homem de Deus seja perfeito, e perfeitamente instruído para toda a boa obra. (2 Tm 3:14-17)

A TRANSFERÊNCIA DE GERAÇÃO COMO UM ATO PROFÉTICO

A ideia de “Transferência de Geração”, praticada pelo grupo Diante do Trono, é caracterizada simplesmente como uma distorção e afastamento das Escrituras, baseada em manipulações de datas.

Para ver o vídeo da “Transferência de Geração” no youtube, clique AQUI.

O argumento utilizado para se defender a “Transferência de Geração” é de que existe uma promessa em Joel 1:3, em que são citadas cinco gerações, sabendo que uma geração dura em torno de 40 anos. Além disso, afirmam que um país só é considerado como tal após a sua independência, e como a independência do Brasil só ocorreu no dia 7 de setembro de 1822, a promessa de Deus é conduzida até meados dos anos 1980. Os defensores deste pensamento afirmam especificamente o ano de 1982. Então, essa geração de 1982 seria a responsável por promulgar um santo jejum, convocar uma assembleia solene, congregar todos os anciãos e todos os moradores da terra para a Casa do SENHOR e clamar à Ele (Joel 1:14).

O primeiro problema com o argumento utilizado é para quem foi destinada a promessa de Joel 1:3. Para quem o Texto está falando?

O contexto do livro de Joel diz respeito a devastação da terra por uma dupla praga, de locustas [3] e seca. Então, a promessa de Joel é de que se o povo de Israel voltar à adoração do Deus verdadeiro, a sua terra será restaurada, tanto da praga dos gafanhotos como da seca. Portanto, essa profecia diz respeito às pragas derramadas sobre o próprio povo de Deus por sua apostasia, na época de Joel. Dessa forma, se o fundamento para a transferência de Gerações, praticada pelo Diante do Trono, é o texto de Joel, então esse grupo está confessando publicamente a sua apostasia, assim como foi com o povo do profeta Joel.

O profeta Joel alerta o povo de que essa praga não deveria ser esquecida, e, por isso, precisava ser relembrada às gerações futuras para que estas gerações entendessem que ela era a representação de um juízo ainda maior no porvir. Se esta praga foi terrível, o Dia do Senhor será muito mais (Jl 2:1-11). Portanto, o que deveria ser lembrado às gerações futuras era o derramamento do juízo de Deus, que não tem nenhuma relação com a suposta Transferência de Gerações.

O segundo problema com o argumento utilizado é que não há nenhuma evidência bíblica de que uma geração dure 40 anos, como essas pessoas desejam.

Orlando Boyer afirmou que a geração é a “duração média da vida de um homem” (1998, p.292) [4], e Werner Kaschel e Rudi Zimmer afirmaram que uma geração é a “sucessão de descendentes em linha reta: pais, filhos, netos, bisnetos, trinetos, tataranetos (Sl 112.2; Mt 1.17)” (1999, p.79) [5], ainda afirmaram que geração pode ser o “conjunto de pessoas vivas numa mesma época” (Idem).

Então, o texto bíblico de Mateus 1:17 nos diz que de Abraão até Davi são 14 gerações, em que temos um tempo médio de mil anos. Portanto, cada geração dura em média 71 anos. Ainda, o Salmo 90:10 nos diz que “os dias da nossa vida chegam a setenta anos”, que é a duração média de uma vida. Portanto, aqui, uma geração dura em média 70 anos.

Com isso, não há nada que faça pensar que uma geração dure 40 anos, como pretendem os defensores dos Atos Proféticos e da Transferência de Geração.

O terceiro problema com o argumento utilizado é afirmar que um país só é considerado como tal após a sua independência. Mas a promessa de Joel não tem nenhuma relação com a formação de um país, especialmente porque o Israel étnico sempre existiu como nação, preservando a sua cultura e religiosidade, até mesmo quando não tinha um território, e mesmo durante os cativeiros. Ainda, este povo só passou a ser reconhecido como um país em 1948, quando foi fundado o Estado Moderno de Israel.

O quarto problema com o argumento utilizado é tentar fazer uma correlação entre esta profecia e o Brasil. Não existe nada no texto, absolutamente nada, que dê chance para isso. Dessa forma, podemos ver claramente como esses grupos distorcem a Bíblia deliberadamente e como fazem isso contando sempre com a falta de conhecimento, falta de discernimento e falta de entendimento do povo. Esse é um claro exemplo de como a Bíblia tem sido tratada com desprezo e descaso por esses grupos.

Para piorar a situação, ainda mais, utilizam os textos de 1Samuel 16:13 e 2Coríntios 3:4-6 para fundamentar a prática de Transferência de Geração. Vejamos os textos:

Tomou Samuel o chifre do azeite e o ungiu no meio de seus irmãos; e, daquele dia em diante, o Espírito do SENHOR se apossou de Davi. Então, Samuel se levantou e foi para Ramá. (1Sm 16:13)

E é por intermédio de Cristo que temos tal confiança em Deus; não que, por nós mesmos, sejamos capazes de pensar alguma coisa, como se partisse de nós; pelo contrário, a nossa suficiência vem de Deus, o qual nos habilitou para sermos ministros de uma nova aliança, não da letra, mas do espírito; porque a letra mata, mas o espírito vivifica. (2Co 3:4-6)

O texto de 1Sm 16:13 relata o encontro entre Davi e Samuel, quando Davi foi ungido pela primeira vez. Esse texto fala da chamada de Davi ao trono de Israel, mas não pode ser visto como algo que se repete nos dias de hoje, especialmente porque o texto diz que nesse momento, com Davi, o Espírito do SENHOR se apossou dele. Contudo, na Nova Aliança o Espírito Santo se apossa do convertido no momento da conversão. Por isso que o apóstolo Paulo nos diz que “em um só Espírito, todos nós fomos batizados em um corpo, quer judeus, quer gregos, quer escravos, quer livres. E a todos nós foi dado beber de um só Espírito” (1Co 12:13). E diz mais, pois “não estais na carne, mas no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós. E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele” (Rm 8:9). Portanto, não podemos afirmar que o fato de alguém ser ungido com azeite nos dias de hoje é o princípio para a chegada do Espírito Santo e nem para a Sua descida. Muito menos que é sinal da aprovação Divina.

O que vemos com isso, mais uma vez, é a apropriação indevida de um texto que está em outro contexto, dentro de outra Aliança e que é dirigido à outra pessoa. Um texto que é descritivo e que é manipulado para parecer uma ordem direta ou orientação Divina para sua repetição na atualidade.

O texto de 2 Coríntios 3:4-6 é outro que tem sido muito distorcido e mal interpretado por muitas pessoas. Essa passagem diz respeito a Nova Aliança, em que todo membro é um sacerdote, diferente da antiga Aliança. Se na antiga Aliança havia um grupo exclusivo de sacerdotes, na Nova Aliança todo membro é um ministro e sacerdote, como pode ser visto aqui. Portanto, todo aquele que nasceu de novo é um ministro da Nova Aliança, e esta Aliança não é da letra, ou seja, não é igual àquela que foi gravada com letras em pedras (3:7), porque a letra mata (3:6). Mas que letra é essa? Como já foi dito, é a letra que foi gravada em pedras (3:7), isto é, a Lei que foi dada à Moisés. Esta letra que mata, portanto, não tem nenhuma relação com o estudo ou pesquisa, mas com a Lei do Antigo Testamento.

Nesse sentido, Moisés fez algo que poderia ser visto como um ato profético, pois ele passou a usar um véu sobre a face. Porém, o apóstolo diz que “não somos como Moisés, que punha véu sobre a face, para que os filhos de Israel não atentassem na terminação do que se desvanecia” (3:13), e que para alguns, “até ao dia de hoje, quando fazem a leitura da antiga aliança, o mesmo véu permanece, não lhes sendo revelado que, em Cristo, é removido” (3:14). Por isso, não precisamos de certos artifícios, porque se essa letra em tábuas de pedra é vista como “ministério da condenação”, devemos entender que “em muito maior proporção será glorioso o ministério da justiça” (3:9), que é o que vivemos hoje na Nova Aliança. E este véu, usado por Moisés, foi apenas um artifício utilizado por ele para que o povo não percebesse que a glória de Deus estava desvanecendo. Portanto, o uso desse tipo de prática, nos dias de hoje, é apenas uma tentativa de ludibriar o povo, um artifício, para que este pense que a glória de Deus está presente ali, naquele “rosto”.

Por isso, não precisamos de Atos Proféticos e nem de unções descabidas.

Por isso, podemos ver com clareza como esses grupos distorcem a Sagrada Escritura, a exemplo da utilização de 2Coríntios 3:17: “Ora, o Senhor é o Espírito e, onde está o Espírito do Senhor, ali há liberdade”.

Bem, a liberdade quando é do Senhor nem dá lugar à carne (Gl 5:13), nem deturpa a verdade do Evangelho (1Pe 2:16) e nem causa escândalo (2 Co 6:3). Já que esse não tem sido o caso desses grupos só podemos concluir, biblicamente, que essa liberdade que têm utilizado não provém de Deus e que mais uma vez o texto bíblico utilizado não fundamenta as suas práticas.

Por último, só para entender com mais clareza como a prática do Ato Profético é uma distorção e como tem sido utilizada para fins antibíblicos, vejamos o que René Terranova diz sobre a relação que existe entre Ato Profético, mapeamento de genealogia e maldição hereditária:

A Bíblia relata que os judeus davam muita importância à genealogia, ao conhecimento de suas origens. Os judeus ortodoxos têm o costume de registrar a genealogia de suas famílias. Nós poderíamos ter essa cultura, mas nossa história é muito mal formada. Mal conhecemos a identidade de nossos pais, muito menos do nosso povo e nem sabemos como retratar nossa árvore genealógica.Um dos nomes de Jesus é Raiz de Davi, porque no contexto messiânico se Jesus não fosse a Raiz de Davi, não seria o Messias (Mt. 1). Em certas ocasiões, poderemos tentar uma conquista de território, mas nosso argumento genealógico poderá ser empecilho por não termos respaldo local ou não termos um nome de família honrado. Deus pode mudar esse quadro restaurando a nossa genealogia com um ato profético de quebra de maldições dos antepassados. Procure pelo menos descobrir quem foram seus familiares até a quarta geração que lhe antecedeu. Quando resgatamos a nossa história genealógica conhecendo nossas origens, fica mais fácil quebrar maldições hereditárias [6].

Contudo, Colin Brown Lothar demonstra que esse tipo de pensamento não passa de uma heresia, e que já era praticada por grupos anticristãos a exemplo do gnosticismo, ebionismo e pelos defensores dos misticismos judaicos:

Genealogia ocorre no NT somente em 1Tm 1:4 e Tt 3:9, e alude especificamente à prática de pesquisar a árvore genealógica a fim de estabelecer a descendência. Segundo qualquer exegese direta, aqueles que assim faziam somente podem ter sido judeus, que, a partir de genealogias do AT e de outras, estavam propagando todos os tipos de “mitos judaicos”, bem como, provavelmente, especulações gnósticas pré-cristãs. É também possível que os ebionitas empregassem argumentos semelhantes para atacarem a doutrina do nascimento milagroso de Jesus que circulava na igreja cristã [7].

Portanto, a única coisa que podemos perceber com tudo isso é que estamos simplesmente presenciando o surgimento de heresia em cima de heresia e que não há nada novo debaixo do sol (Ec 1:9).

Soli Deo gloria


NOTAS

Extraído do site: NAPEC – Apologética cristã

[1] Atos proféticos na Igreja – comandos do Espírito Santo. Disponível em: <http://www.reneterranova.com.br/site/content/ministracoes.php?id=9>. Acesso em: 24 abr 2014.

[2] O que é um ATO PROFÉTICO?. Disponível em: <http://reavivamentoeuropa.wordpress.com/o-que-e-um-ato-profetico/>. Acesso em: 24 abr 2014.

[3] Locusta é uma espécie de gafanhoto.

[4] BOYER, Orlando. Pequena Enciclopédia Bíblica. São Paulo: Vida, 1998.

[5] KASCHEL, Werner; ZIMMER, Rudi. Dicionário da Bíblia de Almeida. Rio de Janeiro: CPAD, 1999.

[6] Atos proféticos na Igreja – comandos do Espírito Santo. Disponível em: <http://www.reneterranova.com.br/site/content/ministracoes.php?id=9>. Acesso em: 24 abr 2014.

[7] LOTHAR, Colin Brown. Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, 2000. p.855

Ano após ano cresce a chamada “bancada evangélica”, esse grupo tem alcançado grande força política, isso é indiscutível, a cada ano temos mais e mais candidatos “evangélicos” pleiteando um cargo político, ano passado tivemos um candidato membro da nossa igreja, e tive que responder a mesma pergunta várias vezes; O CRISTÃO PODE SE ENVOLVER EM POLÍTICA?. Os cristãos (e em especial os evangélicos) brasileiros nutrem uma aversão à política. Principalmente por esta estar associada a homens corruptos, cristãos de campanha, mentiras eleitoreiras, apostasia, satisfação de interesses pessoais, coisas que deixam o eleitor desconfiado das reais motivações que levam determinado candidato a lutar tanto por tal cargo. Unido a isto, temos uma fé afastada dos negócios do mundo, e então temos os destinos da sociedade entregue a incrédulos. Precisamos compreender melhor o papel do CIDADÃO e principalmente do CRISTÃO e aprender a viver um evangelho integral, que tenha uma palavra de juízo e graça para todas as esferas da vida humana, manifestando o Reino de Deus em nosso mundo.

Meu intuito aqui, é lançar luz sobre a questão apontando parâmetros para uma reflexão política e teológica à luz da Bíblia. Meu objetivo não é abordar a política partidária nem ideológica (esquerda, direita) no Brasil. Mas pensar política no sentido abrangente, o que não deixa de ser uma tarefa espinhosa, desafiadora e até polêmica. Creio que há citações, princípios e histórias de sobra nas Escrituras para elucidar nossa reflexão e aprimorar a nossa consciência cristã no âmbito do governo – o que se relaciona intimamente com o papel do crente em sociedade, sua vocação e missão no mundo.

Para não reinventar a roda, esse artigo é um compilado de vários artigos de escritores e teólogos com material muitas vezes exposto na internet.

É de Franklin Ferreira a afirmação de que “a Bíblia nos foi dada como Palavra de Deus num contexto eminentemente político”, o que deveria nos conduzir a uma reflexão política coerente com a cosmovisão cristã. Esta tarefa não é nada fácil, pois toca em pressupostos teológicos, a visão do Reino de Deus, a escatologia, além das inevitáveis preferências culturais. No entanto, espero sinceramente que nosso raciocínio lhe seja útil para a caminhada cristã, para a formação de uma consciência política. Afinal, todos desejamos deixar um país melhor para os nossos filhos e netos enquanto aguardamos o retorno de Cristo. Isto nos parece legítimo e pode favorecer a propagação da Palavra (Jr 29.7; 1 Tm 2.2,3).

Deve o cristão se importar com política?

A questão acima pode dividir os mais unidos irmãos em Cristo. A política que é feita pelos partidos em nosso Brasil é vista como interesseira, suja e corrupta pela maioria dos brasileiros. É como um mal necessário, algo sem solução, na visão de muita gente. Para outros, além de todo este signo negativo, o assunto é chato, complicado, irrelevante e não temos poder de mudar o curso das coisas. Junte-se a isto o jargão “política não é coisa de crente” e estaremos completamente fechados para a reflexão no assunto. E nada como o conceito da separação entre Igreja e Estado para nos dar razão para o afastamento de tudo o que se chama política.

Entretanto, segundo Robinson Cavalcanti, o protestantismo brasileiro começou com cristãos engajados, impulsionados por uma visão positiva do Estado e da influência cristã nele e por meio dele. A crença na dupla cidadania do crente – terrena e celestial – e de sua responsabilidade para com o mundo aprendida com os missionários estrangeiros também demonstra as raízes desta consciência de engajamento. Este grupo era representado pelos presbiterianos e congregacionais. O grupo que defendia um afastamento mais absoluto da esfera política era representado, especialmente, pelos pentecostais históricos. Segundo Cavalcanti, estes tinham tal pensamento em virtude de sua escatologia pré-milenista e visão negativa do futuro para a consumação dos eventos messiânicos finais. Daí a razão para não envolverem-se na política, pois o mundo deveria piorar, e não melhorar. Embora a lógica faça sentido, particularmente entendo que a doutrina do milênio, se bem compreendida, não precisa desembocar na alienação ou ausência de engajamento com o contexto em que vivemos, mesmo porque Deus não precisa do auxílio humano para concretizar Seus planos.

Cavalcanti continua seu raciocínio histórico mencionando o Golpe Militar de 1964 como o ponto chave que interrompeu a trajetória social e política do protestantismo brasileiro. A partir deste momento propagou-se algo novo e estranho, segundo ele, com o mote “crente não se envolve com política”. Sua conclusão é que, em nossos dias, a compreensão política dos evangélicos é bastante débil. Algumas igrejas e denominações lançam candidatos evangélicos com interesses exclusivistas, e não para o bem de toda a população, pautados por uma teologia de dominação e triunfalismo. E em alguns casos, candidatos ditos evangélicos concorrem como qualquer outro candidato interesseiro para se aproveitarem do dinheiro que é dividido entre os corruptos em detrimento do povo.
Em nossos dias, o impacto dos evangélicos nas urnas do nosso país é um fato. Sabemos do crescimento abrupto de evangélicos na última década, chegando a somar em torno de 22% da população brasileira (42,3 milhões) segundo o último censo IBGE em 2010. Este crescimento deveria, com toda certeza, mudar para melhor os valores, a ética, as relações e estruturas do país, corroborando para uma nação mais justa em todos os aspectos. Entretanto, a impressão que temos é a de um declínio nestas áreas. Neste caso, ou as igrejas estão abrigando ímpios, ou os justos estão alienados, ou as duas coisas ocorrem paralelamente. A implicação aqui é que a presença de cristãos verdadeiros numa nação resultará em transformação de contextos e produção de cultura por meio de boas políticas nas micro e macro- relações.

É evidente que, a despeito da política, precisamos orar por nossa pátria terrena, evangelizarmos de modo efetivo, discipularmos corretamente e sabermos discernir a Palavra de Deus. Mas também precisamos relacioná-la com os problemas atuais e estudarmos os ensinos políticos, sociais e econômicos das Sagradas Escrituras juntamente com o desenvolvimento do pensamento cristão na História. Deste modo contribuiremos para o despertamento de vocações que se materializarão no espectro da cidadania, ornando em tudo a doutrina de Deus nosso Salvador (Tt 2.10). Assim, poderemos compreender melhor o conceito de “co-beligerância” ensinado por Francis Shaeffer que defende a busca de pontos de contato com a sociedade e a cultura para defender a justiça, a paz, o direito e as boas causas enquanto Cristo não vem.

Fundamentos para a Reflexão e Ação Política segundo a Bíblia

É preciso reconhecer que houve equívocos da parte de cristãos na política nos últimos vinte séculos, especialmente quando se quis impor uma religião a todos. Quando nos esquecemos do ensino de Jesus “dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”, incorremos em erro de misturar o que é heterogêneo. Porém, os exemplos positivos são muitos, que trouxeram progresso nas relações humanas, no valor do indivíduo, no conceito de liberdade, na abolição da escravatura, na dignidade da mulher, na legislação e execução da justiça e na construção social como um todo. Segundo Wayne Grudem:

“… a influência cristã levou à extinção males como o aborto, o infanticídio, as lutas entre gladiadores, os sacrifícios humanos, a poligamia, a prática de queimar vivas mulheres viúvas e a escravidão, bem como essa influência levou à concessão de direitos de propriedade, direitos de voto e outras salvaguardas para as mulheres”.

Poderíamos argumentar em favor da influência cristã nos governos chamando alguns reformadores e cristãos professos que abençoaram o ocidente com sua ética e valores bíblicos. A história da Inglaterra e Estados Unidos são exemplos clássicos deste fato. Nos Estados Unidos a boa influência cristã está registrada nos dizeres de sua Constituição. E há outros tantos lugares que foram abençoados com leis humanitárias como a China, por exemplo, quando aprovou a proibição de enfaixar os pés das mulheres. Contudo, apesar de todo este testemunho penso que precisamos do apoio das Escrituras.

Numa breve viagem pelas páginas do Livro nos lembramos de Noé, quando saiu da arca e recebeu de Deus um “norte” político acerca do valor da vida humana e o devido castigo para o crime de homicídio (Gn 9.5,6). Recordamos a trajetória de José, o governador do Egito, que alimentou nações com sua sabedoria e salvou sua família conforme os intentos soberanos e redentores de Deus. Posteriormente, observamos os diálogos entre Moisés e Faraó e as pragas divinas lançadas a todo o Egito por causa de um soberano endurecido aos propósitos do Senhor. A própria dádiva da Lei ao povo no Sinai estabeleceu políticas que expressavam o caráter de Yahweh à nação da Sua Aliança. Em Juízes observamos o caos generalizado quando não havia rei em Israel e cada um fazia o que lhe parecia mais certo. A história dos reis e profetas da monarquia dividida denunciou, entre outras coisas, a injustiça social e a necessidade de socorro aos que são chamados por Tim Keller de quarteto dos miseráveis do AT (o pobre, a viúva, o órfão e o estrangeiro). Outros servos notáveis do Senhor que serviram em posição de autoridade fora da teocracia em Israel foram Daniel, Neemias e Ester. Ambos mantiveram a integridade e expressaram fé em Deus no campo minado da política mundial.

No Novo Testamento, vemos Jesus lidando com o poder romano instituído e dizendo “dai, pois, a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus” (Tm 22.21). Podemos ainda citar Paulo, o apóstolo, e suas pregações a Félix e Festo, sua menção a convertidos da casa de César e as diversas orientações cristãs para a vida em sociedade. A Bíblia ainda nos apresenta Pedro e João escrevendo sobre os acontecimentos apocalípticos de largas implicações políticas no mundo e a consumação do governo de Cristo.

Como vimos, a Palavra de Deus mostra Sua autoridade e eternidade em meio aos frágeis domínios humanos. A Bíblia não silencia sobre o assunto, e devemos estudá-la para a reflexão e ação coerentes no mundo, em todas as suas esferas. Abaixo alisto três pilares que considero fundamentais para a reflexão e ação política do cristão:

  • O mandato cultural ordenado por Deus na Criação (Gn 1.26,28;2.15). Recebemos de Deus a tarefa de sermos continuadores da Criação, cultivando, guardando, governando e dominando sobre o universo criado. A isso a Teologia tem denominado “mandato cultural”, que nos foi dado antes da Queda e se expressa hoje na consciência da soberania de Cristo sobre tudo. Recebemos de Deus uma responsabilidade e inclinação para nos organizarmos, definirmos espaço e território, nomearmos coisas e promovermos o bem. Esta é a essência do que deveríamos chamar política – a arte ou ciência da organização, direção e administração visando o bem comum. Se para Aristóteles o homem é um “animal político”, na narrativa de Gênesis ele é um ser essencialmente político. Com este alicerce em mente é que devemos pensar a política.
  • A missão cristã de fazer o bem (Mt 5.15,16; At 10.38; Gl 6.10; Ef 2.10; Tt 2.14;3.8). Quanto a este ponto não temos dúvidas e é desnecessário explicações. O exemplo de Jesus a todos nós, suas palavras e as orientações apostólicas do Novo Testamento corroboram para a ideia de uma vida piedosa na prática do bem. A influência cristã na esfera governamental deve construir suas ações neste prumo, fazendo o bem em serviço ao Senhor, com ética e integridade, para ornar em tudo a doutrina de Deus nosso Salvador. Um cristão não serve aos homens e suas coligações partidárias, mas a Deus em primeiro lugar, e a Ele prestará contas.
  • O projeto do Reino (Sl 2; Mc 1.14,15; Jo 18.36; At 1.6-8; 1 Co 15.24-28; Fp 2.9-11). A narrativa bíblica apresenta o Senhor Deus reinando por direito e executando Seu propósito de salvação e justiça a toda criação, que se colocará de joelhos, de fato, ante Seu governo futuro. Este é um projeto em andamento, desenrolado no progresso da revelação mediante a graça e misericórdia de Deus, que dá Sua Palavra, Suas promessas e Seu Filho por nós, a fim de que sejamos salvos da ira. Pela fé no Filho, homens e mulheres de todas as nações são incluídos no Reino inaugurado por Jesus, embora ainda não consumado sobre toda a criação. A Igreja é a comunidade do Reino que anuncia o evangelho lembrando o dia em que Deus julgará os vivos e os mortos. Os súditos de Jesus já vivem a realidade e o poder deste Reino em terra estranha aguardando a sua plena manifestação já garantida pela ressurreição de Cristo e Suas promessas. O acabamento da História deve nortear nossa visão de vida prevenindo-nos das ilusões ideológicas e direcionando nossa fé na direção certa, a saber, Deus. O verdadeiro Rei é Ele, e todos os governos do mundo prestam-lhe submissão. O político cristão não pode perder esta perspectiva. E é bom lembrarmos que Deus não precisa de nenhum auxílio humano para cumprir Sua agenda escatológica.

Com estes fundamentos em vista, os cristãos com vocação política servirão como uma bússola moral em benefício da sociedade como um todo. Não impondo religião a ninguém, mas advogando em prol da vida com base em pressupostos eternos. Tal influência declarada será útil em frentes como a da liberdade e do direito individual, da responsabilidade do cidadão perante o Estado, da segurança pública, da justiça, da proteção ao meio ambiente, da pobreza, do aborto, da pornografia, do tráfico de pessoas, do casamento entre indivíduos do mesmo sexo, do combate às drogas e ao crime organizado, da corrupção, da erradicação da fome, da saúde pública, da educação, da liberdade religiosa, da família, etc. É de cristãos genuínos que acreditam na Bíblia que deveríamos esperar pronunciamentos morais robustos e consistentes que beneficiem a todos e agradem a Deus.

Não podemos em nenhuma hipótese esquecer que a primeira missão do Cristão é anunciar a Cristo, e que nossa esperança e salvação estar em Cristo.

Em uma discussão recente com um amigo que auto denomina-se cristão, ele defendia além da ideologia política (não é o alvo deste post), que a sociedade só seria “salva” pela politica, dizendo ele que sem uma intervenção política o homem está entregue a própria sorte, fazendo da política um “ser messiânico”, capaz de prover salvação, no entanto o que encontramos como conceito cristão e bíblico é que salvação é somente por meio da Graça mediante a fé (Efésios 2:8).

Em uma cosmovisão cristã, só Cristo salva, devemos depositar em cristo nossa esperança, mas o que temos visto é um surgimento da religião chamada ESTADO, há uma idolatria do estado, coisa típica de ideologia esquerdista, uma ESTADOLATRIA é a doutrina dos que recorrem ao Estado como quem pode resolver todas as dificuldades econômicas e sociais.

Quando a política pretende ser redentora, promete demais. Quando pretende fazer a obra de Deus, não se torna divina, mas demoníaca – Joseph Ratzinger

Romanos 13.1-7 é um dos textos mais importantes da história sobre a questão política. A palavra de Deus estabelece princípios claros acerca do papel do Estado e da responsabilidade dos cidadãos, a fim de que haja ordem e progresso na sociedade. Destacaremos, à luz do texto, três verdades importantes:

Em primeiro lugar, a origem das autoridades constituídas (Rm 13.1,2). Paulo diz que não há autoridade que não proceda de Deus e as autoridades que existem foram por ele instituídas. Logo, se opor deliberada e formalmente à autoridade é resistir à própria ordenação de Deus. Aqueles que entram por esse caminho de desordem e anarquia trarão sobre si mesmos condenação. É óbvio que o apóstolo Paulo não está dizendo que Deus é o responsável moral pelos magistrados ditadores e corruptos que ascendem ao poder. Deus instituiu o princípio do governo e da ordem e não o despotismo. As autoridades não podem domesticar a consciência dos cidadãos nem desrespeitar a sua fé. Nossa sujeição às autoridades não é submissão servil nem subserviência, mas submissão crítica e positiva. A relação entre a Igreja e o Estado deve ser de respeito e não de subserviência. Deus não é Deus de confusão nem aprova a anarquia. Deus instituiu a família, a igreja e o Estado para que haja ordem na terra e justiça entre os homens.

Em segundo lugar, a natureza das autoridades constituídas (Rm 13.3-5). As autoridades constituídas não devem ser absolutistas. Elas governam sob o governo de Deus. A fonte de sua autoridade não emana delas mesmas nem mesmo do povo. Emana de Deus através do povo. Portanto, a autoridade é ministro (diákonos) de Deus, ou seja, é servo de Deus para servir ao povo. Aqueles que recebem um mandato pelo voto popular não ascendem ao poder para se servirem do povo, mas para servirem ao povo. Não chegam ao poder para se locupletarem, mas para se doarem. Não buscam seus interesses, mas os interesses do povo. Esse princípio divino mostra que o político que sobe ao poder pobre e desce dele endinheirado não merece nosso voto. O político que usa seu mandato para roubar os cofres públicos e desviar os recursos que deveriam atender as necessidades do povo para se enriquecer ilicitamente deve ter nosso repúdio e não nosso apoio. O político que rouba ou deixa roubar, que se corrompe ou deixa a corrupção correr solta, que acusa os adversários, mas protege seus aliados, não deve ocupar essa posição de ministro de Deus, pois Deus abomina a injustiça e condena o roubo.

Em terceiro lugar, a finalidade das autoridades constituídas (Rm 13.4-7). Deus instituiu as autoridades com dois propósitos claros: a promoção do bem e a proibição do mal. O governo é ministro de Deus não só para fazer o bem, mas, também, para exercer o juízo de Deus sobre os transgressores. Portanto, devemos sujeitar-nos às autoridades não por medo de punição, mas por dever de consciência. Cabe a nós, como cidadãos, orar pelas autoridades constituídas, honrá-las, respeitá-las e pagar-lhes tributo, uma vez que seu chamado é para atender constantemente à essa honrosa diaconia, de servir ao povo em nome de Deus. Quando, porém, as autoridades invertem essa ordem e passam a promover o mal e a proibir o bem, chamando luz de trevas e trevas de luz, cabe a nós, alertar as autoridades a voltarem à sua vocação. Se essas autoridades, porém, quiserem nos impor leis injustas, forçando-nos a negar a nossa fé, cabe-nos agir como os apóstolos: “Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens” (At 5.29).


Notas:

Joseph Ratzinger, Fé, verdade, tolerância (São Paulo: Instituto Brasileiro de Filosofia e Ciência Raimundo Lúlio, 2015), p. 110.

Franklin Ferreira, contra a idolatria do estado (Editora Vida Nova)

Hernandes Dias Lopes

Site Bereanos – bereianos.blogspot.com.br

Site do Marcelo Berti – marceloberti.wordpress.com

Site Teologia Brasileira – teologiabrasileira.com.br

Soli Deo gloria

O marxismo autêntico sempre odiou e sempre odiará o cristianismo autêntico. Se não puder pervertê-lo, então terá que matá-lo. Sempre foi assim e sempre será assim.

E por que essa oposição manifestada ao cristianismo por parte do marxismo? Por que o ódio filosófico, a política anticristã, a ação assassina direcionada aos cristãos? Por que o país número um em perseguição ao cristianismo não é muçulmano e sim a comunista Coréia do Norte?

As pessoas se iludem quando pensam no marxismo como doutrina econômica ou política. Economia e política são meros pontos. Marx não acreditava ter apenas as resposta para os problemas econômicos. Acreditava ter todas as respostas para todos os problemas.

Marxismo na verdade é uma crença, uma visão de mundo, uma fé. O socialismo nada mais é do que a aplicação dessa fé por um governo totalitário. O comunismo, por sua vez, é apenas a escatologia marxista, o suposto mundo paradisíaco que brotaria de suas profecias.

E esta fé não apresenta o caráter relativista de um hinduísmo ou de um budismo. Tendo nascido dos pressupostos cristãos, o marxismo roubou seus absolutos e se apresenta como a verdade absoluta, como o único caminho para redenção da humanidade. E ainda que tenha se apossado dos pressupostos cristãos, inverteu tais pressupostos tornando-se uma heresia anticristã.

No lugar do teísmo o ateísmo, no lugar da Providência Divina o materialismo dialético. Ao invés de um ser criado à imagem e semelhança de Deus, um primata evoluído cuja essência é o trabalho, o homo economicus. O pecado é a propriedade privada, o efeito do pecado, simplesmente a opressão social. O instrumento coletivo para aplicar a redenção não é a Igreja, mas o proletariado, que através da ditadura de um Estado “redentor” conduziria o mundo a uma sociedade sem classes. E o resultado seria não os novos céus e a nova terra criados por Deus, mas o mundo comunista futuro, onde o Estado desaparecerá, as injustiças desaparecerão e todo conflito se transformará em harmonia. Está é a fé marxista, um evangelho que não admite rival, pois assim como dois corpos não ocupam o mesmo espaço, duas crenças igualmente salvadoras não podem ocupar o mesmo mundo, segundo o marxismo real.

Sim, o comunismo de Marx era um evangelho, a salvação para todos os conflitos da existência, fosse o conflito entre homem e homem, homem e natureza, nações e nações. Assim lemos em seus Manuscritos de Paris:

“O comunismo é a abolição positiva da propriedade privada e por conseguinte da auto-alienação humana e, portanto, a reapropriação real da essência humana pelo e para o homem… É a solução genuína do antagonismo entre homem e natureza e entre homem e homem. Ele é a solução verdadeira da luta entre existência e essência, entre objetivação e auto-afirmação, entre liberdade e necessidade, entre indivíduo e espécie. É a solução do enigma da história e sabe que há de ser esta solução”.

E como o marxismo nega qualquer transcendência, qualquer realidade além desta realidade, seu “paraíso” deve se realizar neste mundo por meio do controle total. Não apenas o controle político e econômico, mas o controle social, ideológico, religioso. Não pode haver rivais. Não pode haver cristãos dizendo que há um Deus nos céus a quem pertencem todas as coisas e que realizou a salvação através da morte e ressurreição de Cristo. Não pode haver outra visão de mundo que não a marxista, não pode haver outra redenção senão aquela que será trazida pelo comunismo. O choque é inevitável.

Está é a raiz do ódio marxista ao cristianismo. Seu absolutismo não permite concorrência. David H. Adeney foi alguém que viveu dentro da revolução maoísta (comunista) na China. Ele era um missionário britânico e pode ver bem de perto o choque entre marxismo e cristianismo no meio universitário, onde trabalhou. Chung Chi Pang, que prefaciou sua obra escreveu:

“(…) a fé cristã e o comunismo são ideologicamente incompatíveis. Assim, quando alguém chega a uma crise vital de decisão entre os dois, é inevitavelmente uma questão de um ou outro (…) [o autor] tem experimentado pessoalmente o que é viver sob um sistema político com uma filosofia básica diametralmente oposta à fé cristã”[1]

Os marxistas convictos sabem da incompatibilidade entre sua crença e a fé cristã. Os cristãos ainda se iludem com uma possível amizade entre ambos. “… para Marx, de qualquer forma, a religião cristã é uma das mais imorais que há”. (Mclellan, op. Cit., p.54). E Lenin, que transformou a teoria marxista em política real, apenas seguiu seu guru:

“A guerra contra quaisquer cristãos é para nós lei inabalável. Não cremos em postulados eternos de moral, e haveremos de desmascarar o embuste. A moral comunista é sinônimo de luta pelo robustecimento da ditadura proletária”[2]

Assim foi na China, na Rússia, na Coreia do Norte e onde quer que a fé marxista tenha chegado. Ela não tolerará o cristianismo, senão o suficiente para conquistar a hegemonia. Depois que a pena marxista apossar-se da espada, então essa espada se voltará contra qualquer pena que não reze conforme sua cartilha.

Os ataques aos valores cristãos em nosso país não são fruto de um acidente de percurso. É apenas o velho ódio marxista ao cristianismo, manifestando-se no terreno das ideias e das discussões, e avançando no terreno da legislação e do discurso. O próximo passo pode ser a violência física simples e pura. Os métodos podem ter mudado, mas sua natureza é a mesma e, portanto, as conseqüências serão as mesmas.

Se nós, cristãos, não fizermos nada, a história se repetirá, pois como alguém já disse, quem não conhece a história tende a repeti-la. E parece que mesmo quem a conhece tende a repeti-la quando foi sendo anestesiado pouco a pouco pelo monóxido de carbono marxista.

Será que confirmaremos a máxima de Hegel, que afirmou que a “história ensina que não se aprende nada com ela”?


Autor: Eguinaldo Hélio Souza

Não é necessário ser um conhecedor profundo da história eclesiástica para saber que, do ponto de vista teológico, a Reforma Protestante do século XVI teve como objetivo principal o retorno da Igreja às Sagradas Escrituras como a base para sua fé e sua vida prática. O episódio mais representativo desta ênfase foi a Dieta de Worms (maio de 1521) convocada pelo imperador Carlos V com o propósito de julgar a Martinho Lutero, que havia sido excomungado previamente como herege pelo Papa Leão por afirmar a autoridade da Bíblia acima da autoridade dos papas e os concílios. Convidado a retratar-se, o reformador alemão respondeu com a seguinte declaração da “sola scriptura, tota scriptura”, uma afirmação que sintetiza a convicção teológica evangélica básica com respeito à centralidade das Escrituras:

“Minha consciência é cativa da Palavra de Deus. Se não me demonstrarem pelas Escrituras e por razões claras (não aceito a autoridade de papas e concílios, pois se contradizem), não posso nem quero retratar-me de nada, porque ir contra a consciência é tão perigoso quanto errado. Que Deus me ajude, Amém.”

Sobre essa base bíblica os reformadores construíram o edifício teológico constituído pelas ênfases evangélicas que se resumem nas seguintes afirmações: somente a Cristo (“solus Christus”), somente a graça (“sola gratia”),somente a fé (“sola fide”), somente a glória de Deus (“soli deo gloria”), a igreja reformada sempre se reformando (“ecclesia reformata semper reformanda”). No entanto, já em 1520, antes da Dieta de Worms, Lutero escreveu três tratados em que expunha sua posição teológica em controvérsia com a sustentada oficialmente pela Igreja Católica Romana: “A liberdade cristã”, “À nobreza alemã acerca do melhoramento do Estado cristão”, e “O cativeiro babilônico”.

Ainda que não negue a necessidade de um ministério “ordenado” por razões funcionais, em seu tratado dirigido à “nobreza alemã” Lutero rejeita a forte divisão tradicional entre clérigos e leigos, e afirma o sacerdócio de todos os crentes (também denominado “sacerdócio comum”) nos seguintes termos:

“Todos os cristãos são em verdade de estado eclesiástico e entre eles não há distinção, se não somente por causa do ministério, como Paulo diz que todos somos um corpo, mas que cada membro tem sua função própria com a qual serve aos demais. Isso resulta do fato de que temos um só batismo, um Evangelho, uma fé e somos cristãos iguais, visto que o batismo, o Evangelho e a fé por si sós tornam eclesiástico ao povo cristão”.

A base bíblica desta posição é sólida. De acordo com o ensino do Novo Testamento, o único sacerdócio válido até o fim da era presente é o sacerdócio de Jesus Cristo, que se ofereceu a si mesmo em sacrifício pelos pecados e “com um só sacrifício tornou perfeitos para sempre aos que está santificando” (Hb 10.14). Todos os que confiam nele têm acesso direto à presença de Deus (10.19-22). Ninguém pode oferecer mais sacrifícios pelo pecado: a obra de redenção está consumada; Jesus Cristo homem é o único mediador entre Deus e os homens (1Tm 2.5). Em virtude de sua relação com ele, todos os crentes participam de seu sacerdócio: são o sacerdócio do Rei (1Pe 2.9); são “reis e sacerdotes” (Ap 1.5; 5.10). E como tais são chamados a oferecer-se a si mesmos, “em adoração espiritual… como sacrifício vivo, santo e agradável a Deus” (Rm 12.1).

Biblicamente, todo cristão é sacerdote pelo único motivo de ser cristão. A Igreja é um povo sacerdotal. Consequentemente, todos os seus membros foram consagrados ao serviço de Deus, e para realizá-lo receberam “diversos dons”, “diversas maneiras de servir”, “diversas funções” que o Espírito reparte “para o bem dos demais” (1Co 12).

Sobre esta base bíblica, a Reforma Protestante do século XVI abriu o caminho para que cada igreja local seja uma igreja-comunidade que supere a dicotomia entre clérigos e leigos e todos os membros do corpo de Cristo, sem exceção, participem em serviços que manifestem o amor a Deus e ao próximo, de maneira prática. A pergunta que temos que nos fazer hoje é: até que ponto nossas congregações estão comprometidas com o sacerdócio de todos os crentes, levando em conta que “todos os que foram batizados em Cristo se revestiram de Cristo” e, em consequência, “já não há judeu nem gentio, escravo nem livre, homem nem mulher” (Gl 3.27-28)?

Soli Deo gloria

No dia 31 de outubro de 1517, Martinho Lutero fixou nas portas da Igreja de Wittenberg, na Alemanha, as 95 teses contra a venda de indulgências. A data marca o início da Reforma Protestante e de um novo momento na história da humanidade.

Nenhum aspecto da vida humana ficou intacto, pois abrangeu transformações políticas, econômicas, religiosas, morais, filosóficas, literárias e nas instituições. Foi, de fato, uma revolta e uma reconstrução do norte”, afirma o escritor Eby Frederick.

Na educação, os impactos foram determinantes. Na Idade Média, a igreja era a única responsável pela organização e manutenção da educação escolar. A partir do século 16, surgiram as nações-estados, que se opuseram ao poderio universal do papa e formou-se a classe média.

O historiador e professor da Faculdade de Teologia da Igreja Metodista, Rev. José Carlos de Souza, explica que o comércio, a atividade pública e as próprias igrejas, entre muitos outros setores, possuíam demandas que requeriam cuidadoso preparo. Toda mudança social traz novos desafios.

“Certamente, por essa razão, Lutero sentiu-se impelido para falar e se pronunciou de modo enfático sobre a necessidade das autoridades civis investirem na educação”, avalia o professor.

Neste contexto, os movimentos da Renascença e da Reforma são precursores de profundas mudanças na concepção de ensino. “A educação começa a visar de modo claro e definido à formação integral do homem, o seu desenvolvimento intelectual, moral e físico”, conta o professor Ruy Afonso da Costa Nunes.

Cidadania – Martinho Lutero também estimula a criação de escolas para toda a população. Houve forte ênfase ao ensino para suprir as demandas da recém chegada sociedade moderna, com dimensões geográficas, políticas, econômicas, intelectuais e religiosas em transformação.

A contribuição da Reforma no contexto educacional é tamanha que, de acordo com o educador espanhol Lorenzo Luzuriaga, a educação pública teve origem nesta época. O movimento já estimulava a educação pública, universal e gratuita, para quem não poderia custeá-la.

“A educação pública, isto é, a educação criada, organizada e mantida pelas autoridades oficiais – municípios, províncias, estados – começa com o movimento da Reforma religiosa”, afirma Luzuriaga.

Em Aos conselhos de todas as cidades da Alemanha, para que criem e mantenham escolas cristãs, publicado em 1524, Martinho Lutero desafia a sociedade a promover uma educação integral. “Lutero queria todos os cidadãos bem preparados, para todas as tarefas na sociedade. Propôs uma escola cristã que visasse não uma abstração intelectual, mas a uma educação voltada para o dia-a-dia da vida”, explica o professor  Alvori Ahlert.

O pastor luterano Walter Altmann comenta a referência de Lutero para o desenvolvimento da educação. “Rompeu com o ensino repressivo, introduzindo o lúdico na aprendizagem. Amarrou o estudo das disciplinas a um aprendizado prático. Também lutou por boas bibliotecas, dentro de sua ótica cristocêntrica”, revela Altmann no livro Lutero e a Libertação.

“Pela graça de Deus, está tudo preparado para que as crianças possam estudar línguas, outras disciplinas e história, com prazer e brincando. As escolas já não são mais o inferno e o purgatório de nosso tempo, quando éramos torturados com declinações e conjugações. Não aprendemos simplesmente nada por causa de tantas palmadas, medo, pavor e sofrimento”, escreveu Martinho Lutero.

A aprendizagem construiria cidadãos capacitados, honestos e responsáveis. Era exatamente esta a necessidade do novo modelo de sociedade que surgia na época. De acordo com o pesquisador Evaldo Luis Pauly a rápida divulgação de ideias e concepções por meio da imprensa descoberta por Gutemberg, também contribuiu para que as iniciativas de estímulo educacional crescessem.

Universidades – As mudanças e ênfases da Reforma estimularam o surgimento das instituições de ensino. “A história das universidades nos estados alemães durante os séculos 16 e 17 foi determinada pelo progresso da religião e é quase idêntica a do desenvolvimento da teologia protestante”, declara Paul Monroe no livro História da Educação.

Nestor Beck diz que a Universidade de Wittenberg atraiu um número crescente de novos alunos, pela fama que passou a ter, entre os anos de 1517 a 1520. A Reforma Protestante deixou a concepção de que a ignorância é o grande mal para a verdadeira religião, por isso, superá-la é uma responsabilidade de todos. “O melhor e mais rico progresso para uma cidade é quando possui muitos homens bem instruídos, muitos cidadãos ajuizados”, dizia Martinho Lutero.

Expansão – O pensamento e o movimento protestante logo expandiram. A América do Norte, por exemplo, contou com a colonização de vários grupos protestantes, na chamada segunda reforma. O antropólogo e escritor Darcy Ribeiro afirma, no livro Universidade Necessária, que nos Estados Unidos o ensino superior “cresceu mais livre, democrático e fecundo”.

As igrejas cristãs prevalecem no cenário educacional norte-americano no século 17 e início do 18. O professor Almiro Schulz explica que após a independência dos Estados Unidos em 1776 e a separação entre igreja e estado, houve uma ênfase ao ensino superior público, secularizado e sob controle do estado.

“A igreja reagiu por meio da educação. As confissões, principalmente presbiteriana, batista, congregacional, metodista se lançaram no ensino superior”, conta o professor Almiro Schulz.

De acordo com o pastor e professor metodista José do Nascimento a participação metodista na educação se deu, de maneira consciente, a partir de 1820, devido a alteração da legislação da Conferência Geral, que permitiu aos bispos nomear clérigos metodistas para a direção de instituições de ensino. No início, a ênfase do ensino metodista era rural, mas se voltou mais tarde para o ensino superior.

Educação Metodista no Brasil – O professor metodista Elias Boaventura deixou informações importantes sobre a historiografia da educação da Igreja Metodista no Brasil. Em publicações ele declara que os missionários metodistas norte-americanos, que chegaram ao país a partir do final do século 19, foram portadores de um arrojado projeto de expansão religiosa, que incluía, de um lado, o trabalho de catequese e implantação da nova denominação, e do outro, a ênfase na educação.

Em 1871, foi organizada a primeira Igreja Metodista do Brasil, em São Paulo, e, em 1881, foi fundado o primeiro colégio, em Piracicaba-SP, o Piracicabano, representando, de acordo com Boaventura, o marco inicial das atividades educacionais da Igreja Metodista no Brasil.

“A iniciativa educacional logrou imediato apoio dos governantes, das elites políticas de tendência republicana, e de todos que viam no novo modelo, de inspiração liberal e iluminista, uma alternativa capaz de contribuir para o avanço do projeto educacional brasileiro”, afirmou Elias Boaventura.

O projeto metodista de educação foi implantado e destacou-se pela qualidade oferecida. Um dos primeiros historiadores metodistas, James Kennedy, revela que em Piracicaba-SP, logo começaram a afluir as crianças para o colégio que em pouco tempo foi reconhecido como o melhor na cidade, sendo frequentado pelos filhos das melhores famílias.

Além do Piracicabano, outras escolas como o Granbery, em Juiz de Fora-MG, o Bennet, no Rio de Janeiro-RJ, o Americano, de Lins-SP foram constituindo as marcas da educação metodista na região sudeste do país. No sul, instituições como o Colégio Americano, fundado em 1885 também propagaram o ensino identificado com pedagógico liberal.

A professora do Centro Universitário Metodista em Porto Alegre-RS, Denise Grosso da Fonseca, explica que na década de 80, a Igreja Metodista do Brasil, autônoma desde 1930, passou por momentos de profunda reflexão, redefinindo muitos aspectos de sua vida e trabalho. “A educação, preocupação fundamental dos metodistas desde sua origem, teve suas diretrizes repensadas à luz da palavra de Deus, do Credo Social e do Plano para Vida e Missão da Igreja Metodista”, declara.

A reflexão gerou o documento Diretrizes para a Educação, que foi aprovado pelo 13º Concílio Geral da Igreja Metodista, em 1982. O texto aponta que as práticas educativas devem ser norteadas por princípios que: desenvolvam consciência crítica da realidade; compreendam que o interesse social é mais importante que o individual; exercitem o senso e a prática de justiça e solidariedade; alcancem a realização como fruto do esforço comum; tomem consciência de que todos têm direito de participar de modo justo dos frutos do trabalho e reconheçam que, dentro de uma perspectiva cristã, útil é aquilo que tem valor social.

Fonte: Universidade Metodista de São Paulo.

Soli Deo gloria